Lista: as 50 melhores atuações do cinema da década (Parte 2)

Continuando as listas de melhores da década (só clicar na tag para acompanhar todas), dessa vez trouxe as 50 melhores atuações da década no Cinema para o Cinematofagia. E os anos 2010s foram bastante importantes para a Sétima Arte, vendo as portas se abrirem para uma maior diversidade dentro dos maiores pólos da indústria. Mesmo ainda tendo um grande caminho a ser trilhado, das grandes premiações televisivas aos prêmios de festivais mundo afora, estamos cada vez mais valorizando artistas plurais.

Então decidi selecionar minhas 50 performances favoritas em filmes da década. Algumas regras básicas foram levadas em consideração; 1: a atuação deve ser em um longa lançado comercialmente ou disponibilizado no Brasil entre 2010 e 2019; 2: não haverá diferenciação entre atuações principais ou coadjuvantes; 3: só será escolhido uma atuação por ator/atriz (ou seja, a melhor entre profissionais com mais de uma atuação de destaque do período será a escolhida).

Como toda lista, as atuações estão em ordem de preferência, porém, é importante apontar o óbvio: todas são incríveis, não havendo uma menor que a outra. A ordem pega nuances, iconicidade e até mesmo a qualidade do filme como um todo - afinal, uma atuação fica ainda melhor quando dentro de um grande filme -, mas não devem ser levadas com tanta seriedade - até mesmo porque tantas outras igualmente sensacionais ficaram de fora. 50 pode parecer um grande número, no entanto, dentro da qualidade da arte, é só uma pontinha do que a década nos ofereceu.


25. Ethan Hawke – No Coração da Escuridão

Personagem: Ernst Toller
É curioso ver como padres conturbados geram tantas performances além da média - de Max von Sydow em "O Exorcista" até Philip Seymour Hoffman em "Dúvida" (2008). Ethan Hawke entra nesse hall com "No Coração da Escuridão" (2017). Entrando na vida cristã após a perda do filho, padre Toller não imagina o turbilhão em que está prestes adentrar quando conhece uma esposa grávida e seu marido suicida. Com um roteiro que vai à fundo na perda absoluta da fé, Hawke desenvolve sutilezas avassaladoras ao por na mesa discussões tão atuais e complexas, carregando uma cruz de emoções que rasgam o ecrã.

24. Zain Al Rafeea – Cafarnaum

Personagem: Zain El Hajj
Um dos maiores filmes de realismo documental do nosso tempo - e vencedor moral do Oscar de "Filme Estrangeiro", "Cafarnaum" (2018) tem Zain El Hajj como fio condutor da trama: ele, com 12 anos, vai à justiça contra os pais após ser preso por um crime que só será revelado mais tarde. Entrando nos becos das favelas do Líbano, Zain Al Rafeea majestosamente dá realismo ao seu personagem mesmo com tão pouca idade. Há uma crueza e brutalidade nada inerente da infância, prova de como o meio molda um indivíduo, e Rafeea é capaz de soar verdadeiro em todos os momentos.

23. Michelle Pfeiffer – Mãe!

Personagem: A Mulher
No meio do pandemônio que é "Mãe!" (2017), é notável como Michelle Pfeiffer obtém nossa atenção mesmo em um papel coadjuvante. A veterana ressurge como a mulher que um belo dia aparece na porta da casa dos protagonistas para deixar sua marca como uma ferida. Ela não tem a menor vergonha de invadir a privacidade do casal e nem de demonstrar desgosto pela anfitriã, exigindo uma atuação despudorada que caiu como uma luva para quem já fez a melhor Mulher-Gato do cinema.

22. Charlize Theron – Mad Max: Estrada da Fúria

Personagem: Imperator Furiosa
O quarto filme da franquia "Mad Max", "Estrada da Fúria" (2015), é um dos mais celebrados filmes de ação de todos os tempos. Particularmente, nunca fui grande fã desse videogame gigante que é impossível passar de fase, contudo, se há uma qualidade incontestável no longa é a Furiosa de Charlize Theron. Muito me espanta a atriz não ter sido indicada às principais premiações quando é a verdadeira protagonista do filme e, óbvio, ser mais uma sensacional performance. A líder de uma rebelião feminista naquele laranja universo pós-apocalíptico é uma heroína para ninguém botar defeito.

