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Crítica: “A Vida Invisível”, nosso representante ao Oscar, e o patriarcado tropical do dia a dia

Foi uma agradabilíssima surpresa quando "A Vida Invisível" venceu o prêmio de "Melhor Filme" na mostra "Um Certo Olhar" do Festival de Cannes 2019, acompanhando a vitória de "Bacurau" (2019) na competição principal, que levou o Prêmio do Júri. A vitória de dois filmes brasileiros numa mesma edição é reflexo da fase atual que nosso cinema vive – não por acaso, os dois foram os principais na disputa para a seleção do Oscar 2020 de “Melhor Filme Internacional” (o antigo “Filme Estrangeiro”).

"A Vida Invisível" é o primeiro longa brasileiro a vencer a "Um Certo Olhar", que só nos últimos tempos viu como ganhadores diversas obras-primas, como "Dente Canino" (2009), "Depois de Lúcia" (2012), "A Ovelha Negra" (2015), "Um Homem Íntegro" (2017) e "Fronteira" (2018). Mais uma honraria em seu currículo foi a escolha do filme para nos representar no Oscar, em uma acirrada disputa: “A Vida Invisível” foi o escolhido por um voto de diferença de “Bacurau”.

É necessário compreender que, se tratando do Oscar, as escolhas são feitas como uma campanha política. Vence quem melhor vender seu trabalho, não o melhor trabalho em si. Por isso, “A Vida Invisível” foi uma escolha muito acertada, mesmo não sendo o melhor filme nacional do ano. Os motivos são vários, porém destaco três pontos importantes.

O primeiro é que “Bacurau” possui um plot que coloca norte-americanos em posições bastante controversas para a Academia – imagine os votantes vendo gringos da forma que foram expostos no filme (não darei spoilers acerca). O segundo é que a história de “A Vida Invisível” é de mais fácil digestão por focar no melodrama, à la Pedro Almodóvar – e melodrama faz a Academia tremer na base. O terceiro é que a obra tem Fernanda Montenegro no elenco, a única atriz brasileira a ser indicada ao Oscar em toda a história, ou seja, é figura familiar. Depois da desastrosa escolha de “O Grande Circo Místico” (2018) na última edição, é para respirar aliviado ter um selecionado à altura da qualidade do cinema tupiniquim.

“A Vida Invisível” entra na intimidade de duas irmãs, Eurídice (Carol Duarte) e Guida (Julia Stockler), no Rio de Janeiro da década de 50 - curiosidade: assisti ao filme em companhia do diretor Karim Aïnouz e ele disse que o título foi alterado de "A Vida Invisível de Eurídice Gusmão", o nome do livro de Martha Batalha que inspirou o filme, para o atual por focar na vida de inúmeras mulheres invisibilizadas, não apenas na de Eurídice (e que seu título internacional favorito é o da Alemanha, "A Saudade das Irmãs Eurídice e Guida"). Filhas de imigrantes portugueses, as garotas são pesadamente reprimidas pelos pais, e desde o início demonstram as dinâmicas diante da repressão: enquanto Guida faz de tudo para burlar as rígidas regras do pai, Manuel (interpretado por Antônio Fonseca), Eurídice se molda de acordo com as leis paternas.


Guida se esgueira para cair na noite com seu namorado grego, e foge com ele sem aviso, para o desespero de Eurídice e a vergonha do pai. O evento é decisivo na vida de todos da família. Sem o apoio da rebelde irmã, Eurídice dança ainda mais conforme a música, aceitando o casamento arranjado com Antenor (Gregorio Duvivier), sem nunca ter visto o homem despido. Ela recebe, de uma amiga, dicas do que seria a noite de núpcias, mas nada a prepararia para um sexo tão brutal de um homem que via a esposa apenas como máquina de prazer particular - a sequência é proposital e corretamente horrível. Ela nem resiste, tão condicionada a obedecer o que viria de qualquer homem.

Enquanto isso, Guida volta da Grécia grávida e sem marido – a relação com o namorado acabara tão rápido como começara. Uma mulher fugida que retorna prenha e descasada era o que havia de mais humilhante para a imagem de uma família, e Manuel expulsa a filha de casa aos berros. Guida só queria saber de uma coisa, onde estava a irmã. O pai mente: Eurídice, exímia pianista, teria ido estudar em Viena. Ir até a Áustria se tornara, então, o objetivo de Guida.

A dinâmica do filme se torna essa: o pai mentindo para as duas irmãs. Eurídice imagina uma vida ensolarada nas praias da Grécia para Guida e Guida escreve sobre como Eurídice deve estar ocupada sendo uma famosa pianista e dando autógrafos aos europeus. A realidade é que ambas estão na mesma cidade. É deprimente ver como as irmãs projetam uma realidade para a outra que, a cada dia, mais impossível fica graças ao patriarcado. A película, maliciosamente, introduz uma cena em que as duas por pouquíssimo não se esbarram, gerando genuína tensão na plateia, ansiosa para o enfim reencontro das duas, que vão embora sem imaginar que a irmã estivera ali momentos antes. É astuto, então, lembrar da primeiríssima cena, onde as irmãs se perdem em uma floresta e, mesmo gritando o nome uma da outra, jamais conseguem se reunir, uma metáfora visual da trama.

Guida inicialmente decide abandonar o bebê recém-nascido, mas muda de ideia e resgata a criança quando conhece Filomena (Bárbara Santos, que também estava conosco na sessão), uma poderosa mulher negra que a acolhe como filha. Há uma forte ligação entre as duas através da sororidade, e Filomena é uma revolucionária em meados do séc. XX quando Guida noite após noite procura o homem da sua vida e ela responde com um esperto "A gente não precisa de homem para nos divertimos!".


