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Esse é um post de agradecimento à Kesha pelo "Rainbow" e por não ter desistido

Não foi fácil, mas Kesha conseguiu. Hoje, 11 de agosto, finalmente podemos escutar o "Rainbow", álbum que reflete as experiências que a cantora viveu nesses últimos anos: a depressão, o transtorno alimentar e a necessidade de se ver livre da presença de um homem abusivo. 

Travando uma batalha judicial para quebrar o contrato que assinou aos 18 anos de idade com Dr. Luke, Kesha pôde gravar seu novo disco com diferentes colaboradores e sem a presença do produtor, ainda que não esteja livre dele: os lucros sob seu trabalho são dele e de sua gravadora, a Kemosabe Records. O cara continua tendo influência sobre a carreira dela a ponto de ter que aprovar tudo que ela lança – como foi o caso de "Praying", música que serve como uma resposta a ele e a toda essa situação. 



Mas Kesha não desistiu, não se calou e, ainda que não esteja totalmente livre, fez o que pôde com a sua meia liberdade e lançou um dos melhores disco de 2017. "Rainbow" é uma evolução do que já vimos a americana fazer e é também seu momento mais autêntico. Com letras sobre superação do passado, empoderamento feminino, autoaceitação e amor próprio além de, claro, os bons e velhos relacionamentos, a cantora entrega um material que, ao fim, nos faz pensar o quão injusto foi esse talento estar preso por quase cinco anos. 

Abrindo o disco, temos "Bastards", uma das melhores canções do registro. Contextualizando de primeira o trabalho, Kesha fala para que não nos deixemos abater pelas pessoas ruins que cruzam o nosso caminho. Em "Let 'Em Talk" a temática é a mesma, só que mais raivosa e rockeira, afinal, é uma parceria com o Eagles of Death Metal. A busca pela superação atinge seu ápice na faixa título, uma das melhores – se não a melhor –  do CD. 



Entre as músicas já lançadas, como a balada poderosa e que só faz subir no iTunes US, "Praying", nossa favorita é "Woman", faixa divertida (as risadas da Kesha, gente!) onde, mesmo tendo sido abusada sexualmente e psicologicamente, a hitmaker grita pra quem quiser ouvir que ela é um mulherão da porra e que não precisa de ninguém. 

O disco termina com "Spaceship", música onde Kesha mostra sua influência country que permeia todo o trabalho, como em "Hunt You Down" e em "Old Flames (Can't Hold a Candle To You)", parceria com a Dolly Parton, e canta sobre a vez que, segunda a própria, estava completamente sóbria e sem nenhuma substância alucinógena em seu corpo quando viu discos voadores. Quem sabe? In Kesha we trust

Obrigada, Kesha, pelo "Rainbow", por não ter desistido e por nos inspirar todos os dias. Esse momento é seu! <3 

Afinal, quem é Camila Cabello?

Camila Cabello teve uma saída pra lá de conturbada do Fifth Harmony, em dezembro do ano passado. Na época, o grupo teria anunciado a partida da cantora sem que ela fosse previamente anunciada, até que, após uma troca pública de textões, os dois lados entenderam que era hora de seguir em frente.

Quando o integrante de um grupo famoso toma uma decisão como essa, é comum que falem sobre liberdade criativa, oportunidade de ser quem realmente é e, sem toda a rigidez cobrada de um grupo, espaço para ousar, musicalmente falando, mas, faltando pouco mais de um mês para a estreia do seu primeiro álbum, nada disso nos foi oferecido.



O primeiro passo de Camila Cabello em sua carreira solo veio com “Crying In The Club”. Soando como tantas outras lançadas entre “Shape of You”, do Ed Sheeran, e “Cheap Thrills”, da Sia que, inclusive, assina como co-compositora da faixa, a produção se apoia num sample de “Genie In A Bottle”, da Christina Aguilera, e transforma o que poderia se tornar uma brilhante recordação pop em uma das faixas mais descartáveis do ano. Ao menos sendo dançante, precisamos dizer.

Ao lado de “Crying”, Camila lançou ainda a baladinha “I Have Questions” e, numa  oportunidade de explorar melhor sua voz, fez justamente o oposto: repetiu do início ao fim as técnicas da compositora da faixa, Bibi Bourelly, ao ponto de, em vários momentos, nos questionarmos se não seria a própria Bibi assumindo os vocais.



Bibi Bourelly tem uma voz e técnica bastante marcantes, também emulados pela Rihanna em outra música escrita por ela, “Bitch Better Have My Money”. Falando de Cabello, as semelhanças ficam mais perceptíveis ao ouvir músicas como “Riot”, “Ego” e “Poet”, do repertório da compositora.



Entre as colaborações lançadas enquanto divulgava seus próprios singles, Camila Cabello também ficou bastante perdida. “Love Incredible”, com Cashmere Cat, traz a cantora com vocais bem próximos da Ariana Grande, que também trabalhou com o produtor em músicas como “Adore”e “Quit”, e com o Major Lazer, em “Know No Better”, ela enfim parece soar como a mesma Camila do Fifth Harmony, mas sem nos oferecer nada demais.



Se a identidade de Camila já não estava muito clara até aqui, as coisas só se confundem mais com suas músicas novas, “Havana” e “OMG”. Não dá pra negar que ambas as faixas são muito interessantes e, se esbarrarmos numa playlist do Spotify, dificilmente deixaremos passar, mas elas falham no que nenhum dos seus singles anteriores foi capaz de fazer: nos mostrar seu verdadeiro potencial.

“Havana”, a favorita do público desde que as duas foram lançadas, soa como uma demo da Rihanna. Numa tentativa de resgatar suas origens cubanas, a música leva a cantora para um lado bem menos genérico que suas outras canções, mas pouco soma a sua carreira como um todo, aqui nos lembrando de dois outros nomes: é como se Ariana Grande cantasse “Same Old Love”, da Selena Gomez.



E ainda mais genérica, “OMG” nos dá a impressão de que Camila ouviu e tentou repetir algo que curtiu da Rihanna, em discos como “Talk That Talk” ou “Unapologetic”, e falhou, claramente. Mais levada para o hip-hop, a música consegue ser tão urbana quanto qualquer coisa lançada nos últimos meses pela Bebe Rexha ou Katy Perry, ainda que seja divertida. O que realmente não salvamos é a participação do Quavo, mas qual artista não lançou uma música com ele ou com o Migos neste ano?



Não dá pra negar que Camila Cabello sempre foi uma das integrantes com maior destaque no Fifth Harmony (e de uma presença de palco absurda; me lembro até hoje de como deixei o primeiro show delas em São Paulo, no Z Festival, caindo de amores pela dona de “Crying In The Club”), mas, em suas faixas solos, é como se todo esse brilho se perdesse, enquanto ela se atrapalha em tentativas de repetir o que já funcionou com outros artistas.

Depois de tantas músicas genéricas e esquecíveis, a cantora se vê com apenas algumas semanas para se fazer relevante ou, na melhor das hipóteses, minimamente interessante, enquanto lida com um público que, na primeira oportunidade, não hesitará em troca-la por qualquer um dos nomes que ela provavelmente tem visto como inspiração.

A gente gosta das canções, são pelo menos divertidas, e torcemos bastante por essa nova fase, mas nada do que fez até aqui responde nossa pergunta inicial: afinal, quem é Camila Cabello?

Você não precisa gostar de funk para ser contra o projeto de criminalização do gênero

No mesmo ano em que artistas como MC Carol e MC Bin Laden representaram a cultura brasileira no palco do Red Bull Music Academy Festival, em Nova York, o Brasil se propôs a discutir a possível criminalização do funk, partida de uma sugestão do empresário Marcelo Alonso no site do Senado, no qual reuniu mais de 20 mil assinaturas – número suficiente pra que a ideia seja enviada para análise pela Comissão de Direitos Humanos.

Em sua proposta, o empresário, que também mantém uma página do Facebook chamada “Funk é lixo”, afirma que o gênero parte de uma “falsa cultura” e promove, entre outras coisas, crimes como estupro e pedofilia, principalmente contra adolescentes menores de idade.

O relator do caso no Congresso Nacional será o senador Romário (PSB/RJ), que já se manifestou contra a proposta e, para somar a discussão, quer levar artistas como Anitta, Valesca Popozuda, Nego do Borel e MC Marcinho para opinarem sobre o assunto.