21. Casey Affleck – Manchester À Beira Mar

Personagem: Lee Chandler
A vitória de Casey Affleck no Oscar por "Manchester À Beira Mar" (2016) recebeu bastante críticas pelas acusações contra o ator, não pelo seu trabalho no filme. É o secular debate sobre "vida pessoal X vida artística", que jamais terá uma resposta definitiva. Um fato é: Lee Chandler é executado brilhantemente. Se no início demoramos a entender os porquês do personagem agir da forma como ele age, todas as peças vão se encaixando e Lee vai afundando cada vez mais pelas tragédias passadas. O que Affleck faz na cena da delegacia é fora desse mundo.

20. Robert Pattinson – O Farol

Personagem: Ephraim Winslow
Robert Pattinson ficou eternizado (ou amaldiçoado) pelo papel de Edward Cullen na saga "Crepúsculo". Não parecia que havia nada de substancial ali além de um rostinho bonito. Que delícia é ser provado o contrário. Quem ainda associa Pattinson com o vampiro que bilha no sol provavelmente não assistiu às inteligentes escolhas que ele fez nos últimos anos, mas nada que se aproxime de "O Farol" (2019). Pattinson incorpora uma persona tão complexa, desafiadora e que não tem pudores em cenas cruas e difíceis. Ele sua, sangra, vomita e goza de maneira animalesca. Não é exagero apontar sua performance de a melhor do seu currículo. Quem diria que, um dia, Cedrico Diggory seria digno de um Oscar.

19. Emma Suárez – As Filhas de Abril

Personagem: Abril
Uma garota de 17 anos descobre que está grávida e seu maior objetivo é manter a mãe o mais longe possível da notícia. Quando não há mais essa possibilidade, Abril, a mãe da garota, se mostra compreensiva e apta a ajudar no que puder, retrato de uma sororidade lindíssima entre aquelas mulheres. Pobre coitada da plateia que não tem ideia do abismo logo ali do lado, e poucas atuações conseguem impressionar tanto como a de Emma Suárez. é impossível explicar o motivo sem dar spoilers, mas essa é uma performance que resume a lógica "o amor de uma mãe não conhece limites".

18. Bradley Cooper – Nasce Uma Estrela

Personagem: Jackson Maine
Bradley Cooper já recebeu múltiplas indicações pela Academia, entretanto, nunca conseguiu ganhar meu apreço. É fato que sua competência é incontestável, mas nenhuma de suas atuações fazia com que eu caísse de amores, o que está devidamente mudado. Além de dirigir, Cooper traz o papel de sua carreira com o músico falido Jackson Maine na quarta versão de "Nasce Uma Estrela" (2018). Virando o real protagonista do filme, ao contrário dos longas anteriores, Cooper, mesmo contracenando com Lady Gaga, em momento nenhum deixa a cena ser assaltada, mergulhando de cabeça nos vários demônios de seu personagem, colocando em xeque temas como vícios e problemas psicológicos - e cantando muito. Sua derrocada no Oscar será uma daquelas decisões que a Academia se arrependerá no futuro.

17. Rooney Mara – Os Homens Que Não Amavam as Mulheres

Personagem: Lisbeth Salander
Infelizmente, "Os Homens Que Não Amavam as Mulheres" (2011) é a única adaptação (decente) da fantástica saga "Millennium" (há versões suecas que, confesso, não estão à altura dos livros). Pelo menos tivemos Rooney Mara aniquilando como Lisbeth. Antissocial e sociopata, Lisbeth usa sua extrema inteligência para combater o crime e o impacto só é efetivo graças à entrega de Mara. Mesmo tão pequena e esquálida, Mara é uma gigante nesse filme de super-herói feminista.

16. Sally Hawkins – A Forma da Água

Personagem: Elisa Esposito
Talento é quando uma atriz exala suas emoções apenas com o olhar. E quando uma personagem não oraliza durante o longa inteiro? Esse foi o desafio de Sally Hawkins em "A Forma da Água" (2017). Com exceção de uma pequena cena, a atriz não emite uma palavra sequer ao interpretar uma mulher muda que se apaixona por um homem-anfíbio. Com uma língua de sinais sem defeitos, é sobrenatural como ela gera sentimentos para a plateia e desenvolve um dos romances mais estranhos já vistos no cinema. Sua doçura e ânsia de viver aquela aventura são narcotizantes, entregando todo o seu corpo à uma heroína que não precisa de palavras para salvar o dia.

15. Mads Mikkelsen – A Caça

Personagem: Lucas
Um professor do ensino infantil é acusado por uma garotinha de abusá-la. O público sabe de sua inocência, com o caso sendo um completo mal entendido, mas o bastante para sentenciá-lo diante dos olhos públicos. "A Caça" (2012) é a união magistral de todos os elementos que fazem o cinema ser uma arte tão devastadora quando Mikkelsen, numa atuação contida, mas poderosíssima, desenvolve um personagem impressionante, tridimensional e de fácil empatia, que lhe rendeu o prêmio de “Melhor Ator” no Festival de Cannes 2012. É uma dor a cena da imagem acima, quando ele encara com ódio aqueles que o injustamente acusaram.