Já Eurídice evita veementemente engravidar, pois isso atrapalharia o caminho rumo ao estrelato no piano. Antenor, em contrapartida, não dá a mínima, e a mulher acaba engravidando. O roteiro finca suas garras em um lado feminino até hoje repudiado: quando a mulher deliberadamente não quer ser mãe em prol de sua carreira. Para Eurídice, isso era inapropriado, com a família sendo o que há de mais importante na vida feminina. Rejeitar a maternidade era um crime. Ou ainda é? A personagem sofre um enorme baque ao ver seu sonho escorrer pelos seus dedos com uma criança indesejada por vir e a censura de todos os machos ao seu redor em relação ao seu sonho.

"Você não se importa com seu marido? Com sua família?", questiona Antenor. "Ele está completamente certo", acrescenta Manuel. E assim segue a vida de Eurídice, esbofeteada constantemente pela mão fantasmagórica do machismo. Talvez o viés mais afiado dentro do filme é o lado sexual de sua protagonista: para ela, o sexo é uma ferramenta de adestramento do marido, nunca um ato de prazer. Em uma emblemática cena, Antenor deseja transar em cima do piano da esposa enquanto ela toca, e ela insistentemente sugere o sofá. Ela não faz isso porque anseia a interação, e sim para que o marido não destrua o piano. Ela quer salvar o que lhe é mais caro e usa o sexo para isso.

A obra executa um belíssimo (e preocupante) estudo acerca do matrimônio. As mulheres são, há séculos, ensinadas desde sempre a perseguirem o casamento, a tábula de salvação de suas vidas. Os homens, é claro, não são educados com os mesmos fins. De uma forma bem aberta, o casamento nas lentes do filme é um contrato capitalista, pois estamos falando de relação de posse. O amor romântico existe para aprisionar as pessoas em regras egoístas que as tornam objetos, principalmente em relação a mulher - contudo, o patriarcado não é benéfico nem mesmo para o homem. Como se não bastasse, todas essas obrigações sociais são pintadas como um mar de rosas. Eurídice, no presente, ouve um "Foram 67 anos de casamento, que bonito!" do filho, e ela (e nós) sabemos que houve nada belo vindo dali; a protagonista penou naquele relacionamento infeliz, incapaz de quebrar suas correntes. Quem nunca viu o casamento dos avós com décadas adentro virando o exemplo de relação perfeita, sem saber das agressões que aconteceram por trás dos sorrisos fotográficos?

Majoritariamente passado na década de 50 - apenas as duas últimas cenas ocorrem no presente -, por mais desconfortável que seja a realidade daquelas mulheres, é um alívio ver como a vida feminina conseguiu mais direitos e liberdades 60 anos depois. O roteiro passeia por várias situações que exemplificam como o corpo feminino é subserviente ao homem - Guida não pode tirar o passaporte sem a permissão do marido que não existe -, e dá para ficar esperançoso em relação aos ritmos das conquistas feministas, porém, por outro lado, o homem continua igual mais de meio século depois. Aquele Antenor é o retrato fiel de tantos e tantos homens que fazem o Brasil ser o quinto país no ranking de feminicídios. "A Vida Invisível" não leva os atos às últimas consequências, mas é um filme sutilmente violento.

Aïnouz, após a sessão e os aplausos, falou que a película não se tratava de um filme feminista, mas sim uma obra contra o machismo, e essa é uma boa definição. Aquele microuniverso de classe média, de renegação social, de pobreza e marginalização, emula tantas e tantas histórias de resistência que qualquer um pode se sentir envolvido. Forte quando foca nas intimidações do patriarcado e emocionante quando entra no amor incondicional de duas irmãs que se separam graças à maquiavélica união de homens, "A Vida Invisível" é, além de sensacional exemplo do nosso majestoso cinema nacional no Oscar, um garboso melodrama que se torna um documento da nossa sociedade que deve, e muito, à vida feminina. Ter como uma das últimas cenas o rosto de Fernanda Montenegro afogada em saudade é lindo demais.

Pra ficar de olho: inspirado em Lizzo e Shawn Mendes, Miguel Ev lança o clipe da colorida “Não Voltar”

Surpresa boa no pop nacional, Miguel Ev é mais um nome que ganhou notoriedade após participar de um reality show nacional e, como de praxe, mostrou ter muito mais a oferecer após a saída do formato, do qual participou lá em 2016.

Dois anos após a estreia do seu primeiro EP, autointitulado, o ex-participante do X-Factor retorna ao som da colorida “Não Voltar”, com influências que vão do Shawn Mendes à Lizzo. Difícil dar ruim.

No clipe, dirigido pela Isabel Fleck, o artista gaúcho ilustra seu sentimento com o auxílio das cores roxo e laranja que, respectivamente, representam suas confusões num relacionamento e, posteriormente, a sensação de liberdade ao entender que o caminho é seguir em frente.

Tá lindo demais, olha só:



Nós amamos! E quanto mais nomes talentosos no pop nacional, melhor, porque ganhamos ainda mais fôlego pra toda a cena.

Pra ouvir mais do Miguel Ev, vale dar uma fuçada na sua página em plataformas como Deezer e Spotify, e também acompanhá-lo pelo Instagram. :)

Crítica: “Bacurau” e um Nordeste que não pensa duas vezes antes de meter a peixeira

Atenção: a crítica contém spoilers.

O Festival de Cannes 2019 foi um evento histórico para o cinema brasileiro; três diretores levaram prêmios na disputa: Karim Aïnouz com "A Vida Invisível" (o representante nacional para o Oscar 2020 de "Melhor Filme Internacional"), levando "Melhor Filme" na mostra "Um Certo Olhar"; e Juliano Dornelles & Kleber Mendonça Filho com "Bacurau", o primeiro tupiniquim a ganhar o Prêmio do Júri na história. Qual a semelhança entre os três? São todos nordestinos - Aïnouz é cearense enquanto a dupla Dornelles & KMF são pernambucanos.