Nos últimos anos, foram muitas as conquistas do funk para a cultura e indústria brasileira. O gênero, que atualmente lidera as principais paradas de plataformas como Youtube e Spotify, foi responsável por revelar algumas das maiores artistas do nosso cenário atual e, dos grandes artistas aos independentes, se tornou um importante meio de movimentação econômica, gerando empregos e se transformando numa fonte de renda em diferentes dimensões.

Bem distante da visão retrógrada do autor dessa proposta de criminalização, o funk também se viu como um meio de protesto, dando voz para minorias e artistas de periferia, que cantaram dos seus prazeres às dores, dançando da ostentação dos morros paulistas e cariocas à liberdade de serem vadias todos os dias, da luta e resistência negra à luta e resistência LGBTQ e feminista. E, no fundo, a gente sabe que isso incomoda.

Menos de um ano desde que o país se viu presidido por um governo ilegítimo, foram muitas as perdas e lutas dos movimentos sociais para que seguissem existindo. O conservadorismo, alastrado de forma sintomática por todo o mundo, aqui se viu apoiado pelos líderes dos partidos no poder e ainda que, numa democracia, a voz do povo devesse ser a mais alta, essa é aquela que menos escutamos, enquanto assistimos à deterioração de nossos espaços e direitos, como foram os casos de luta contra a pichação e grafite e, posteriormente, aos dependentes químicos da região da Cracolândia, em São Paulo. 

Isso porque não falamos da retirada de bens dos moradores de rua, dos presos políticos ao longo das últimas manifestações democráticas, da empatia pelos brancos de turbante que inexiste com as vítimas diárias do racismo e do silêncio das panelas em todas as vezes que cobramos que olhassem para seus respectivos rabos.

Pensando assim, não é difícil compreender como uma proposta dessas angariou vinte mil assinaturas tão facilmente e, neste ponto, nos vem à lembrança do documentário “A 13ª Emenda”, da Netflix, no qual é discutido a maneira como os Estados Unidos perpetuaram a escravidão até os dias atuais por meio do seu sistema de encarceramento em massa, e, numa fala específica do assessor de Nixon, sobre a campanha presidencial americana de 1968, explica a maneira como eles criminalizaram as comunidades periféricas indiretamente, ao passo que tornavam elementos associados a elas como algo prejudicial para a sociedade.

A campanha de Nixon em 1968, e a Casa Branca de Nixon após isso, tinham dois inimigos: a esquerda pacifista e as pessoas negras. (...) Nós sabíamos que não poderíamos tornar ilegal tanto ser contra as guerras ou negros, mas ao fazer o público associar os hippies com a maconha e os negros com a heroína, e depois criminaliza-los rigidamente, nós podíamos corromper essas comunidades. Nós podíamos prender seus líderes, vasculhar suas casas, acabar com suas reuniões e caluniá-los noite após noite nos noticiários. Nós sabíamos que estávamos mentindo sobre as drogas? É claro que sim, explicou John Ehrlichman.

Qualquer semelhança com a nossa realidade, dificilmente será mera coincidência.

Nos últimos anos, a esquerda brasileira se viu fragmentada e fragilizada, enquanto assistiu a direita se rearticular e fortalecer, construindo novos nomes e partidos, ainda que embasados sobre os mesmos velhos discursos. Da pichação ao funk, passando pelos moradores da Cracolândia, entre tantos outros tópicos sucateados pelas visões elitistas e higienizadas dos que estão no poder, é inevitável a associação desses elementos com a periferia, que mesmo antes dessa ascensão, já lidava e sobrevivia numa realidade diferente daquela que assistia na televisão. E, quando teve a menor oportunidade de muda-la, rapidamente foi sufocada pela ambição dos que já estão por cima da carne seca.

Pra quem defende que o funk sequer deve ser visto como arte, seja por suas batidas ou letras que, para muitos, incentivam coisas impróprias, vale uma volta no tempo, a fim de relembrar que essa batalha também foi enfrentada por outros gêneros negros e de origem periférica, como nos anos 70 aconteceu com o samba, gênero de matriz africana, hoje reivindicado pela cantora branca Mallu Magalhães em rede nacional, e também com o rap, perseguido e marginalizado até os dias atuais, com ênfase aos anos 90, mesma época em que Os Racionais MCs lançaram o seu primeiro CD.

Ainda é cedo para saber se esse projeto terá ou não consistência o suficiente para culminar na criminalização de todo um gênero musical, mas o simples fato da proposta ter chegado ao congresso, bem como se tornar motivo de discussão em meio aos tantos problemas e escândalos que enfrentamos na política atual, diz muito sobre o quanto ainda precisamos lutar contra o elitismo, seletividade e viralatismo da sociedade que fazemos parte. E que façamos isso usufruindo de toda a nossa liberdade de expressão e cultura que, goste dela, de onde vem e de quem a faz ou não, o mínimo que devem fazer é respeitar.

No Spotify, aproveitamos para estrear a playlist “Vem Sarrando”, com alguns dos maiores sucessos do funk atual, incluindo nomes como Anitta, MC Carol, Pabllo Vittar, Lia Clark, Tati Quebra Barraco, Livinho, Kevinho, Zaac, Don Juan, Rincon Sapiência, Delano e vários outros.

Ouça e siga abaixo:

Queridos brasileiros, não fodam a carreira internacional da Anitta antes mesmo de ela começar

Não tem nada que atualmente una tão bem o Brasil quanto a vindoura carreira internacional de Anitta. O público, seja fã dela ou não, tem vibrado e comemorado com toda nova conquista da cantora de “Paradinha”, que vem dando passos cada vez mais promissores desde as parcerias com J. Balvin e Maluma em “Ginza” e “Sim ou Não”, mais tarde também surgindo com Iggy Azalea e até os caras responsáveis pelo maior hit de 2015, Major Lazer.

Na pressa em ter a primeira cantora pop exportada com sucesso para o mercado internacional, os brasileiros têm sido bastante exigentes sobre todos com quem ela vem colaborando, o que, se não tomarmos cuidado, poderá surtir o efeito totalmente contrário, ou seja: queimar o filme dela lá fora e foder todo o rolê.



Uma das maiores conquistas de Anitta em sua carreira foi ter chegado até aqui com total controle do que fez dentro e fora dos palcos. A cantora, além de intérprete e compositora de seus hits, é sua própria empresária e, se pensarmos na forma como usa suas redes sociais, sua própria assessoria também, tendo em suas mãos um controle das narrativas que envolvem o seu nome de uma forma que poucos artistas conseguiram.


O problema é que, desde seus trabalhos focados no mercado internacional, Anitta também se tornou alvo de um protecionismo em excesso por parte de seus fãs, que, quando descontentes com algo ou alguém, resolvem responder da maneira mais batida da internet desde a ascensão das redes sociais: xingando muito.

A parceira de Anitta em “Switch”, Iggy Azalea, foi a primeira a lidar com a fúria dos brasileiros após colaborar com a cantora. Assim que a parceria foi anunciada, a cantora já havia adiantado que sua parceria seria pequena, uma vez que Azalea é rapper e costuma convidar artistas para cantarem em seus refrões, mas não adiantou: a música saiu e geral foi reclamar que tinha pouca Anitta. Manda mais, que tá pouco.



E ela mandou: Iggy foi lá e convidou a cantora pra se apresentar com ela no Jimmy Fallon. Só vacilou em planejar uma performance em que Anitta saía do palco após cantar o refrão. Dá-lhe reclamações outra vez – e visualizações no vídeo da performance pelo Youtube, afinal, a gente reclama, mas enaltece mesmo assim.

Em seu Twitter, foram várias as vezes em que a australiana precisou se explicar ou pedir a compreensão dos fãs de Anitta, que seguiram a criticando quando continuou a promoção da música sem a cantora e, após o vazamento de seu videoclipe, cancelou também o que restava de divulgação para a música.



O caldo entornou de vez quando, por ruídos na comunicação, supuseram que Iggy Azalea lançaria um remix de “Switch” com a participação de Maluma, cantor que trabalhou com Anitta em “Sim ou Não” e, também segundo muitos rumores, teria se desentendido com a cantora, após perceber que ela poderia se tornar um nome latino em potencial pra bater de frente com ele no mercado internacional. Teria sido por isso que os dois não se encontraram no MTV Millennial Awards, ainda que estivessem no mesmo evento, e ele ainda passou a remover a voz dela nas suas apresentações de “Sim ou Não”.