14. Cate Blanchett – Carol

Personagem: Carol Aird
Importante como tema, como relevância social e como feito artístico, "Carol" (2015) um dos maiores romances lésbicos já desenvolvidos na Sétima Arte, e a performance de Cate Blanchett como a personagem título está aí para provar. Como uma mulher de meia idade que se vê entre o casamento em ruínas e o romance com uma jovem fotógrafa, Blanchett está lotada de requinte à la Hollywood de Ouro. Tendo que se conter diante de uma sociedade que a proíbe de amar uma pessoa do mesmo sexo, a já duas vezes vencedora do Oscar - e poderia tranquilamente ter saído com mais um - é perfeita quando vive uma mulher que tem tudo a perder, mas escolhe não perder quem ama.

13. J.K. Simmons – Whiplash

Personagem: Terence Fletcher
J.K. Simmons tem um largo repertório em sua carreira, porém, tirando o divertidíssimo J. Jonah Jameson da saga (original) “Homem-Aranha”, nunca havia reparado tanto no ator - até a destruição que é "Whiplash" (2014). Seu Terence Fletcher, um maestro dedicado a arrancar na porrada o talento de seus alunos, é assustador, conseguindo manipular o público facilmente: ora o amamos, segundos depois o odiamos e queremos pular em seu pescoço. Seja em momentos em que ganha a cena no grito ou em situações onde basta um olhar para aniquilar a sequência, Simmons recebeu aclamação absoluta pelo papel, ganhando todos os principais prêmios de atuação na temporada.

12. Tilda Swinton – Amantes Eternos

Personagem: Eve
Tilda Swinton. O que ainda falar de Tilda Swinton? Um verdadeiro camaleão, a atriz consegue interpretar absolutamente todos os tipos de papéis, vide a versatilidade de sua carreira, indo de filmes indies até blockbusters. Em "Amantes Eternos" (2013), ela é Eve, uma vampira secular e amante de Adam, seu parceiro pela eternidade. Sim, os dois são Adão e Eva, e o filme de forma sagaz se utiliza das figuras bíblicas como vampiros; Swinton só enriquece com essas características e está narcotizante e envolvente como a criatura imortal e cult que assiste com pesar os seres humanos destruírem o planeta que ela há tanto tempo conhece. E ela ama Jack White.

11. Emmanuelle Riva – Amor

Personagem: Anne Laurent
O maior assalto da história recente do Oscar foi quando Emmanuelle Riva perdeu o Oscar pela monstruosa atuação em "Amor" (2012). Após sofrer um infarto, Anne Laurent cai em um abismo físico e mental impressionantemente executado por Riva, mesmo com 85 anos de idade. Não existem barreiras para a atriz, apenas uma dor gritante em sua atuação, conduzida por caminhos aterradores que são sempre justificados pelo sentimento que dá nome ao filme.

10. Naomie Harris – Moonlight

Personagem: Paula
Um dos maiores filmes do século, primeiro vencedor do Oscar de "Melhor Filme" com temática LGBT e 100% atuado por negros, um marco histórico. As honrarias de "Moonlight" (2016) são várias. Em seu corpo de atores, só gigantes. Mas Naomie Harris, como a abusiva mãe do protagonista, é a cereja do bolo. O reflexo da marginalização absoluta, Harris carrega a história de tantas mulheres negligenciadas pelo sistema, e todas as suas cenas são deslumbrantes, mesmo revoltantes e cruelmente reais.

9. Adèle Exarchopoulos – Azul é a Cor Mais Quente

Personagem: Adèle
"Azul é a Cor Mais Quente" (2013) é um dos melhores (e mais controversos) filmes LGBTs, e muito se deve à Adèle Exarchopoulos. Com uma personagem compartilhando seu nome, Adèle (a personagem) é uma estudante que, confusa com sua sexualidade, vê a resposta definitiva quando conhece uma garota de cabelos azuis. A partir daí, Adèle (a atriz) escancara as portas e atua à flor da pele - às vezes até demais - nesse papel que demanda tanta carga física e emocional, embarcando nesse coming of age íntimo que põe o espectador do lado do florescimento do amor de sua protagonista.