"Bacurau" é o primeiro deles a estrear em solo brasileiro. Bacurau é um vilarejo nos confins do interior de Pernambuco. Teresa (Bárbara Colen) chega para o enterro da matriarca da cidade, ponto de virada no destino daquelas pessoas, coincidentemente ou não. Mas antes mesmo de dirigirmos pelas estradas de terra batida que nos levam a Bacurau, o longa começa bem distante, no espaço. Os créditos iniciais, ao som de "Não Identificado" na voz de Gal Costa, passeia pelas estrelas até focar no globo terrestre.

Nesse balé espacial, a câmera passa sem pudores por um satélite, flutuando despreocupadamente no que parece ser o céu acima do continental Brasil. Ao nos jogarmos no solo, o choque é gritante: demorei a conseguir por os pés no filme quando não entendia a relação de uma abertura tão contrastante com o meio em que a história se passa. Um letreiro avisa: estamos em um futuro próximo. As discrepâncias são propositais.

A própria música que nos dá boas-vindas já ilustra o que está por vir: "Minha paixão há de brilhar na noite no céu de uma cidade do interior como um objeto não identificado". A tecnologia dissonante está presente na vida dos habitantes de Bacurau, que estranham quando o vilarejo simplesmente some do mapa (literalmente): ao abrir um Google Maps da vida, não há rastro de Bacurau. Logo depois, os sinais de celulares caem misteriosamente, o caminhão pipa que abastece a população é baleado e pessoas começam a surgir assassinadas. E muito bom lembrar que, enquanto Teresa se aproxima de Bacurau, passa por um caminhão recheado com caixões tombado na estrada. Prelúdio para desgraças maior do que esse?


O primeiro ato do filme é bem lento, atento em construir uma atmosfera que em momento nenhum dá uma amostra do que existe por trás de cada cacto do sertão, todavia, dá para sentir o gosto de que há algo macabro, esperando o momento certo de dar as caras. O acontecimento que abre o segundo ato é a chegada de dois motoqueiros, que estão fazendo trilha pelo sertão.

"Vocês vieram conhecer o museu?", questiona uma das moradoras aos forasteiros, que declinam. "Ah mas o museu é muito bom", joga outra, e os visitantes continuam negando o convite, que logo vão embora. A cena é deveras emblemática e importantíssima para entendermos o que "Bacurau" quer nos dizer por trás da superfície árida do ecrã. Pensemos: o que toda cidade do interior desse país tem como lugar turístico principal: uma igreja. Bacurau também tem uma igrejinha muito simpática, contudo, ela não funciona eclesiasticamente: foi transformada em um depósito.

Os moradores de Bacurau não convidam os visitantes a irem na igreja da padroeira da região, e sim para irem até o museu. Eles são enfáticos quando afirmam a belezura que é a casinha com objetos e fotos do local, então, o que está sendo dito aqui? Quando a igreja é fechada e o museu se torna a atração turística, Bacurau está nos dizendo que o que mais importa para eles não é a religião, e sim a história.

A alegoria, muito sutil, é o primeiro grande reforço da obra em enaltecer o que há de valoroso naquela realidade: a identidade de seu povo. No futuro, as pessoas abrem mão da fé para valorizar a memória acima de tudo, afinal, é ela que molda a cultura de um local - e particulariza sua gente. Os visitantes, ao declinarem o convite de conhecer o museu, estão, narrativamente, informando sobre o pouco interesse na história. Soa familiar?


A câmera se desgruda de Bacurau e segue os motoqueiros, que estão com um grupo de norte-americanos em uma casa igualmente no meio do nada. São eles os responsáveis por todas os infortúnios quando estão criando um caos gradativo para gerar pânico e, assim, matar todos os habitantes de Bacurau. A cena é grotesca pelos absurdos que são jogados na mesa: os americanos estão em uma missão, garantindo pontos por cada pessoa assassinada. Tudo soa ainda pior quando há dois brasileiros ajudando a empreitada, encabeçada por uma figura misteriosa que fala nos pontos nos ouvidos dos "caçadores" gringos.

Os brasileiros informam que estão ajudando os americanos porque são do sul do país, a região rica e imigrante. "Nós somos quase como vocês", diz um deles, para a gargalhada dos estrangeiros, que dizem que ambos não são brancos. O estudo da xenofobia não poderia ser mais direto: tanto os "opressores" quanto os "oprimidos" (que bizarramente auxiliam os "opressores") tratam o nordestino como animais para o abate, seres sub-humanos que podem ser exterminados como divertimento.

A partir daqui, "Bacurau", que vinha sendo um drama, abocanha elementos do suspense e terror, principalmente dos slashers - os filmes com assassinos sanguinários caçando suas vítimas. Com a sacada da pontuação por morte, transformando o macabro em um jogo, conseguimos lembrar desde "O Albergue" (2005) até "A Deusa da Vingança" (2016). E, é claro, quando os peões são pontos no tabuleiro, "Bacurau" é um faroeste legítimo, alucinante e que faz qualquer um pular da cadeira.

O tratamento é bem binarista: Dornelles e KMF não estão aqui para tecer complexos aparatos psicológicos para seus personagens enquanto indivíduos com diferentes antecedentes. Os gringos são ruins, os habitantes de Bacurau são vítimas, e é assim mesmo, preto no branco. O que sustenta - com folga - essa dicotomia é tanto o cuidado do roteiro ao expor seus acontecimentos quanto o contexto histórico e social que "Bacurau" encontra em seu lançamento. Nada é gratuito.