Se a parceria fosse mesmo rolar, o público tinha toda a razão em ficar puto, afinal, seria no mínimo suspeito que, pouco depois de desistir de toda a divulgação da música com Anitta, Iggy Azalea surgisse retrabalhando-a com o mais novo desafeto da brasileira. Mas os fãs de Anitta decidiram resolver isso de uma forma tão questionável quanto seria essa colaboração, partindo para o linchamento virtual dos outros dois artistas, tomando conta de todas. as. suas. redes. sociais. Com ofensas que iam de “falsos” e “duas caras” aos emojis de cobrinhas.

A parceria entre Iggy e Maluma não rolou; a rapper apenas o apresentou numa premiação e, pelas redes sociais, afirmou que os dois eram amigos de longa data e que o apoiaria em suas escolhas, gostasse o público ou não, mas os ataques pela internet persistiram, e foi aí que começou o problema.

Independente da música ser boa ou não, bem como da participação de Anitta ser tão longa o quanto gostaríamos ou não, “Switch” significou um passo importante pra brasileira, que lançou oficialmente a sua primeira música totalmente em inglês e, com ela, cantou pela primeira vez para a TV americana. Mas tudo o que os fãs souberam fazer foi reclamar, em vez de aproveitarem a puta oportunidade que a brasileira estava abraçando.

Não só isso, no mesmo tempo em que se dedicaram a espalhar toda essa negatividade pra cima dos gringos, muita coisa foda estava rolando com Anitta, que lançou logo depois de “Switch” a sua primeira música em espanhol, “Paradinha”, e ainda participou do novo single do Major Lazer com a Pabllo Vittar, “Sua Cara”. Como se isso já não fosse foda o suficiente, a brasileira protagonizou ainda especulações sobre possíveis parcerias com ninguém menos que Justin Bieber e Camila Cabello – ambos colaboradores recentes do Major Lazer, o que torna essas supostas parcerias bem prováveis. E o povo lá, perdendo tempo com porra de Maluma.



Nossa preocupação aqui, fica para a possibilidade de todo esse protecionismo resultar num receio de outros artistas internacionais trabalharem com Anitta. Isso porque meio mundo já sabe sobre o quanto somos dedicados e calorosos com nossos ídolos, mas agora percebem também a forma como podemos ser agressivos e, por que não, tóxicos quando não recebemos o que gostaríamos.

Nessa fase de introdução ao mercado gringo, será comum que Anitta comece devagar e pelas beiradas, assim como aconteceu em sua carreira antes e depois do sucesso de “Show das Poderosas”, e cabe ao seu público focar em ajudá-la, reconhecendo e promovendo seus trabalhos, não se desgastando enquanto perde tempo tentando protege-la por algo que ela sequer pediu ajuda.

Se tem uma coisa que Anitta manja, é dos negócios que envolvem a sua música. Então que deixemos ela continuar tocando isso tão bem o quanto veio fazendo. Parem de foder o rolê queimando o nome da moça lá fora e vão assistir “Paradinha”, porque as visualizações não baterão recordes sozinhas.

A Netflix cancelou a sua série favorita, mas esse não é o fim do mundo

Há alguns dias, em seu Instagram, Sophia Amoruso, escritora da autobiografia #Girlboss, e também criadora da série de mesmo nome na Netflix, anunciou o cancelamento do show pela plataforma mundial de streamings. 

A princípio, podemos levantar que os motivos essenciais para o cancelamento estão entre as críticas negativas, à época do lançamento, há apenas alguns meses, a protagonista Sophia vivida por Britt Robertson recebeu diversas críticas entre “mimada”, “irritante” e “grosseira”, e o show foi rotulado como “série sobre problemas de uma garota branca”, e também a baixa audiência. 

Como sabemos hoje, se não deu resultados, a Netflix cancela. Mas esse argumento não parece ser importante para os críticos de internet de plantão, que caíram matando, mais uma vez, em cima da companhia, dias após o anúncio do aumento do preço dos planos do serviço. 

Sim, pagamos Netflix para receber conteúdos que gostamos e temos todo o direito de protestar. Vejam só o que aconteceu com Sense8 essa semana, que ganhou um especial de encerramento após protestos dos fãs (diversas outras séries também foram resgatadas nos últimos tempos, Gilmore Girls, Fuller House...).


Contudo, vamos pensar de uma maneira um pouco mais mercadológica? As manas precisam por a cara nas finanças.

Então vamos lá. Há pouco menos de um mês, após o cancelamento de Sense8, o CEO da Netflix Reed Hastings afirmou que a estratégia da companhia é “assumir riscos”, o que pode ser traduzido como experimentar narrativas e formatos novos, na esperança de encontrar um sucesso. Tanto 13 Reasons Why, quanto Stranger Things foram sucessos inesperados. 

Logo, se algum show não atende às expectativas, ele é cancelado. E porque antes a Netflix pelo menos dava um final para suas séries canceladas, foi o caso de Hemlock Grover, por exemplo, e agora nem isso? Bem, é provável que seja questão de sobrevivência. 

Saiu na imprensa, há algumas semanas, que a empresa de Hastings havia passado o número de assinantes de TV por assinatura nos Estados Unidos, um feito impressionante, sem dúvida! Mas também é sintomático, uma vez que será muito mais difícil para a Netflix crescer em terras do Tio Sam.

E o que eu to falando aqui tem base, tá? Relatórios recentes mostram que a companhia está crescendo muito... Mas principalmente fora dos EUA, e o principal mercado internacional fora o estadunidense é o chinês, que impede o funcionamento da companhia americana. Sendo assim, a Netflix precisa encontrar outros mercados, e segurar as pontas naqueles investimentos caros e com pouco retorno (Sense8 é uma das séries mais caras da história, com uma logística super difícil, e que acabou sendo hypada por um nicho muito específico de consumidores). 

Dito isso, é muito provável que a empresa esteja caminhando para uma internacionalização de suas operações, buscando clientes em países emergentes como o Brasil, a Índia, países em crescimento da África e America Latina e, com isso, o catálogo da gigante de streamings fique cada vez mais... Diverso. Justamente os que os fãs órfãos da empresa disseram que deixaria de acontecer com o cancelamento de Sense8, famosa por possuir grupos minoritários em papéis de destaque. 

É absolutamente plausível esperar produções originais brasileiras, como 3% (atualmente está em fase de produção uma série brasileira baseada na Lava-Jato), além de produções locais indianas, bolivianas, colombianas, argentinas, mexicanas, espanholas, italianas... Enfim, um catálogo verdadeiramente mundial e sem fronteiras.

Ingobernable, série mexicana da Netflix, é um House Of Cards com muito mais drama. 

Não é possível ainda definir qual o futuro da TV, principalmente com tantos players novos no mercado (Amazon, Youtube, Facebook, Hulu), todavia, podemos esperar e devemos desejar uma forma de assistir televisão diferente do que já vivemos, conectados com realidades totalmente diferentes da nossa, e longe do círculo vicioso que estivemos ao longo de toda a história da indústria do entretenimento atual, com o consumo de produções ora européias, ora estadunidenses.

Talvez um dia nos encontremos lendo artigos sobre novas séries fodas produzidas na Ásia, na Oceania, na África e entre nossos vizinhos. Enfim, explorar um novo lado da globalização.

Muitas das séries canceladas pela Netflix recentemente eram boas sim, mas o corte nesses títulos não significa que a empresa esteja ficando ruim, que merece os boicotes que tem recebido. Se for para direcionar seus investimentos em segmentos novos no audiovisual, melhores e mais criativos, quem sabe nos ajudar a quebrar essa birra que temos com línguas que não sejam o inglês e o português, e se for para ficar melhor do que está, que venham, porque estamos prontos.

Por que a disputa entre mulheres ainda entretém os fãs de música pop?

Foi com a volta de Katy Perry e o single “Swish Swish”, do álbum “Witness”, que a rivalidade entre a cantora e Taylor Swift ganhou vida outra vez. Katy, apesar de negar que a música seja uma resposta para “Bad Blood”, não hesitou em usar o nome de Swift ao seu favor, dando o que o jornalismo urubu queria ao explicar toda treta aos mínimos detalhes e, de quebra, garantindo que bastava uma mensagem de texto com um pedido de desculpas de Taylor pra que a tal rixa chegasse ao fim.