8. Amy Adams – Animais Noturnos

Personagem: Susan Morrow
Amy Adams tirou a década para conquistar o mundo. Aclamada em alguns casos, injustiçada por outros, a atriz tem algumas das melhores atuações da década, encontrando em "Animais Noturnos" (2016) sua apoteose. Susan é rica e bem sucedida artista, mas vive infeliz. Seu marido descaradamente a trai e ela se culpa pelo fracasso de um antigo relacionamento, até que o ex a envia um livro, baseado na vida dos dois. A história joga Susan em uma espiral de sensações e Adams é sublime com sua depressiva personagem, que ganha um novo sentido com a chegada do livro. A corrida expressa em seu rosto nos minutos finais, quando percebe o que o livro representa, é uma masterclass.

7. Willem Dafoe – O Farol

Personagem: Thomas Wake
Escolhendo entre a vasta e incrível filmografia de Willem Dafoe, que anda se superando, "O Farol" (2019) é o encapsulamento ideal para demonstrar o seu talento. Na pele de Thomas Wake, um ex-marinheiro em pleno séc. XIX, Dafoe está irretocável. Seus monólogos shakespearianos, sejam com sussurros ou berros, ecoam diretamente nos ossos de quem o assiste, uma entidade com tamanho poder que é quase palpável. Dentro da atmosfera do filme, Dafoe vira sobrenatural.

6. Frances McDormand – Três Anúncios Para Um Crime

Personagem: Mildred Hayes
Frances McDormand é uma das poucas pessoas a terem a tríplice coroa da atuação: venceu os principais prêmios do cinema, televisão e teatro. O motivo? "Três Anúncios Para um Crime" (2017) consegue explicar facilmente. Ácida e dura como pedra, a personagem em busca de justiça deixa ninguém vê-la suando - principalmente se esse alguém for um homem. Seja em momentos onde ela manda todo mundo calar a boca ou até mesmo dando apenas uma encarada para gelar o sangue, é vibrante seguir seus passos através do filme. As dualidades da mãe de luto são orquestradas sem esforço por Frances, uma vencedora incontestável do Oscar.

5. Brooklynn Prince – Projeto Flórida

Personagem: Moonee
Quem diria que uma das mais surreais estreias no cinema seria de uma menininha de sete anos? Brooklynn Prince dá uma verdadeira aula de atuação em "Projeto Flórida" (2017), passando verdade em absolutamente todas as cenas - o elenco infantil consegue transmitir dúvida na plateia, que chega a se perguntar "será que eles estão interpretando eles mesmos?". A pequena facilmente poderia ter sido indicada ao Oscar de "Melhor Atriz" ao guiar e dar todo o encantamento gerado a partir da ótica das crianças diante de toda a precariedade em que vivem.

4. Rosamund Pike – Garota Exemplar

Personagem: Amy Elliott
No aniversário de cinco anos do casamento de Amy e Nick, a esposa desaparece. Claro, todas as suspeitas recaem em cima do marido, principalmente por haver sinais de violência na casa - ele, no entanto, jura veementemente que é inocente. "Garota Exemplar" (2014) tem uma estrutura não-linear, indo e vindo entre passado e futuro, e, quando estamos tendo visão dos fatos pelos olhos de Amy, Rosamund Pike finca seu nome na história quando tira do papel uma das personagens mais criativas da história. Seu desenvolvimento é uma viagem alucinante e fantástica, capaz de deixar o queixo da plateia no chão.

3. Natalie Portman – Cisne Negro

Personagem: Nina Sayers
Muita controversa foi gerada quando Natalie Portman venceu o Oscar por "Cisne Negro" (2010): ela foi bastante ovacionada pelas sequências de dança, mas algumas foram feitas com uma dublê. Contudo, o que faz sua Nina Sayers tão lendária é a carga dramática extraída por Portman, as danças (algumas, sim, realizadas pela atriz) são um bônus. O binarismo do cisne branco virginal com o sexy cisne negro é executado fabulosamente por Portman, hipnótica em todos os quadros. Em certo momento, Nina fala que sentiu a perfeição, e o diálogo pode ser proferido, também, pela boca da atriz.

2. Olivia Colman – A Favorita

Personagem: Rainha Anne
Colman é uma das melhores atrizes da atualidade, no entanto, ainda não possui o reconhecimento que merece - ela tem um papel bem pequeno em "O Lagosta", roubando todas as cenas em que põe o pé; e está uma delícia na série "Fleabag" -, mas a situação deu uma virada quando a britânica venceu o Oscar por "A Favorita" (2018), papel que, aliás, lhe rendeu todos os prêmios que estiveram pela frente, cada um deles infinitamente merecidos. Anne é hilariamente instável e pueril quando grita coisas irrisórias e se afogando em todo o seu poder, e, mesmo que o filme não fosse tão genial como é, valeria a pena só para ver Colman aniquilar em cena.