A prova da falta de gratuidades é a pluralidade do povo de Bacurau: tem desde médicos e prostitutas até assassinos de aluguel e rebeldes renegados. Em algum momento, todos possuem diferenças que os fazem lutar entre si mesmos, como facções dentro do vilarejo, contudo, diante do perigo externo, a rabugenta Domingas de Sônia Braga (perfeita) e o cangaceiro não-binário de Silvero Pereira (mais perfeito ainda) sentam no mesmo lado da trincheira.

O filme ressignifica o cangaço enquanto unidade disposta a lutar contra o medo. O avanço da tropa gringa é recebido com preparação, e é milagroso ver o local escolhido para refugiar o povo de Bacurau: é a escola que garante a proteção de todos. O simbolismo alegórico mais uma vez dá um tapa na cara quando escolhe estrategicamente suas interpretações quanto ao real, e Bacurau pode ser fictícia, mas é governada por um prefeito inútil que controla desde a liberdade quanto os recursos, dados em muitas vezes de maneira precária. Não poderia ser mais verdadeiro.

"Bacurau" está lado a lado do que, sem modéstias, chamo de "Santíssima Trindade do cinema nacional moderno": "Que Horas Ela Volta?" (2015) de Anna Muylaerte e "Divino Amor" (2019) do também nordestino Gabriel Mascaro. Os três, cada um com sua abordagem, estudam, criticam e expõem os impropérios e desigualdades do nosso país de maneira igualmente brilhante e extremamente necessárias enquanto caminhamos para uma realidade que parece ter a cultura como elemento desimportante. Juntos, as três obras-primas tupiniquins não apenas comprovam a qualidade do nosso cinema como evocam o espírito de mudanças nesse país tão plural e que tem tanto a melhorar.

Se o povo de Bacurau, o vilarejo, dá o sangue para manter sua identidade viva contra quaisquer ameaças, "Bacurau", o filme, é uma dádiva que levanta a mão e grita "o cinema nacional resiste". E mais ainda: o cinema nordestino - que parece ser o polo principal da indústria contemporânea brasileira. Pondo seu local geográfico no protagonismo, é a terra que faz brotar o mandacaru que sabe onde estão os valores mais importantes de uma sociedade, e que não tem medo de descer a peixeira em quem tenta oprimi-la ou apagá-la. No faroeste psicodélico e distópico de "Bacurau", o Nordeste não vai pensar duas vezes antes de cair na capoeira, então não se meta.

Do pop ao funk, Kafé e Gloria Groove aquecem a cena nacional com “Chama”; assista ao clipe

Taca stream nessas lendas nacionais, gente!

Uma das revelações do R&B brasileiro dos últimos anos, o cantor baiano Kafé estreou nesta sexta um EP em parceria com Gloria Groove, no qual os artistas dividem os vocais de duas faixas: “Chama” e “Imensidão”.

Single principal do trabalho, a primeira canção já chegou com seu videoclipe e, numa mistura de pop, trap e funk, surge como sequência de “Apaga a Luz”, lançada por Gloria no ano passado, que ainda conta com um sample bem sutil no início e final da faixa.

No clipe, dirigido por Rafael Costaken, a ideia era transmitir a partida da tristeza - onde acaba “Apaga a Luz” - pra oportunidade de reacender a chama. E eles o fazem dançando entre cenários ora escuros, ora iluminados por muitas luzes fluorescentes e fogo. Amamos demais!


O EP “Chama” está disponível em todas as plataformas e foi produzido pelo coletivo Dogz, formado pelos produtores e compositores Pablo Bispo, Sérgio Santos e Ruxell, mesmos nomes por trás de hits da Iza, Pabllo Vittar e da própria Gloria.

Com Charli XCX, Pabllo Vittar garante seu passe para o pop internacional com “Flash Pose”

Nenhum lugar é longe demais para Pabllo Vittar.

Abrindo os trabalhos do seu novo disco, “111”, a cantora e drag brasileira revelou nesta sexta-feira o videoclipe do seu novo single, que é também a sua segunda colaboração com a artista britânica Charli XCX, “Flash Pose”.

Pela primeira vez cantando em inglês e se aproximando da chamada “drag music” nos EUA, ao exemplo das canções de RuPaul, Alaska, entre outras saídas de seu reality, “Flash Pose” é toda levada pelo eletrônico, do house ao PC Music, com produção que, apesar da pegada diferente de todos seus outros trabalhos, mantém a assinatura tanto da drag quanto do seu time de produtores, Brabo Music.

Passadas parcerias como “I Got It”, em PC Music com a própria Charli XCX, e “Energia”, com o duo de pop do futuro Sofi Tukker, a música nova, co-composta por Aluna Francis, do duo AlunaGeorge, é um passe e tanto para alavancar o nome de Pabllo dentro do novo cenário pop LGBTQ global, ao lado de artistas como Years & Years, Troye Sivan, Lil Nas X e, numa escala maior, Sam Smith, e caso ela mantenha o ritmo em seus passos seguintes, a credencial para tudo quanto é festival pelo próximo ano está mais do que garantida.


Com direção de Tragik, mesmo nome por trás de “Honey Baby”, da Kali Uchis, o clipe traz Pabllo e XCX trabalhadíssimas nas poses e carões, em meio a muito voguing, coreografia e cenas que transitam do preto e branco à estética supercolorida característica da PC Music. Olha só:


Get in my picture, pose!

“111” é o primeiro trabalho de Pabllo Vittar planejado para o público internacional e, além de inglês, é esperado que a brasileira também traga canções em espanhol e, claro, português. O disco é o terceiro de sua carreira, sucessor de “Vai Passar Mal” e “Não Para Não”, e deverá mesclar inúmeros gêneros, indo do pop e eletrônico às misturas com gêneros nacionais que marcaram seus principais hits.