A mensagem de texto não chegou, mas o recado de Taylor Swift foi outro: no dia de lançamento do novo disco de Katy, a cantora resolveu disponibilizar toda a sua discografia no Spotify e outras plataformas de streaming, com a justificativa de que, exatamente naquele dia 9 de junho, comemorava uma marca de vendas do seu último álbum, até então disponível apenas na Apple Music, “1989”.

Com a internet dividida sobre quem estava certa ou errada nesta história, bem como quem havia “pisado mais”, a pergunta deveria ser exatamente outra: por que, mesmo numa época em que tanto discutimos sobre o feminismo e empoderamento feminino, a música pop ainda incentiva tanto a competição entre mulheres?



Da disputa entre Britney Spears e Christina Aguilera em meados dos anos 2000 às insuportáveis discussões entre os fãs de Madonna e Lady Gaga no final da mesma década, foram muitas as vezes que os fãs de música pop não se conformaram em terem mais de uma mulher em exposição por fazer um bom trabalho e, apesar de muito consumirem discursos cada vez mais desconstruídos como forma de entretenimento, pouco eles os absorvem como uma maneira de reverem as suas próprias problemáticas, com o exemplo desse reflexo do machismo e misoginia, que ainda transcende a sua admiração pelo trabalho de todas essas artistas.

A incoerência do machismo tão presente entre fãs de mulheres tão talentosas, fortes e seguras de si não é difícil de ser encontrada pela internet afora, seja nos grupos daquela rede social ou por alguns fóruns, nos quais as pessoas são capazes de discutirem seriamente sobre a importância de respeitarmos a saúde mental de uma artista numa publicação e, tópicos depois, não se importam em transbordar todo o seu ódio sobre outro nome, não se limitando às críticas, raramente construtivas, mas se permitindo também as comparações, de forma que fomentem exatamente essas competições.

O fato do machismo ainda ser tão familiar à música pop não é um problema limitado ao seu público. Isso porque, quando falamos nessas grandes cantoras, também estamos falando sobre grandes empresas, marcas, plataformas e gravadoras que, inevitavelmente, tirarão alguma vantagem de tudo isso. E, pra elas, resta não só a exigência de ser uma grande artista feminina, mas também ser uma artista melhor e maior do que outra mulher.



Uma forma de exemplificar isso fica com o novo capítulo da treta entre Katy Perry e Taylor Swift. Quando correram os rumores de que havia uma música nova de Katy sobre a cantora, todos foram para a plataforma de streaming de sua preferência conferir a história com seus próprios ouvidos e, independente do lado que você esteve durante toda a confusão, no dia em que Swift colocou a sua discografia no Spotify, o mesmo se repetiu. A sua audiência esteve com alguma delas. Mas agora vem a surpresa: quem garantiu o tempo, clique e atenção de todos, seja lá por conta de qual cantora? E, mais, alguém se deu ao trabalho de checar que ambas fazem partes de selos subsidiários da mesma gravadora? Porque nós checamos.

Mais do que uma coincidência, assim como Katy e Taylor, Christina Aguilera e Britney Spears também dividiam a mesma gravadora na época em que eram colocadas uma contra a outra nas paradas, assim como Madonna e Lady GagaLady Gaga e Katy Perry, entre outras artistas. O que exemplifica da pior forma possível a maneira como essas grandes corporações se apropriam dos discursos dos movimentos sociais no momento em que encontram uma possibilidade de lucrar com eles, vide o investimento cada vez maior em trabalhos que levantem a bandeira do empoderamento, seja ele feminino, LGBTQ ou negro, ao mesmo tempo que nos tira toda essa força e representatividade com a outra mão, assim mesmo: debaixo do nosso nariz.



Isso não acontece só na música. Tem emissora de tevê com programa sobre sexo desconstruidão da porra naturalizando relacionamentos abusivos, machismo e estereótipos problemáticos por meio de suas novelas, assim como marcas que promovem o empoderamento feminino nos comerciais de um dos seus produtos e objetificam a mulher nas propagandas de outro. 

Mas, falando desse meio, encontramos no público o importante papel de desestruturar essa visão tão enraizada, os fazendo ver que, sim, nós podemos admirar mais que uma mulher por seu ótimo trabalho, assim como nos deixam fazer com os homens, bem como, se não gostarmos de alguma delas, podemos expressar isso sem que a comparemos com outras artistas e, melhor, que podemos fazer isso criticando-as de forma construtiva sobre o seu trabalho, não por sua vida pessoal, aspectos físicos ou roupa que vestiu no tapete vermelho xis.

No final das contas, sabemos que, sim, talvez Taylor e Katy Perry tenham alguns pontos para resolverem, mas isso não deveria ter nenhuma foda a ver com seus respectivos trabalhos, muito menos com a maneira como o consumimos, porque desta forma apenas fomentamos o desgaste delas enquanto pessoas e artistas (Lady Gaga e o seu “ARTPOP” não nos deixam mentir), que nos levará a mais uma longa era em que mal temos mulheres sendo reconhecidas  por seus trabalhos nas rádios, paradas e premiações, enquanto insistimos em comprar o discurso de que estamos avançando sobre alguma coisa.

Se for pra pisar em algo, que seja no seu machismo, não nelas.

O grande “pacito” da música latina pode torná-la a próxima tendência da indústria pop

Ainda que enfrente muita resistência nas rádios e paradas dominadas pela hegemonia americana, o pop latino esteve por muitos anos a espera de uma oportunidade para mostrar cultura pra esse povo, colecionando nesse tempo uma leva de hits esporádicos nas vozes de Shakira, Jennifer Lopez, Enrique Iglesias, Pitbull, Daddy Yankee, entre outros nomes, e eis que, com um empurrãozinho dos streamings, nossos conterrâneos finalmente se encontraram à frente das paradas e estão prestes a alcançarem um feito histórico.


Se as previsões estiverem certas, a próxima música a encabeçar o topo da Billboard Hot 100 será a parceria de Luis Fonsí com Daddy Yankee e Justin Bieber, “Despacito”, e caso isso se concretize, essa será a primeira vez que uma faixa majoritariamente em espanhol estará no topo da parada americana desde 1996, quando a lista foi liderada por “Macarena”.



O sucesso de Luis Fonsí com Bieber, entretanto, é consequência de uma longa mudança que já vinha surtindo efeito pela internet. Cada vez mais fortes, as plataformas de streaming vêm propondo uma longa reeducação na maneira como consumimos música e, por meio de playlists e paradas como a ‘Global Top 50’, do Spotify, nos permite acompanhar não só os sucessos mundiais, mas também as faixas emergentes em regiões específicas, contribuindo pra que conheçamos produções além da bolha norte-americana, o que beneficiou não só os artistas latinos, como também asiáticos e de países nórdicos.

Outra coisa que facilitou a redescoberta e ascensão do pop latino foi a forma como os artistas do gênero vieram se ajudando ao longo dos últimos anos, fazendo inúmeras colaborações que, conforme alcançavam um público maior, levavam com elas outras faixas como sugestões. Isso explica a quantidade de músicas que vimos nos últimos meses com nomes como Maluma e J Balvin, além de, em anos anteriores, Daddy Yankee e Pitbull.



Com a pluralização das paradas após os streamings, foi comum que o público buscasse cada vez mais por sotaques diferentes dos usuais hits americanos. Foi assim que Sia emplacou o remix de “Cheap Thrills” com o jamaicano Sean Paul, Drake não perdeu tempo com o nigeriano Wizkid em “One Dance” e  também colou com Rihanna, que trouxe mais referências da música jamaicana em “Work”.

O pop latino, por sua vez, já vinha caindo nas graças de muitos artistas conhecidos pelas paradas americanas. A própria Sia lançou uma versão de “Cheap Thrills” com o rapper e cantor Nicky Jam, de Porto Rico, e as versões latinas se estenderam para “Sorry”, do Justin Bieber, com participação do J Balvin, e, usando um exemplo mais recente, “Shape of You”, do Ed Sheeran, relançada com a dupla Zion & Lennox.



Entre o público adolescente, os latinos também estão ganhando vez. Revelações como o cantor Abraham Mateo e a boyband CNCO são cada vez mais frequentes nas listas de mais ouvidos do Spotify, na maioria das vezes ao lado de nomes também conhecidos por seus trabalhos na televisão, como as atrizes e cantoras Lali e TINI.