1. Toni Collette – Hereditário

Personagem: Annie Graham
E a melhor atuação da década ano é, com louvor, de Toni Collette. Indicada ao Oscar pelo clássico "O Sexto Sentido", a atriz, tão subestimada, está abrindo as portas do Inferno na tela de "Hereditário" (2018). Por ser o elo fundamental da malfadada família, Collette tem que - e consegue - entregar todas as nuances dificílimas que o roteiro demanda, desde os momentos de pura dor até o medo mais genuíno possível. O elenco inteiro, mesmo sensacional, desaparece quando Collette pisa o pé no ecrã, que entrega a atuação de sua carreira. I. AM. YOUR. MOTHER.

Lista: as 50 melhores atuações do cinema da década (Parte 1)

Continuando as listas de melhores da década (só clicar na tag para acompanhar todas), dessa vez trouxe as 50 melhores atuações da década no Cinema para o Cinematofagia. E os anos 2010s foram bastante importantes para a Sétima Arte, vendo as portas se abrirem para uma maior diversidade dentro dos maiores pólos da indústria. Mesmo ainda tendo um grande caminho a ser trilhado, das grandes premiações televisivas aos prêmios de festivais mundo afora, estamos cada vez mais valorizando artistas plurais.

Então decidi selecionar minhas 50 performances favoritas em filmes da década. Algumas regras básicas foram levadas em consideração; 1: a atuação deve ser em um longa lançado comercialmente ou disponibilizado no Brasil entre 2010 e 2019; 2: não haverá diferenciação entre atuações principais ou coadjuvantes; 3: só será escolhido uma atuação por ator/atriz (ou seja, a melhor entre profissionais com mais de uma atuação de destaque do período será a escolhida).

Como toda lista, as atuações estão em ordem de preferência, porém, é importante apontar o óbvio: todas são incríveis, não havendo uma menor que a outra. A ordem pega nuances, iconicidade e até mesmo a qualidade do filme como um todo - afinal, uma atuação fica ainda melhor quando dentro de um grande filme -, mas não devem ser levadas com tanta seriedade - até mesmo porque tantas outras igualmente sensacionais ficaram de fora. 50 pode parecer um grande número, no entanto, dentro da qualidade da arte, é só uma pontinha do que a década nos ofereceu.



50. Ronit Elkabetz – O Julgamento de Viviane Amsalem

Personagem: Viviane Amsalem
Co-diretora e co-roteirista, "O Julgamento de Viviane Amsalem" (2014) foi o último filme de Elkabetz antes de sua precoce morte em 2016. Felizmente, a israelita deixou um legado fantástico com "O Julgamento", vivendo a história de uma mulher que apenas deseja o divórcio. Só que, nas leis de Israel, apenas com o consentimento do marido um divórcio pode ser realizado - e seu marido nega o pedido veementemente. Confinando-nos em 2h dentro de um tribunal, o filme é a metáfora perfeita para a situação claustrofóbica da protagonista, que deseja nada além da sua liberdade, tudo sem cair em chavões fáceis como abusos e violências. É a luta pelo simples direito de ser

49. Kim Min-hee – A Criada

Personagem: Lady Hideko
Fincado na era vitoriana de uma Coreia sob o domínio japonês, qualquer elogio pelo aparato visual de "A Criada" (2016) é chover no molhado, pois pouco se fala na atuação de Min-hee, a personagem mais enigmática do complexo filme. O peão que, aparentemente, é manipulada por todos ao seu redor, Lady Hideko vai, a cada minuto, criando camadas que só são efetivas pela performance de sua atriz, potencializada ainda mais pela forma como filme é contado - divido em três partes, cada uma tendo um ponto de vista diferente.

48. Antoine-Olivier Pilon – Mommy

Personagem: Steve Després
"Mommy" (2014) possui um trio protagonista fabuloso, mas Pilon tem a capacidade de roubar a cena com seu complicado Steve. Um adolescente problemático, hiperativo e com déficit de atenção, Steve transforma a vida de sua mãe um inferno, que tem como plano colocar o garoto em uma instituição hospitalar, sob tutela do governo. Pilon se atira em seu personagem, indo do amável ao perigoso em questão de segundos, sem jamais soar fora do lugar - a sequência em que ele literalmente abre a tela é um júbilo.