O churrasco na laje tá garantido em “Brega Doido”, clipe novo da Keila para o disco “Malaka”

Valendo a máxima do meme “ai Gabi, só quem viveu, sabe”, é impossível ouvir ao novo single da Keila Treme sem se lembrar de 2013, quando a artista paraense chegava pela primeira vez aos nossos ouvidos à frente da Gang do Eletro.

Seis anos mais tarde, Keila retoma o mesmo ritmo frenético e colorido da banda que dividiu os holofotes daquela época com nomes como Gaby Amarantos e Banda Uó e, prestes a lançar seu primeiro disco em carreira solo, “Malaka”, revela o videoclipe da obrigatória “Brega Doido”.

Na direção de Luiza Chedieck, o clipe vai do churrasco na laje à quebrada de quadril na aparelhagem, transbordando gingado ao som da faixa que, desde a primeira audição, dificilmente sairá da sua cabeça.


“Malaka”, o primeiro disco solo de Keila, estreia no dia 9 de agosto sob o selo Natura Musical.

Crítica: “Morto Não Fala”, nosso “Invocação do Mal”, engrossa o mercado de terror nacional

Se o terror é um dos gêneros mais lucrativos em outros mercados, no Brasil é nicho. Ainda não temos uma cultura cinematográfica solidificada que foque na produção de nomes dentro do gênero, mas essa realidade está mudando. Estamos em meio a um boom de interesse da indústria pelo terror, e películas do gênero surgem cada dia mais, como "Um Ramo" (2007), "Trabalhar Cansa" (2011), "Quando Eu Era Vivo" (2014), "O Animal Cordial" (2018), "Virgens Acorrentadas" (2018) e "As Boas Maneiras" (2018) - e com certeza há mais, sem conseguir chegar na superfície das grandes distribuições.

Mesmo mesclando elementos do gênero ou indo com mais sede ao pote, ainda não tínhamos sido agraciados por um terror que esteja num patamar que o retire do puro Cinema B - o que há de mais comum, quando o horror cai na sátira ou trash, o que não é um demérito. Finalmente nossos problemas acabaram: "Morto Não Fala" está aqui para resolver essa questão.

Dirigido por Dennison Ramalho, com um currículo vasto dentro do gênero, o filme segue os passos de Stênio (Daniel de Oliveira, em mais uma boa performance para a carreira - vide "Aos Teus Olhos", (2018). Antes mesmo de o conhecermos enquanto pessoa, o conhecemos enquanto profissional: o homem é platonista noturno de um necrotério e possui o dom de falar com os mortos. Nas longas madrugadas de trabalho, ele conversa com os cadáveres, sabendo de suas histórias e quais os tortuosos caminhos os levaram até sua maca.


Obviamente, a fita não perde tempo tentando explicar como Stênio possui a habilidade, e isso não importa. Para minha surpresa, li diversos comentários cheios de reclamação sobre o filme não explanar isso, mas "O Sexto Sentido" (1999) por acaso dá a explicação de como o protagonista enxerga gente morta? Assim como na clara fonte de "Morto Não Fala", tal pontuação diminuiria o filme - não dá pra explicar de modo crível algo que é impossível. A suspensão da descrença é o mínimo que o filme pede.

No seio de uma grande metrópole, apesar de não ficar claro qual (me pareceu ser o Rio de Janeiro), o necrotério raramente está vazio. E, como terror nato, os mortos que chegam até Stênio não padeceram de causas naturais: ensanguentados e muitas vezes com partes faltando, o primeiro baque que abre as portas para o horror é a exposição dos corpos em ruínas, e a obra não poupa litros de sangue - o gore explícito pode revirar o estômago da plateia. As sequências com autópsias são fidedignas e conseguem arrepiar, aliando o body horror com o fantástico. É quase divertido acompanhar o protagonista dialogando com o cadáver enquanto costura sua caixa torácica.

Se é a violência que leva os defuntos até Stênio, o roteiro inteligentemente enfia suas garras no corpo social: a maioria dos mortos é negra, mais especificamente homens, marginalizados e periféricos. Vindouros de presídios, caídos por rivalidade de gangues ou por acidentes naturais sobre suas precárias moradias, "Morto Não Fala" vai à fundo da roda de extermínio que funciona no nosso país. Um deles, um homem que foi dedurado para a polícia, conta melancolicamente sobre sua árdua vida; o assassinato do pai realizado por ele mesmo e o irmão, visando proteger a mãe, vítima de abusos; e a forma como a miséria hereditária leva essas pessoas ao derradeiro fim. É como um vírus que delimita o prazo de validade dessa população.


Enquanto trabalha no corpo de um conhecido da região onde mora, Stênio descobre que sua esposa, Odete (Fabíula Nascimento, que aclamo sempre que aparece por aqui), está o traindo com o dono da venda da esquina, Jaime (Marco Ricca). Stênio então rapidamente levanta um plano: culpar Jaime pela morte do homem dedurado, indo até a favela e falando com o irmão do falecido, líder da gangue e sedento por vingança.

Inúmeras configurações do terror passeiam por toda a duração de "Morto Não Fala", contudo, o que une toda a produção de maneira sólida é o drama familiar. Bem verdade que "Morto Não Fala" possui um formato saturado - será se precisamos de ainda mais versões de espíritos bagunçando a vida dos vivos? Odete repudia o marido e sua medíocre vida, encontrando em Jaime a válvula de escape da conclusão doméstica que ela não esperava - o adultério alivia os filhos rebeldes, as contas acumuladas e o casamento falido. Situações que colocam o marido traído em posição de retaliação existem desde que o mundo é o mundo, porém, a fita encontra o sucesso da novidade ao mudar o passarinho que assovia na orelha do corno tal informação: agora é um cadáver.