No Brasil, não tem sido diferente! Anitta foi um nome essencial para a popularização de faixas como “Ginza”, do J Balvin, e “Sim ou Não”, com Maluma, e além de ter contribuído pra que as canções fossem inevitáveis sucessos em solo nacional, abriu a porta para outros artistas, como Zion & Lennox, que há algumas semanas lançaram uma versão de “Otra Vez” com vocais da Ludmilla.



O cantor colombiano Maluma, que colaborou com Shakira, Anitta, Ricky Martin, entre outros nomes, também tem se saído bem sozinho com o single “Felices Los 4”, que já aparece entre as faixas virais do Spotify no mundo e, na estreia do seu videoclipe, se tornou o clipe latino mais assistido em 24 horas. O clipe já conta com mais de 115 milhões de visualizações.


Uma vez no topo das paradas, será cada vez mais fácil para a música latina se consolidar mundialmente, e grandes nomes para isso não faltarão. Shakira, que recusou lançar uma versão em inglês de “Chantaje”, por anos foi um dos principais expoentes da música latina para o mundo e, atualmente, está gravando seu novo disco, totalmente em espanhol; Enrique Iglesias, que atualmente promove o single “Subeme La Radio”, também está com seu próximo trabalho prestes a sair do forno e, de volta ao campo das revelações, a ex-Fifth Harmony, Camila Cabello, deu indícios de que assumirá suas origens cubanas no trabalho de estreia solo, investindo mais no que fez com Pitbull e J Balvin em “Hey Ma”.



Usted percibió que los latinos están incluso dominando el mundo, ¿verdad? Pra completar esse intensivão, a gente preparou a playlist “Dominação Latina” no Spotify, qual aconselhamos que você siga o quanto antes, pra acompanhar esse pisão na hegemonia americana com a gente:

Muita coisa mudou nos últimos quatro anos, por que Miley Cyrus não mudaria?

Daqui um mês, fará quatro anos desde que Miley Cyrus lançou a canção “We Can’t Stop”, que abriu seus trabalhos com o disco “Bangerz”. A sonoridade urbana, bem como a mudança de seu visual, foi motivo de bastante discussão tanto por seus fãs quanto público geral, mas era unânime: todos estavam de olho no que a nova Cyrus estava fazendo.

Foi assim que “Bangerz” se tornou um dos momentos mais memoráveis da carreira da ex-estrela da Disney, contando ainda com a icônica estreia de “Wrecking Ball”, que não só foi muito bem sucedida nas paradas americanas, como também quebrou recordes pelo lançamento do seu videoclipe no Youtube.



E, hoje em dia, consideramos quase impossível pensar nas últimas edições do MTV Video Music Awards sem nos lembrarmos desse momento aqui:

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Quando veio ao Brasil com a Bangerz Tour, o saldo também foi positivo. De fora, o show parecia uma grande baderna com brinquedos gigantes, dançarinos anões e a cantora indo de um lado pro outro mostrando a língua e fazendo twerk, mas, vista de dentro, a turnê oferecia uma experiência verdadeiramente única, na qual toda essa porralouquice se transformava num universo muito singular, em que a liberdade era quem ditava o que fazíamos ou sentíamos.

Corta pra 2017. Miley Cyrus aparece com cabelos maiores e uma estética bem diferente, mais limpa do que a explorada nos materiais visuais de “Bangerz” – e também no projeto paralelo lançado gratuitamente após o disco, a parceria com The Flaming Lips em “Miley and Her Dead Petz”.


Na capa da Billboard, a atriz e cantora estampa uma matéria na qual falam sobre sua nova fase e a grande transformação pela qual passou nos últimos anos, incluindo o distanciamento daquilo que curtiu adoidado enquanto promoveu “Bangerz”, como sua aproximação com rappers, nudez e excessivo uso de drogas.

Apesar de estarem familiarizados com mudanças, os fãs de música pop ainda custam a aceitá-las quando não condizem com as suas expectativas e, assim como aconteceu quando Miley surgiu com “We Can’t Stop”, uma grande maioria passou a questionar o que a cantora está dizendo e fazendo agora.



Quem não se contentou com a nova era da cantora, apesar dela sequer ter lançado qualquer amostra do que promoverá musicalmente, acredita que suas falas atuais soam conservadoras demais para a Miley Cyrus de 2013 e critica o fato dela agora admitir se enojar ao ver os trabalhos nus que realizou durante a divulgação do disco anterior – trabalhos esses que contaram com a colaboração do produtor musical Dr. Luke e do fotógrafo Terry Richardson, ambos acusados por abuso sexual nos últimos anos, ressaltamos. Mas a surpresa é mais óbvia do que parece: as pessoas mudam, gente, e deveríamos ficar completamente bem sobre isso.

Quatro anos separam a Miley Cyrus de “Bangerz” da que estamos prestes a conhecer e, definitivamente, quatro anos é tempo pra caralho. Em 2013, a cantora estava no auge dos seus vinte, descobrindo a liberdade artística e oportunidade de usar e abusar da sua criatividade desde que soltou as amarras da Disney e, dado seu apreço pelo hip-hop, descobrindo todo um universo que, infelizmente, era e ainda é bastante machista e misógino.



Nesse tempo, a cantora também passou pelo fim e recomeço do relacionamento com o ator Liam Hemsworth, bem como voltou a buscar por sua identidade musical, uma vez que descobriu todo um leque de novas influências ao colaborar com Wayne Coyne e sua banda The Flaming Lips no que foi um dos seus projetos mais ousados, musicalmente falando, e é óbvio que isso refletiria na forma como veria sua carreira agora.

Tê-la revendo suas ações de anos atrás não significa que esteja negando o que fez, mas, sim, considerando que não é o que está disposta a fazer agora e que talvez não fosse o que faria se tivesse a oportunidade de voltar atrás. O nome disso, para quem ainda não conhece, é amadurecimento. É reconhecer as coisas que já fez e entender sobre o quanto aquilo te fez bem ou não.



Na entrevista para a Billboard, Miley Cyrus afirmou gostar da canção “Humble”, de Kendrick Lamar, pelo verso em que ele enaltece a beleza feminina, na contrapartida dos muitos versos machistas do gênero, e recebeu inúmeras críticas por conta disso também, como se estivesse dando as costas para um estilo que a acolheu e inspirou durante a fase anterior. Mas a cantora usou seu Instagram para complementar a fala, justificando:
Eu sempre amarei e celebrarei o hip-hop e trabalhei com alguns dos melhores [nisso]! Mas, nesse momento da minha vida, estou me expandindo, musical e pessoalmente, e gravitando pelo rap edificante, consciente. Conforme fui envelhecendo, eu percebi o efeito que a música tem no mundo e, vendo onde estamos hoje, eu sinto que a geração mais jovem precisa ouvir letras positivas e poderosas. (...) Eu espero que minhas palavras, sejam elas cantadas ou faladas, sempre encorajam os outros a amarem, rirem, viverem intensamente, que estejam aqui por outras pessoas, para unificar e lutar por o que for seu direito (seja humano, animal ou ambiental).
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No final das contas, não há o que questionar. Miley, como a mulher independente que se mostrou em “Bangerz”, usa agora sua liberdade para buscar por outros ares, pessoal e musicalmente falando, e, até aqui, tem passado uma imagem bem mais amadurecida do que a menina que se divertia com sua porralouquice pop em 2013.

Em quatro anos, muita coisa mudou. E Miley Cyrus foi uma delas. Na melhor das hipóteses, você ainda pode relembrar seus trabalhos anteriores no Spotify e Youtube quando quiser.

As divas pop estão passando por uma crise e ela parece longe de acabar

Quando Rihanna começou a promover o disco “ANTI”, foram longas as tentativas de acertar o direcionamento do álbum, que contou com dois “primeiros” singles até que a barbadiana se unisse ao Drake na inevitavelmente bem sucedida “Work”.

A má recepção das canções anteriores, ainda que não fossem tão comerciais, era de se impressionar, principalmente por conta desse trabalho quebrar o jejum da cantora desde o álbum “Unapologetic”, que alcançou o topo das paradas nos Estados Unidos e Reino Unido, rendendo ainda singles como “Diamonds” e “Stay”.


O que acontecia com Rihanna, entretanto, não era novidade entre as divas do pop. Gaga, que em 2013 lançou o disco “ARTPOP”, amargou números bem menores do que o esperado com o single “Applause” e as coisas só pioraram nos seus passos seguintes, graças ao histórico de acusações por estupro e pedofilia do seu parceiro no outro single, “Do What U Want”, e confusa estratégia de divulgação de “G.U.Y”, que encerrou os trabalhos do CD.