47. Daniel Radcliffe – Um Cadáver Para Sobreviver

Personagem: Manny
Um dos longas mais originais (e bizarros) da década é "Um Cadáver Para Sobreviver" (2016), que, mesmo tendo um título nacional bem piegas, é a mais pura definição do todo: quando um homem preso em uma ilha deserta está prestes a cometer suicídio, encontra um cadáver na praia, que se torna seu melhor amigo. E sim, Radcliffe é o cadáver. Algo totalmente inesperado para o britânico, Manny une um humor inevitável (o defunto fala) com preciosas ponderações acerca da vida. Do trio protagonista de "Harry Potter", Radcliffe foi o que melhor se saiu na batalha de se desvincular da eterna imagem do mundo bruxo.

46. Nicole Kidman – O Estranho Que Nós Amamos

Personagem: Miss Martha Farnsworth
Revival do filme de 1971, "O Estranho Que Nós Amamos" (2017) prioriza a visão feminina nessa clássica história de uma escola de garotas em meio à Guerra Civil norte-americana. Após um soldado ferido é acolhido na escola, os rumos de todas serão bruscamente alterados, e Miss Martha, a diretora do local, é quem deve tomar as rédeas da situação. Kidman, como não é de se estranhar, é uma entidade na tela que deve escolher entre os desejos carnais e a união de seu grupo - e aquela mulher dúbia é o que há de melhor no filme.

45. Daniela Vega – Uma Mulher Fantástica

Personagem: Marina Vidal
Daniela Vega, no oscarizado "Uma Mulher Fantástica" (2017), é uma das provas dos avanços sociais dentro da Sétima Arte: é uma mulher trans interpretando uma mulher trans. Por ser tão próximo da sua realidade, Vega não apenas dá vida à Marina com competência, mas também com sinceridade. Aquela mulher renegada pela família do recém-falecido namorado é uma das heroínas do cotidiano que caminha contra a torrente para provar e se autoafirmar como é. Uma mulher fantástica.

44. Jake Gyllenhaal – O Abutre

Personagem: Lou Bloom
Na longa jornada de Jake Gyllenhaal em busca de seu Oscar (até agora sem sucesso) viu algumas performances fantásticas, mas nada como a de "O Abutre" (2014). O título, referência direta ao clássico "A Montanha dos Sete Abutres", já dá o gosto do que vem por aí: Lou está desesperado por um emprego e encontra no jornalismo sensacionalista a resolução de seus problemas. Só que a aproximação com tantas desgraças vai afetá-lo mais que o esperado - e tudo é posto com muito poder pelas mãos (e berros) de Gyllenhaal, em uma visceral performance.

43. Jena Malone – Demônio de Neon

Personagem: Ruby
Um dos maiores "ame ou odeie" da década, "Demônio de Neon" (2016) é hipnótico o suficiente para que a sensacional atuação de Jena Malone não receba o apresso que merece. Todos os personagens do filme transitam pela linha do bem e do mal, mas nenhum como Ruby, a maquiadora da protagonista. Malone consegue transpor o tom correto de toda a película com seu ar agridoce, insinuações desconcertantes e sorrisos tortos, sendo uma entidade que, às margens, assiste ao circo de horrores sem sujar as mãos - e como esquecer da cena do necrotério, improvisada pela atriz?

42. Mya Taylor – Tangerine

Personagem: Alexandra
Assim como Daniela Vega, Mya Taylor também é uma mulher trans interpretando uma mulher trans. No entanto, no caso de "Tangerine" (2015), a realidade vislumbrada é a da prostituição. Quando sua melhor amiga descobre que o namorado a trai, Alexandra sai cidade afora em busca do cara enquanto acalenta um sonho de ser uma estrela e sair das ruas. Taylor é um verdadeiro presente pela despida performance, que culmina na cena final, uma das mais lindas do cinema moderno.

41. Peter Skvortsov – O Estudante

Personagem: Veniamin Yuzhin
É curioso quando um personagem é feito para ser odiado, e Veniamin do russo "O Estudante" (2016) é um exemplo. Violentamente obcecado por religião, o garoto inferniza a vida de todo mundo com suas regras sacras e recitações de passagens bíblicas - o filme ainda coloca cada uma delas na tela. Skvortsov é um servo dedicado a transformar seu papel em uma tortura proposital que funciona com um magnetismo assustador - desejar a morte de Veniamin nem gera culpa.

40. Isabelle Huppert – Elle

Personagem: Michèle Leblanc
Uma das atrizes mais completas do nosso tempo, Isabelle Huppert, em "Elle" (2016), entrega uma das mais desafiadoras composições da década. Confesso, não gosto do filme (pois os temas são complexos demais para a forma que são postos no ecrã), todavia, a Michèle de Huppert, após um estupro, busca uma vingança que não vai em caminhos esperados. Indicada ao Oscar pelo papel, a sessão vale inteiramente pela maneira que Huppert faz ascender a protagonista.