Os rumos sofrem drásticos desvios quando, no momento que a morte encomendada de Jaime surge, Odete está com ele, o que também a leva ao assassinato. Mesmo Stênio não prevendo, o choque inicial dá lugar a uma lúgubre sensação de superioridade por parte do protagonista, que tortura psicologicamente a esposa, impotente diante do fato de que ele foi o culpado. A dinâmica entre Stênio e o corpo de Odete é fabulosa, o momento que a premissa básica do filme encontra maior força.


A partir de então, a vida do homem vira um inferno: usar informação dada por um morto para matar inocentes é maldição certeira. O espírito de Odete coloca o Satanás no chinelo ao passar a aterrorizar a própria família; é então que "Morto Não Fala" deixa de ser uma mistura de "Cadáver" (2018) com "Se7en: Os Sete Crimes Capitais" (1995) para virar "Invocação do Mal" (2013). São portas escancaradas, móveis saindo do lugar e personagens sendo arremessados por forças invisíveis, e não consigo lembrar de uma produção nacional que entre nesse formato, popularizado por Hollywood.

E não tome isso como um demérito: é interessantíssimo ver um filme brasileiro indo onde obras gigantes dominam e se saindo tão polido. Tanto em termos de linguagem como técnico, "Morto Não Fala" deve em nada aos inúmeros e malfadados filmes que se apropriam do sobrenatural enquanto filhotes das maiores produtoras do planeta, e vai mais longe, superando-os. E isso se deve ao cuidado do roteiro em sedimentar todos os caminhos antes de cair no eletrizante clímax, com demônios arrastando as pobres vítimas. "Morto Não Fala" é um terror que respeita o que há de mais elementar na arte, que é seu texto, o que o mantém fixo. Há, sim, fragilidades, principalmente quando cai no lado mais pipocão ou quando se torna demasiadamente expositivo, todavia, nada que abale irremediavelmente seu trabalho.

Um crítico internacional analisando "Morto Não Fala" com certeza não vai receber o mesmo impacto que um brasileiro; e não por motivos de regionalismos - o filme é deveras internacional, tanto que atualmente possui generosos 89% de aprovação no Rotten Tomatoes. Afirmo pois, para alguém aquém da nossa indústria, não existirá a mesma sensação de glória ao ver uma produção verde-e-amarelo no mesmo nível do que é lançado quase diariamente no quintal deles. Saindo vencedor no drama, no suspense e no terror, "Morto Não Fala" é uma revelação que engrossa as colunas de um gênero cada vez mais visado dentro de um país ainda tão monotemático.

Crítica: o Brasil do futuro de “Divino Amor” é um luminoso cabaré gospel

Atenção: a crítica contém detalhes da trama.

Brasil, 2027. A sociedade tupiniquim caminhou para um sistema ultra-religioso, com a palavra de deus sendo a lei básica. Uma tabeliã, Joana (Dira Paes), vive com plenitude dentro do novo país, e usa de sua função para dificultar divórcios, afinal, o casamento é o que há de mais sagrado no mundo. Aliás, sua vida é quase plena: ela e o marido, Danilo (Julio Machado), há tempos tentam ter um filho, sem sucesso, a provação extrema do altíssimo.

"Divino Amor", novo filme de Gabriel Mascaro, diretor pernambucano do maravilhoso "Boi Neon" (2015), estreou em dois dos maiores festivais do planeta, Sundance e Berlim, saindo ovacionado de ambos: atualmente conta com incríveis 86 pontos no Metacritic, uma das maiores notas do ano. Junto com "Bacurau", vencedor do Festival de Cannes, temos dois fortíssimos nomes para representar o Brasil no Oscar 2019, caso o novo Ministério da Cultura não surte como nos últimos anos, indicando longas sem a menor chance em nome de um conservadorismo patético - "Aquarius" (2016) e "Benzinho" (2018) sendo boicotados, um crime para nossa cultura.


Por meio de uma infantil narração onipresente, o texto de "Divino Amor" coloca na mesa as regras desse Brasil gospel. A religião evangélica está agora presente em todos os cantos, incluindo em versão drive thru - o fiel chega com seu carro para uma rápida palavrinha com um pastor, que coloca um hino de louvor para fortalecer a fé. Os retangulares templos ficaram obsoletos, e as festividades agora são ao céu aberto, em shows entupidos de pirotecnia e música eletrônica a fim de saudar deus. Joana ama tudo isso.


É muito engenhosa a forma com que o roteiro finca as normas e dá as naturalidades para o que é normal dessa realidade tão distópica. E é impossível não lembrar da série "The Handmaid's Tale" (2017-presente), um também futuro estadunidense à base da religião; a grande diferença entre as duas obras é o foco óptico. Em "Handmaid's", June nos conduz por meio das ruas opressoras de sua vida, enquanto em "Divino Amor" é Joana a porta-voz, que, ao contrário de June, celebra o sistema.

Não existe uma noção de resistência ou revolução dentro de "Divino Amor": tudo funciona (quase) dento da perfeição almejada. A película não está interessada em gerar uma sensação de quebra, de luta, e sim questionar como algo tão radical é prejudicial até mesmo para aqueles que tanto gozam de seus prazeres. Notem: por ser um sistema baseado no evangelho, todas as configurações são heterossexuais. Não existe o menor resquício de homossexualidade, com a união do homem e mulher sendo irretocável.