Passada uma grande temporada de mudança de imagem, que incluiu o projeto de jazz com o músico Tony Bennett e parcerias com artistas como Diane Warren e Nile Rodgers, a cantora retornou no último ano com o álbum “Joanne” e capengou rumo ao seu primeiro grande hit em anos, mas não se tratava de nenhuma faixa explosivamente pop como foi “Just Dance”, “Poker Face”, “Bad Romance” ou “Born This Way” e, sim, a baladinha country “Million Reasons”.


No topo outra vez, meses após nos lembrar porque é considerada uma das maiores artistas da sua geração no palco do Super Bowl, Gaga se entregou ao pop que seus fãs tanto ansiavam com o videoclipe de “John Wayne”, do mesmo disco, e nos primeiros sinais de que a faixa repetiria a má recepção dos trabalhos anteriores, a gravadora sinalizou: a música não era um single. O bonde seguiria com “Million Reasons”.

Quando finalmente decidiu se desvencilhar da tal canção lenta, Gaga se desvencilhou também de toda a fase “Joanne”, dando espaço para a proposta dançante, comercial e óbvia para as playlists atuais do Spotify: “The Cure”. O que tinha tudo para ser a cura do que seus fãs tanto pediam, entretanto, revelou o que boa parte do público ainda não havia percebido: as divas do pop estão em crise.


Já faz algum tempo que a música pop vem se tornando menos interessante, ao menos quando falamos dela no seu sentido literal, das músicas que estão no topo das paradas. As divas do pop, espalhafatosas, ousadas, dispostas a levantarem bandeiras em prol de minorias e virarem premiações de cabeça para baixo deram espaço para o pop higienizado e heteronormativo de Taylor Swift, para as baladas (lindas, diga-se de passagem) que até as suas tias escutam da Adele e, não podemos esquecer, para esse monte de caras que quase parecem os mesmos de tão pouco que acrescentam ao cenário e semelhança das músicas monotemáticas que cantam (coloca na conta do Ed Sheeran, Shawn Mendes, Charlie Puth, etc).

Falar em “higienização e heteronormatividade”, por sua vez, é um bom ponto de partida pra todo esse entendimento. Isso porque pop é cultura, cultura carrega valores e ideologias, e o que vivemos neste momento é uma fase em que Meghan Trainor e The Chainsmokers ganham Grammys por trabalhos medíocres e esquecíveis, porque grandes gravadoras, empresas e plataformas os abraçam e investem neles enquanto astros inofensivos, que não desafiam o status quo.


Neste sentido, não devemos nos surpreender ao ver que, no ano seguinte ao que Beyoncé foi uma das artistas que mais vendeu com seu novo disco, um material audiovisual que discutiu o empoderamento feminino e negro, as paradas americanas passaram pela primeira semana sem uma mulher entre as dez maiores canções desde os últimos 33 anos – revertendo isso pela aparição de Alessia Cara em “Stay”, que na verdade pertence ao repertório do DJ Zedd.


Outra diva pop que parece estar acertando as contas com a mesma crise é Katy Perry. Seu quarto disco, sem previsão de lançamento, deu para a californiana o seu primeiro single carro-chefe que não alcançou o topo das paradas, “Chained To The Rhythm”, e parece estar prestes a lidar com a mesma dificuldade quanto aos números de sua segunda faixa, a parceria com o trio de hip-hop Migos em “Bon Appétit”.

No novo lançamento, a cantora ainda buscou se enturmar com os rappers, que tem levado a melhor nas paradas atuais, graças ao forte desempenho do gênero nas plataformas de streaming, mas calhou de bater de frente com a estreia de “I’m The One”, outra faixa toda cantada por homens, e, até então, amargar alguns dos seus menores números desde que emplacou seus primeiros sucessos. Com o disco sem previsão de estreia, não será uma surpresa se ela trabalhar em outras mudanças de imagem, posicionamento e sonoridade, sequer aparecendo com essas faixas no material final.


A indústria sempre funcionou de forma cíclica e, na era dos streamings, dos Chainsmokers e Ed Sheeran, o que temos é uma música pop indisposta para as divas. O que mudaria isso seria a chegada de outra artista tão disposta e preparada para “girar a roda” como fez Lady Gaga entre 2008 e 2010, quando resgatou a iconicidade e importância do trabalho visual, de uma forma que só havíamos visto ser tão bem feita nas mãos de Michael Jackson e Madonna. Mas isso se torna cada vez mais distante com a urgência do pop atual e pressa das gravadoras, que até lidam com artistas talentosas (Zara Larsson, Anne-Marie, Dua Lipa e contando), mas se perdem ao tentar torná-las estrelas instantâneas, fadando-as a mesma safra do pop presa aos ritmos comuns.

O show do Justin Bieber em São Paulo nos lembrou do quão cruel a indústria pop pode ser

A indústria pop sempre nos educou a ver nossos ídolos – e também artistas que não gostamos – em posições distantes demais da nossa realidade para os considerarmos como semelhantes a nós e, neste pensamento, uma tarefa quase inimaginável, principalmente quando se trata de alguém que não somos tão chegados, é o exercício da empatia.

Fiquei sabendo que iria ao show de Justin Bieber em São Paulo, no último domingo (02), apenas algumas horas antes do canadense subir ao palco, e nesta correria, me vi pensando sobre o quão exaustiva deve ser a jornada do cantor, com sua turnê ao redor do mundo e a maratona de shows, encontro com fãs, fuga dos fãs, tentativa de turistar por onde passa e, claro, a dita obrigação de parecer bem e simpático todo o fucking tempo.

Já fui mais fã do canadense. Peguei cansaço dele após o namoro com a Selena Gomez, pois foi quando ele começou a falar algumas asneiras na tentativa de se mostrar superior ao término e, vagamente, lembrar do que um outro Justin fez quando terminou com uma outra cantora. Mas isso não me impede de curtir suas músicas – afinal, “Purpose” é um ótimo disco pop e foi responsável por consolidar o tropical house, tendência que manteve as rádios e paradas por quase dois anos – e muito menos reconhecer seu esforço no que deve ser uma das mais complicadas profissões do mundo.


Quando falamos em artistas e suas vidas sempre tão agitadas, costumamos lembrar mais sobre as partes boas do que as ruins, entretanto, quando nos deparamos com um colapso como de Britney em 2007, ou de Amy Winehouse, ou Lindsay Lohan, ou Amanda Bynes, agimos como se não tivéssemos assistido esse declínio bem debaixo do nosso nariz, como se não tivéssemos contribuídos com a audiência que motiva certos tipos de veículos a incentivarem essa queda de celebridades, levando-os ao desgaste extremo, até que estejam atacando paparazzis com guarda-chuvas ou, no caso de Justin Bieber, cuspindo nos mesmos fotógrafos e os ameaçando por aí.

Pensar nesses casos de forma isolada pode nos dar uma perspectiva errada. Bieber mesmo, é tido como um moleque mimado que não reconhece o carinho dos fãs e só sabe agir de forma desrespeitosa com todo mundo. Mas, particularmente falando, não sei até aonde teria aguentado se crescesse no mesmo circo que o garoto, sendo o centro das atenções o tempo inteiro e, literalmente, sem o mínimo de sensatez dos outros quando se quer o mínimo, tipo caminhar numa rua ou comer algo em algum restaurante.

Fui longe demais? Talvez. Mas não significa que não faça sentido. E só estou usando Justin Bieber como exemplo porque esses foram pensamentos que começaram a pipocar na minha cabeça no meio do seu show em São Paulo, enquanto fãs enlouquecidas choravam e gritavam independente do que ele estivesse fazendo no palco.

A música pop é filha de Michael Jackson e, quando se trata da parte visual, gosto de buscar interpretações além do que nos é óbvio. E foi na performance de “I’ll Show You”, ainda no começo do show, que me veio a primeira reflexão sobre o quanto toda essa indústria pode foder aos poucos com o psicológico dos artistas, goste você deles ou não.

Me deixe ilustrar: para a apresentação dessa música, um cubo surge no palco e Justin Bieber apresenta a música dentro dele. As grades que formam a estrutura o cercam e fazem o cubo parecer uma jaula, enquanto ele é o que está preso e em exposição. Do lado de fora, o show é belíssimo. Projeções tomam conta das quatro paredes, iluminando-o e tornando tudo ainda maior do que já é, enquanto a letra da canção me ajuda a embasar essa interpretação mais profunda.