39. Marcello Fonte – Dogman

Personagem: Marcello
Vivendo um adorável dono de pet shop, Marcello (o nome do personagem e do ator é o mesmo) tem uma segunda vida ao vender drogas para dar tudo o que a fofa filha deseja. Usando o meio decrépito de uma Itália em ruínas, o protagonista se afoga em questões morais violentamente importantes e produz uma performance ímpar, laureada com a Palma de "Melhor Ator" no Festival de Cannes 2018. Da composição física até as escolhas psicológicas, há nenhuma camada fora do lugar com Fonte.

38. Meryl Streep – Álbum de Família

Personagem: Violet Weston
Ainda é necessário tecer textos acerca de Meryl Streep? É bem verdade que, na atual década, a atriz não fez tantos personagens inesquecíveis, mesmo com as múltiplas indicações ao Oscar (ela só precisa existir pra ser indicada, sejamos sinceros), no entanto, sua Violet em "Álbum de Família" (2013) é a melhor (e mais subestimada) atuação da década. Matriarca, amarga e em estado terminal, Streep se despe de todo glamour para tecer uma mulher drogada à beira da morte. A cena do tapa é um auge.

37. Viola Davis – Um Limite Entre Nós

Personagem: Rose Lee Maxson
"Um Limite Entre Nós" (2016), baseado em uma peça, foi adaptado para o cinema de forma bem fidedigna: é uma enxurrada de diálogos. Basicamente não existem momentos de silêncio, fazendo com que as atuações empurrem a narrativa ininterruptamente, e Viola Davis dá conta do recado. Vencedora do Oscar pelo papel, Rose Lee é um resumo perfeito da vida da mulher negra dos anos 50 tentando viver o american dream enquanto descobre que seu marido a trai - e ela se joga em uma montanha-russa de emoções.

36. Emma Stone – La La Land

Personagem: Mia Dolan
Emma Stone é um caso interessante dentro de Hollywood: é mais uma atriz teen que começou em filmes de comédia e foi gradualmente se aventurando em filmes mais "sérios" - e, não é exagero afirmar, é a que se saiu melhor desse trajeto. Stone não apenas ganha muitos pontos em "La La Land" (2016) pela sua carismática e sonhadora Mia, mas também por ser um papel que exige voz, e ela canta magnificamente - vide "Audition (The Fools Who Dream)". O merecimento do seu Oscar pode ser visto na extrema cena final, quando um simples sorriso define todo um momento.

35. Joaquin Phoenix – Ela

Personagem: Theodore Twombly
Quando pensamos em Joaquin Phoenix, muitos dirão que sua melhor atuação é em "Coringa", seguindo o atual hype. Ou até mesmo em "O Mestre" ou "Você Nunca Esteve Realmente Aqui". Entretanto, sempre apreciei bem mais o que foi realizado em "Ela" (2013), quiçá por abrir mão de toda a megalomania dos outros papéis citados. Em "Ela", Phoenix é um tímido, retraído e depressivo homem que luta para superar um divórcio; sua vida muda quando ele se apaixona por um sistema operacional. Por mais patético que soe no papel, demandou muito talento para que o público sinta o amor de um homem por uma máquina, e Phoenix nem parece se esforçar para conseguir.

34. Viggo Mortensen – Capitão Fantástico

Personagem: Ben Cash
"Capitão Fantástico" (2016) é um filme cheio de personagens maravilhosos, mas é o Ben de Viggo Mortensen o mestre de cerimônia. Pai de seis filhos, todos vivem no meio do nada em uma floresta. Ben dedica seus dias a ensinar uma forma alternativa de educação, que podem soar extremas. A coisa vai a um patamar além quando a família é obrigada a passar um tempo na casa de uma tia; quando o choque cultural bate, a atuação de Viggo se torna ainda mais bela.

33. Michael Keaton – Birdman

Personagem: Reggan
Antes de mais nada: Michael Keaton teve seu Oscar roubado. Em um papel arquitetado unicamente para ele, Reggan é uma versão ironizada da carreira do próprio Keaton: famoso por interpretar um super-herói e esquecido logo então. Reggan corre atrás da fama durante "Birdman" (2014) inteiro, perdendo a noção da realidade nessa busca cada vez mais absurda. Faraônico, megalomaníaco e sensacional, Reggan resgatou Keaton do ostracismo e ressuscitou sua carreira.