Fica bem claro que a fita não está, em segundo algum, batendo palmas para o que surge no ecrã, pelo contrário. Há uma pungente ironia que dosa perfeitamente o ridículo e o desconfortável, entrando cada vez mais nas insanidades desse Brasil onde a burocracia é sagrada. E Joana faz tudo o que pode para dificultar os divórcios, manipulando, mentindo e omitindo detalhes para que os casais permaneçam unidos diante dos olhos do Senhor - e ela guarda com imenso amor uma estante cheia de fotos dos casais que ela conseguiu evitar a separação. Deus está lá em cima em festa.


E, dentro desse governo, existe a Divino Amor, uma seita (essa palavra não é dita, todavia, é a melhor definição para aquilo) que funciona como ritual de inicialização dos casais nas escrituras. Há dinâmicas de grupo, leitura da palavra e procedimentos menos ortodoxos. Joana e Danilo fazem trocas de casais com os novatos, e a erótica câmera do filme não tem pudores em capturar o inquietante swing divino sob luzes neon - curiosamente, vários casais saíram da sessão em que eu estava já na primeira cena de sexo. Puritanos, vejo bem.

Esse é o novo Brasil, um cabaré gospel. O ethos construído pelo roteiro une o conservadorismo hipócrita com os pecados da carne, convenientemente convertidos em dádivas quando o lema da Divino Amor é "Quem ama divide". O fundamentalismo não tem vergonha ao se arvorar do bacanal como veículo de encontro com deus, porém não se engane: o bordel instaurado é muito bem controlado, com cada corpo e status social sendo verificado por máquinas nas entradas de todas as instituições, no melhor estilo "Black Mirror" (2011-presente).

Outra grande dualidade do longa é a configuração do relacionamento da protagonista: matriarcal, é ela quem sai de casa para trazer o sustento, enquanto o marido trabalha na pequena loja de flores que fica onde os dois moram. É mais uma forma de conservadorismo que une o passado e o futuro, que acolhe traços opressores sem deixar de soar moderneco - quando lhe convém, é claro. A culpa também é do marido do insucesso da procriação, mesmo se submetendo a diversos (e constrangedores) procedimentos de fertilização - in vitro é fora de questão, coisa do diabo. A semente dada por deus deve ser plantada diretamente na mulher.

É aí que Joana finalmente engravida. Aos prantos, ela ora com fervor, enchendo o todo poderoso de agradecimentos pela graça alcançada. Só que, ao extrair o DNA do feto, ele não é compatível com Danilo. A melhor cena da obra, a protagonista vai se apavorando cada vez que digita o nome dos vários homens com quem transou na Divino Amor, e todos incompatíveis. Sua única solução é óbvia: o filho no seu ventre é a volta do Messias.


O grande sucesso de "Divino Amor", um estranho drama que mistura ficção-científica com humor negro, é provido pela linguagem escolhida por Gabriel Mascaro. Toda a bizarrice (que não é pouca) é conduzida de maneira fluida por meio dos planos sequências que não quebram as cenas, quase como se a trama estivesse numa câmera lenta que combina magistralmente com a áurea sacra do filme.

A união de luzes naturais, em momentos que mal conseguimos ver o que está acontecendo, com luzes artificiais coloridíssimas, geram imageticamente esse futuro desconcertante que cega o fiel - e em diversos momentos me remetia a "Demônio de Neon" (2016) quando o filme de Mascaro adotava uma atmosfera onírica pelas cores e músicas narcotizantes. Dira Paes realiza uma performance competente quando doa seu corpo por inteiro, sem jamais soar caricata - talvez por ser um peão que reforça seu meio. É belo ver como a fita a enquadra, muitas vezes em contra-luz, como se deus estivesse banhando-a em toda a sua glória.

Apesar da era de resseção cultural tupiniquim, estamos emergindo através do Cinema, com nomes cada vez mais criativos ao unirem ineditismos com críticas sociais. Um efeito colateral benigno das pressões de um país em crise, temos, por exemplo, o fabuloso "As Boas Maneiras" (2018), que também escorre bizarrices para estudar nosso país - o mesmo que aconteceu na Grécia com a chamada "Estranha Onda Grega": movimento cinematográfico que surgiu com sua depressão econômica - vide "Dente Canino" (2009), "Chevalier" (2015) e "Piedade" (2018). Talvez estejamos diante de um novo apogeu.

O mais assustador de "Divino Amor" é sua consonância com o agora do nosso país: cada vez mais reacionário e com a bancada evangélica em plena força. O exagero do ufanismo religioso é prato cheio dentro da arte, e a película a escancara acidamente, na mesma medida em que alerta o avanço do fanatismo. Não é difícil vislumbrar essa realidade que tem a certidão de casamento como o principal documento, afinal, já está sendo valorizada a procriação e a família normativa na nossa pequenina distopia, sob o lema "deus acima de tudo". Num país que parece não haver regras, justiça e equidade, o cabaré sagrado de "Divino Amor" soa preocupantemente plausível.

Pediram um hit junino aí? Vem ouvir “Ribuliço”, música nova do Omulu com a drag Potyguara Bardo

Nem só de carnaval viverás o homem. E o DJ e produtor carioca Omulu, que neste ano já lançou parcerias com Duda Beat (“Meu jeito de amar”), Luedji Luana (“Tô te querendo”) e ÀTTØØXXÁ (“Chora Viola”) sabe disso melhor do que ninguém e, desta vez, decidiu entrar no clima de festa junina com sua nova colaboração: “Ribuliço”.

Mantendo a proposta de revelar novas vozes e ritmos da música brasileira, a nova parceria de Omulu conta com vocais da drag norte-rio-grandense Potyguara Bardo, que lançou no último ano o disco “Simulacre”, onde passeia por referências que vai da house music ao folclore brasileiro, se destacando pelo formato de som e visual diferente do que outros artistas vinham explorando no pop nacional.