“Minha vida é um filme e todos estão assistindo, então vamos ver as partes boas e pular o que não fizer sentido”, ele canta. “Essa vida não é fácil, eu não sou feito de aço. Não esqueça que eu sou humano, não esqueça que eu sou real. Você age como se me conhecesse, mas nunca irá. Mas tem algo que eu sei com certeza e vou te mostrar.”
Justin Bieber numa jaula durante a performance de “I’ll Show You” (Foto: JustinBPhotos.org)
Os dançarinos fazem o espetáculo do lado de fora, enquanto o cantor segue apresentando a faixa enjaulado. Nos oferecendo mais significados do que talvez ele mesmo pudesse pensar. E a música continua: “às vezes é difícil fazer a coisa certa quando a pressão nos atinge como um relâmpago. É como se eles quisessem que eu fosse perfeito, quando nem mesmo sabem que estou me machucando.”

E eu achando que só ia dançar bastante e curtir “Sorry”, que é a minha favorita desse disco.


O outro momento em que minhas reflexões foram longe demais aconteceu no set acústico do show. Agora o cantor está sentado num sofá, apenas com seu violão, e tanto pela montagem do palco quanto por seu visual atual, é impossível não se lembrar dos seus primeiros vídeos para o Youtube, quando, antes de toda essa fama, apenas cantava músicas de outras pessoas e almejava a fama para ter condições de levar a sua mãe para a Disney.


A parte acústica contou com três músicas: a parceria com Major Lazer em “Cold Water”, o hit escrito pelo Ed Sheeran, “Love Yourself”, e o cover de Tracy Chapman (para a música atualmente popularizada pelo remix de Jonas Blue), “Fast Car”, e conforme o público cantava cada uma das músicas cada vez mais alto, mais o cantor parecia menor diante de tamanha imensidão de seus fãs. E aí eu pensei no quanto deve ser foda, por mais acostumado que você esteja com tudo isso, se manter inteiro e bem o suficiente para alcançar as expectativas das tantas milhares de pessoas pra caralho que estavam ali no Allianz Parque, dispostas a ajudá-lo caso algo desse errado. 


Embora aparentasse cansaço e certo desânimo, o próprio parecia se cobrar mais do que os próprios fãs, interrompendo “Fast Car” após começar com uma nota errada: “Quero dar o meu melhor pra vocês essa noite.” E quando recomeçou, o que vi foram fãs ainda mais dispostos a ajudá-lo, seja cantando, gritando ou acompanhando com palmas.


O show termina com “Sorry”, que eu provavelmente já disse ser a minha favorita, mas o ápice de toda a performance fica para a antiga “Baby”. Todos sabem cantá-la do início ao fim e, ainda que eu suspeite que as fãs presentes já saibam sua setlist de cor e salteado, demonstram surpresa com os versos iniciais. O Allianz Parque tremeu, literalmente, ao som que catapultou o canadense para aquilo que assistíamos ali.

Nas poucas vezes que interagiu com o público, Bieber parecia muito grato pelo apoio que ainda tinha dos fãs. É como se o discurso do disco “Purpose”, a ideia de estar em busca de um propósito e acreditar que a vida vale a pena quando se dá outras chances, realmente fosse além das suas canções e dos seus hits. E uma vez aceita essa redenção, ele só queria fazer a sua parte e colocar todos para dançar. No final do show, é inevitável a sensação de que poderia ter sido melhor, mas também é difícil negar que ele tentou entregar o seu melhor e, talvez, após algumas noites de sono e um merecido descanso, consiga fazer isso numa outra oportunidade.

Ed Sheeran é machista pra c*ralho – e suas letras nos ajudam a provar isso

No topo das paradas com “Shape Of You” e há algumas semanas dono de um dos maiores álbuns do ano, “Divide”, Ed Sheeran tem absolutamente tudo para se tornar o próprio problema para sua carreira, na medida em que, por meio de entrevistas, tem revelado uma personalidade diferente daquela vendida em seus trabalhos anteriores e, por suas letras, exposto o quão machista, sexista e misógino ele é, apesar da sonoridade aparentemente inofensiva.

Na divulgação do seu novo álbum, o britânico não esconde que a autoconfiança tem sido sua arma, mas a mesma se converte numa grande auto sabotagem quando o cantor decide falar sobre o quanto acredita ser o maior artista masculino da sua geração – e que Taylor Swift é a feminina –, como planejou lançar seu disco numa época em que não houvesse nomes grandes o suficiente para disputar consigo e até mesmo sobre a maneira que a fama abriu portas para transar facilmente com mulheres famosas.

O mundo de Taylor é cheio de celebridades.”, disse Ed Sheeran numa entrevista para a última edição da Rolling Stone. “Eu era esse cara britânico estranho de 22 anos saindo em turnê com a maior artista da America, que tinha todas essas parcerias famosas. Era muito fácil... Eu frequentemente me pegava em situações que acordava, olhava ao redor e pensava, ‘como isso aconteceu?’


Na contramão da persona fofa, tímida e inofensiva que estiveram nas entrevistas de seus discos anteriores, Sheeran deixa transparecer uma postura problemática que, por meio de suas letras, já estavam bem embaixo do nosso nariz há alguns anos, mas que mal percebíamos, raramente associando o comportamento de homens machistas, misóginos, sexistas e, na melhor das definições, escrotos, com uma figura tão amigável.

Pode parecer difícil tirar tantas conclusões de uma figura que é pública e, ao mesmo tempo, distante de nossa realidade, mas as letras do britânico nos ajudam melhor a falar sobre tudo isso e, acredite, elas têm muito a dizer.

Em um dos maiores sucessos do disco “x”, a faixa supostamente composta para Ellie Goulding, “Don’t”, Ed Sheeran fala sobre uma mulher com quem teve um relacionamento mal definido, mas se sentia no direito de cobrar fidelidade, e que obviamente termina mal, fomentando o clichê do cara que agora sofre por causa de uma vadia do coração frio. “Eu entendi que ela só estava em busca de alguém pra passar o tempo, mas eu me dediquei por duas ou três noites, e parei com isso até que o momento fosse certo (...) Queria ter escrito detalhadamente como as coisas aconteceram. Quando ela estava o beijando, como eu me senti confuso. Mas agora ela deverá descobrir, enquanto eu estou aqui cantando ‘não foda com o meu amor’.”


Na história de “Don’t”, Sheeran descobre que ela se envolveu com um de seus amigos e, ainda que os dois não estivessem namorando, ressalta o quanto esperava que ela fosse “diferente”:

Você não precisava levá-lo pra cama, só isso. E eu nunca o vi como uma ameaça, até você desaparecer para transar com ele, é claro. Não é como se estivéssemos em turnê, nós estávamos no mesmo andar da porra de hotel. E eu não estava procurando por uma promessa ou compromisso, mas pra mim nunca foi diversão e esperava que você fosse diferente. Não é dessa forma que descobre o que você quer. É um pouco demais, e muito tarde, pra ser honesto. E por todo esse tempo, Deus sabe que eu estive cantando ‘não foda com o meu amor (...) eu avisei, ela sabia’.

Inegavelmente talentoso e, ao longo dos últimos anos, compositor de hits para artistas como One Direction e Justin Bieber, Ed Sheeran pouco acrescenta ao monotemático pop masculino, que historicamente é palco para homens lamentarem sobre o quanto foram maltratados, subestimados e iludidos pelas sempre maldosas mulheres – Timberlake e sua “Cry Me A River” não nos deixam mentir. E, por toda sua discografia, a mesma narrativa se repetiu de novo e de novo.

Me diz que você vai dizer não para o homem que pediu sua mão, porque está esperando por mim”, ele canta em “One”, do mesmo disco de “Don’t”. “E eu sei que você estará distante por um tempo, mas eu não planejo partir. Você tiraria de mim minhas esperanças e sonhos? Só fique comigo.


E vai ainda mais longe em “The Man”: “Agora eu não quero te odiar. Só queria que você nunca tivesse partido por esse cara e esperado pelo menos duas semanas antes de deixar ele te levar. Eu me mantive verdadeiro e meio que sabia que você gostava desse cara da escola particular”.