32. Victor Polster – Garota

Personagem: Lara Verhaeghen
Há uma ótima discussão atual sobre representatividade nas artes, debatendo sobre atores cisgêneros interpretando personagens trans. Comento sobre a problemática na crítica de "Garota" (2018), mas para resumir: não podemos delimitar quem pode fazer o quê - contanto que o trabalho seja profissional e respeitoso. É o caso de Victor Polster como Lara. Sua entrega é louvável, tanto nas complicadas sequências de dança como nos vários momentos em que ele dá vida àquela menina trans cheia de bloqueios. Há verdade, há paixão e há excelência em tudo que está ao seu redor. Ele é um dos raros exemplos de atores cis a fazerem jus à escalação em papéis trans.

31. Leonardo DiCaprio – O Regresso

Personagem: Hugh Glass
Demorou, mas o dia chegou: Leonardo DiCaprio finalmente tem um Oscar para chamar de seu, e não poderia ser por um papel mais merecido. Uma cinebiografia, "O Regresso" (2015) segue os passos de Hugh Glass contra o frio, a fome e um urso enorme enquanto ferve uma vingança como combustível para sua perseverança. DiCaprio está avassaladoramente incrível, entregando-se de corpo e alma para transbordar as dificuldades do personagem - DiCaprio disse em várias entrevistas que "30 ou 40 sequências" foram as "mais difíceis" de toda a sua carreira, tendo entrado em rios congelantes, dormido com carcaça de animais e quase tendo hipotermia. Valeu a pena.

30. Regina Casé – Que Horas Ela Volta?

Personagem: Val
Não é uma surpresa que o melhor filme brasileiro da década também tenha a melhor atuação nacional do período. "Que Horas Ela Volta?" (2015) é, por muitos motivos, uma obra-prima, e um dos principais é Regina Casé, o cerne do filme, e sua atuação é irretocável. A atriz transmite por todos os poros o rosto desse Brasil de ontem e de hoje, as cores de uma fatia social enorme que vive nos becos da riqueza. Seus trejeitos, tom de fala e olhares são milimetricamente perfeitos, compondo uma personagem lotada de nuances e profundidade que vamos, pouco a pouco, adentrando sem nunca ficar raso.

29. Glenn Close – A Esposa

Personagem: Joan Castleman
Uma das atrizes mais aclamadas da história, Glenn Close já ganhou basicamente todos os principais prêmios do planeta, mas nunca o Oscar. "A Esposa" parecia ser o momento que a Academia sanaria sua dívida, mas não foi, o que não diminui a excelência em "A Esposa" (2017). Vivendo uma mulher que é soterrada pela sombra do marido, Glenn entrega o que podemos chamar de "atuação da carreira" quando, até mesmo em cenas em que não abre a boca, podemos sentir a intensidade do seu poder. E quando amarras são quebradas, o espetáculo é garantido.

28. Kirsten Dunst – Melancolia

Personagem: Justine
O mundo está prestes a acabar e Justine está se casando. "Melancolia" (2011) estuda a depressão diante do inevitável e como Justine busca preencher um vazio que em breve será justificado. Kristen Dunst, que venceu o prêmio de "Melhor Atriz" no Festival de Cannes 2011 pelo papel, alcançou territórios inéditos em sua carreira quando nos faz não conseguir imaginar outra atriz como Justine. A imprevisibilidade de sua protagonista deixa a performance ainda mais fascinante.

27. Marion Cotillard – Dois Dias, Uma Noite

Personagem: Sandra Bya
Marion Cotillard é dona da melhor atuação de todo o século: Édith Piaf em "Piaf: Um Hino ao Amor". Não por acaso, tudo o que a francesa faz é com perfeição, e, na atual década, nada supera Sandra em "Dois Dias, Uma Noite" (2014). Indicada ao Oscar, Cotillard é uma mãe de classe média que se vê engolida pelo desespero quando um dinheiro planejado não aparece - e ela deve convencer 14 outros trabalhadores a cederem um bônus, ou ela ficará sem nada. Nesse filme denúncia, Cotillard é pulsante, humana e, infelizmente, real.

26. Charlotte Rampling – 45 Anos

Personagem: Kate Mercer
"45 Anos" (2015) possui uma premissa instantaneamente cativante: perto de comemorar 45 anos de casamento, o marido de Kate recebe uma carta informando que o corpo de sua paixão da juventude foi encontrado. Ela então nota que, quanto mais próximo o aniversário está chegando, menos interessado o marido está. Charlotte Rampling (a verdadeira ganhadora do Oscar naquele ano) está longe do espectro de exagero: sua atuação é comedida e moderada, e é nos detalhes que o espetáculo habita. Na cena da dança, ela nem precisa de diálogos para gritar a verdade que estava tão herculanescamente tentando evitar.

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