A mistura de gêneros, sempre presente nos trabalhos do produtor, que tem no currículo artistas como Elza Soares e Pabllo Vittar, aqui acontece no encontro entre o forró e reggaeton, fazendo de “Ribuliço” uma opção para dançar muito além das festas de junho.

Ouça abaixo:



“A galera sempre me cobra pra soltar música de festa junina desde o remix que fiz do Wesley Safadão”, contou Omulu, que completa: “Quis fazer algo bem lúdico, com uma vibe de forrós antigos, então criei a melodia da sanfona e, logo de cara, achei que ficaria demais com a voz da Potyguara.”


A combinação não poderia ter sido melhor. Artista independente, Potyguara revela que se ofereceu para cantar nesta faixa em contato com o produtor pelo Twitter e, tão logo ouviu suas batidas, logo trocaram algumas referências que resultaram na faixa que ouvimos agora. “Oficialmente, meu primeiro batekoo”, brinca a drag. Tá feito o ribuliço.

Sucesso dos anos 90 e 2000, Acústico MTV retornará com Tiago Iorc

Sucesso dos anos 90 até o final da década de 2000, o especial “Acústico MTV” marcou não só a carreira de inúmeros artistas brasileiros, como a indústria musical nacional como um todo e, na onda de retornos que já nos trouxe de séries à velhos artistas, tá pronto para retornar à programação da emissora.

Em sua nova edição, o Acústico MTV deverá estrear com uma apresentação do cantor Tiago Iorc, que passou os últimos meses sumido e, há algumas semanas, surgiu com o disco “Reconstrução”, emplacando todas as faixas do novo trabalho entre as mais ouvidas das plataformas de streaming.


Apesar da sonoridade de Iorc já ser levada por uma proposta voz e violão, a escolha do nome faz sentido se pensarmos nos passos da MTV americana com o “Unplugged”, que retomou suas atividades em 2017 com o cantor Shawn Mendes. O disco derivado do programa, entretanto, teve um desempenho muito abaixo do esperado, estreando na 71ª posição da Billboard, com cerca de 9 mil cópias vendidas (somando os streamings).

No Brasil, os nomes que já passaram pelo antigo Acústico MTV vão desde Legião Urbana ao ‘Tribalista’ Arnaldo Antunes. Artistas como Cássia Eller, Lenine, Paralamas do Sucesso, Zeca Pagodinho e Paulinho da Viola chegaram a ganhar troféus do Grammy Latino com suas passagens pelo programa.

Ainda sem previsão de estreia para o show com Tiago Iorc, ficamos nas apostas quanto aos nomes que sucederão a sua passagem. Vale um revival com Sandy & Junior? Podemos considerar obrigatória uma passagem da Iza? Fresno, talvez? Pitty, sim ou claro? E Anavitória? Queremos, sim, chorar com Anavitória.

Não para não! Pabllo Vittar anuncia disco “111”, dividido em duas partes com músicas em 3 idiomas

Eita, menina! Pabllo Vittar nem encerrou a era “Não Para Não”, que rendeu singles como “Disk Me” e “Buzina”, e já tem planejado todos seus próximos passos, o que inclui um novo álbum, dividido em duas partes e, pra nossa surpresa, composto por faixas em três idiomas diferentes.

O novo trabalho da drag se chamará “111” (referência ao seu aniversário, 1º de novembro) e, sendo sua primeira aposta desde a projeção internacional pós-Coachella, onde se apresentou com o duo Sofi Tukker, contará com músicas em português, espanhol em inglês.

Ainda sem previsão de estreia, o disco (isso aí, não será EP) virá dividido em duas partes e, como a própria cantora adiantou em suas redes sociais, ambas contarão tanto com parcerias quanto com músicas solos, do jeitinho que a gente gosta. O primeiro single já está definido.

Entre “Não Para Não” e seu disco de estreia, “Vai Passar Mal”, foram várias as investidas de Vittar no cenário internacional: a drag participou de “I Got It”, da Charli XCX, “Caliente”, da mexicana Lali, e “Energía”, do Sofi Tukker. Além de, claro, o hit “Sua Cara”, com Major Lazer, e as parcerias com Diplo em “Então Vai” e “Seu Crime”. Requisitadíssima.


Vem ver “Você Bagunçou Comigo” e conhecer o som do maranhense Yhago Sebaz

Nordeste continua carregando a música brasileira nas costas e após revelar nomes como Pabllo Vittar e Baco Exu do Blues, nos traz mais uma aposta que tem tudo pra fazer muito barulho pelo pop nacional: a gente tá falando do maravilhoso Yhago Sebaz.

Com influências que vão do soul ao R&B e hip-hop, abraçadas em referências e toda uma roupagem pop, o músico maranhense lançou seu primeiro trabalho em 2014, com o disco “#NegoBeats”, mas retorna agora com mudanças e redescobertas resultadas do que vivenciou nos últimos anos, desde sua mudança para São Paulo, que serão contadas e cantadas no EP “Meio Amargo”, previsto para o dia 24 de maio.

O EP, que até então já contava com os singles “Em cima de mim” e “Vou embora”, é descrito como um encontro do brega e sofrência com o canadense The Weeknd e, antes de sua estreia, ganha o reforço da nova música de trabalho de Yhago, “Você bagunçou comigo”, que já chega acompanhada de um videoclipe no qual o cantor vive o desgaste de um relacionamento abusivo.

Dá só uma olhada:


Em “Meio Amargo”, Sebaz apresenta produções de Alladin, Memel Nogueira, Pupoico, Tainan e Brunoso (que já passou por aqui com “Juçara”, da drag e também maranhense Enme), com letras que exploram sua vivência enquanto negro e gay, e batidas que, da mescla de suas influências gringas aos sons brasileiros, nos guiam numa jornada pop embarcada na musicalidade afrofuturista.

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