Eu sabia que ele estava de olho em você”, continua. “Ele não é o cara certo pra você. Não me odeie por escrever a verdade. Não, eu nunca mentiria pra você. Mas nunca foi legal te perder (...) O fato é que você está brava porque eu relembro as coisas tão casualmente. Você é praticamente da minha família. Se tivéssemos casado pelo menos, eu acho que você seria. Mas, tragicamente, nosso amor perdeu a vontade de viver. Eu mataria para dar uma outra chance para isso? Acho que não.

Um dos maiores hits de Justin Bieber com o disco “Purpose”, “Love Yourself”, também foi composto por Sheeran. A música, originalmente chamada “Fuck Yourself”, diminui a mulher com quem ele teve um relacionamento, mas hoje afirma não se preocupar mais, apesar de escrever toda uma canção sobre ela: “Você acha que partiu meu coração, ó garota, pelo amor de Deus! Você acha que eu estou chorando sozinho e, bem, eu não estou (...) Se você gosta tanto de como se parece, querida, você deveria ir se foder”.


Se não fosse pela fama, Ed Sheeran pouco se diferencia dos vários caras babacas que você provavelmente conheceu em algum momento de sua vida. Ele acredita ser o melhor para qualquer mulher e, quando termina um relacionamento, sempre falará sobre os erros que ela cometeu enquanto estavam juntos e o quanto não sabe como aguentou tudo isso por tanto tempo. Obviamente, ele também falará sobre o quanto é melhor que seu relacionamento atual e, por mais feliz que ela pareça estar, provavelmente sente falta do que tiveram e, se não sente, é porque está muito diferente. E ele, literalmente, também canta sobre isso em “New Man”, do seu novo disco: 
(...) Eu ouvi dizer que ele te faz feliz, então está tudo bem por mim. Mas ainda assim, só estou sendo sincero, continuo vendo seu Instagram e te stalkeando às vezes. Vou tentar não curtir nenhuma foto antiga, porque eu sei que é aí que mora o problema. Me deixe te lembrar do tempo em que você costumava segurar minha mão (...) você age tão diferente quando está com ele. Sei que está se sentindo sozinha, então por favor, se lembre, você continua livre para fazer sua escolha e partir. Não me ligue, quero que você me mostre.


Se ainda assim, tudo isso parecer um grande exagero, a gente relembra de uma entrevista dada pelo cantor em 2013, no qual Sheeran criticou Miley Cyrus pela proposta escolhida para o videoclipe de “Wrecking Ball” – ele achava que sua nudez dispersava o significado da música – e também falou sobre o twerk, uma dança que se originou da cultura negra: “É uma dança de stripper. Se eu tivesse uma filha de nove anos, eu não gostaria que ela dançasse isso”.

Usando o nome de uma das suas músicas: don’t.


Ed Sheeran não é uma exceção dentro da indústria atual. Shawn Mendes é um babaca, John Mayer é um babaca, Justin Timberlake é um babaca, Justin Bieber é um babaca, e por aí vai. Mas enquanto o britânico vai atrás do título de maior artista da atualidade – e os números contribuem pra que ele assuma esse posto – o momento se torna mais do que propício para, enfim, reconhecermos e questionarmos seu privilégio masculino (ninguém o critica como fazem com Taylor Swift, mesmo quando suas narrativas são claramente problemáticas) e branco (imagine se as declarações sobre sexo fácil com mulheres famosas tivessem vindo de um artista negro, como Kanye West), lembrando-o de que existe a famosa hora de parar.

A gente vai se ver na Globo?

Existe um blog chamado “Quem a homofobia matou hoje?”, que diariamente nos atualiza com reportagens sobre pessoas LGBTs que tiveram suas vidas tiradas no Brasil. O país da diversidade, do carnaval e do futebol, é também o que mais mata transexuais, travestis, homossexuais e bissexuais em todo o mundo e, segundo uma pesquisa realizada pelo grupo Gay Bahia em 2016, estima-se que um LGBT morra a cada 26 horas.

Há pouco menos de vinte e seis horas, independente de sua posição política, orientação sexual, gênero, etnia e idade, quem estava com a televisão ligada na Globo, teve sua casa tomada por artistas, ativistas e pessoas públicas LGBT, que se abriram sobre as dificuldades em viver dentro de um país intolerante, desmitificaram os grupos que integram e representam e, de forma descontraída, modelada como entretenimento, deram uma verdadeira aula sobre o que é ser aqueles que morrem todos os dias apenas por serem quem são.

O programa que serviu de palco para todo esse show foi o “Amor & Sexo”, comandado pela Fernanda Lima, e levando em consideração as últimas edições dessa temporada, é esperado que as bandeiras dessas e outras minorias sigam sendo levantadas por mais algum tempo — e isso é maravilhoso!

Não, ninguém se esqueceu de quem é a Globo. A emissora tem um passado e presente que a condenam, é relembrada o tempo inteiro sobre ter apoiado um golpe político no Brasil há alguns anos e, refrescando nossa memória, apoiou outro anos depois. Em sua programação, fomentou estereótipos racistas, machistas e LGBTfóbicos e, após perceber que não poderia mais tratar essas fatias da população com tamanho desrespeito e indiferença, viu a oportunidade de abraçá-los. Abraçar-nos.

Quando se fala em representatividade e visibilidade, não podemos ignorar a necessidade de ocupar os espaços e, cientes de que esse diálogo não deve se limitar aos que já estão do nosso lado e compreendem nossas lutas, é inevitável que nos apropriemos também de palcos que nem sempre nos serviram para o bem, de forma que nossos discursos possam alcançar um número cada vez maior de pessoas.


Uma das convidadas da última edição do “Amor & Sexo” foi MC Linn da Quebrada, uma cantora negra, transexual e periférica, que se autointitula uma “bicha preta, louca e favelada”, e ao cantar sua nova música de trabalho, o afronte dançante de “Bixa Preta”, ela não só promoveu seu material enquanto artista, como fez do programa o palco para o seu discurso.

“Se tu for esperto, tu vai logo perceber que eu já não tô de brincadeira. Eu vou botar é pra foder.”

Outro destaque ficou para Liniker, artista que dispensa limitações de gênero e, usando vestido e batom, realizou uma performance da canção “Geni e o Zepelim”, de Chico Buarque, que retrata a história de Geni, uma travesti que, como muitas outras, é literalmente apedrejada por conta de sua condição inferiorizada pela sociedade.


A apresentação cheia de interpretação é interrompida quando Liniker apresenta os dados que abriram esse texto, concluindo com a afirmação de que isso tem que acabar: “Só assim poderemos nos redimir”.

Outras artistas LGBTs, como Pabllo Vittar, Gloria Groove e As Bahias e a Cozinha Mineira, também passaram pela programação, que contou com a consultoria de Jaqueline Gomes de Jesus, mulher trans, negra, doutora em psicologia social e pós-doutora em trabalho e movimentos sociais.

Não se ganha e mantém por tantos anos o título de maior do Brasil sem ser esperta nos negócios e, enquanto uma empresa, é óbvio que a Globo olhará para os grupos sociais como nichos de mercado, fatias que ainda pode abocanhar como telespectadores. E, mesmo que gradualmente e sob muita resistência, isso tem surtido efeito: semanalmente, a timeline das redes sociais se divide entre os que comemoram o espaço ocupado na programação da emissora e os que criticam a comemoração do primeiro grupo. No final, todos assistem.

Ainda assim, também não podemos negar que, embora não saibamos quais são todas as reais motivações da cúpula global, esse espaço ocupado significa um passo importante para essas minorias, que semanalmente têm a oportunidade de invadir “a tela da tevê” daquela sua tia homofóbica, daquele seu vizinho machista e colega de trabalho racista — um pessoal que dá zero fodas para os textões que você compartilha no Facebook, seja por achá-los chatos, discordar ou sequer entender — para darem a cara à tapa e baterem de volta também.

Tudo está ao nosso alcance nas bolhas que são as redes sociais, nas quais bastam alguns cliques para nos livrarmos do que nos incomoda e outros para nos rodearmos do que nos agrada e representa, mas é na televisão que ainda se concentra o maior poder de influência dos meios de comunicação no Brasil e, uma vez ocupado esses espaços, nossos discursos ecoarão alto demais para serem ignorados. O que não podemos é nos acomodar e acreditar que, por conta de alguns minutos de exposição, nos livramos das violências e opressões de cada dia, até porque, se fosse tão simples, não chamaríamos de luta.


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Esse texto foi originalmente publicado no meu Medium. Você pode me seguir por lá também! :)

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