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Lista: as 10 piores vitórias do Oscar na década (e o porquê)

Ah, o prêmio da Academia... A maior honraria do mundo do entretenimento é algo de investimentos absurdos por parte de pessoas e empresas em busca do tão sonhado careca dourado. Como já disse Madonna quando perguntada se queria um Oscar, "E quem não quer???". O auge do entretenimento televisivo, há quase um século a premiação faz o mundo parar para ver quem sairá da noite um pouco mais dourado, e nós, também, estamos aqui para julgar tudo isso.

A década de 2010 foi importante para a premiação e, consequentemente, a indústria. Tivemos a primeira mulher a vencer o Oscar de "Melhor Direção", tivemos calorosas discussões sobre a representatividade de minorias entre os indicados, tivemos o primeiro filme 100% negro e LGBT a vencer o maior prêmio da noite, enfim, vimos avanços, mas também vimos algumas decisões que nos fizeram falar "Academia, conte comigo para nada". E aqui trago as 10 piores entre elas.

Cada um dos 10 prêmios listados estão aqui tanto pelo valor absoluto - o que o agraciado fez em seu respectivo filme - quanto pelo valor comparativo - qual era a concorrência naquela categoria. Caso você discorde de algum a ponto de se inflamar, não esqueça: cada um deles está em casa com um Oscar em casa, então unbothered. Faça o mesmo.


10. Brie Larson vencendo "Melhor Atriz" por "O Quarto de Jack", Oscar 2016

Já existe há algum tempo um padrão que envolve o prêmio de "Melhor Atriz": premiar uma atriz nova e promissora em detrimento de uma mais velha e consolidada, afinal, essa lógica rende muito mais para a indústria. Brie Larson foi uma delas. A atriz é deveras competente e faz um bom trabalho em "O Quarto de Jack", todavia, sua vitória é um exagero tremendo, principalmente vendo que ela não era, nem perto, a melhor entre as indicadas: Cate Blanchett por "Carol" e Charlotte Rampling por "45 Anos" eram muito mais merecedoras.

9. "A Grande Aposta" vencendo "Melhor Roteiro Adaptado", Oscar 2016

A Academia se derrete por roteiros complicadíssimos, intricados e com falatório interminável, por isso não surpreendeu quando "A Grande Aposta" venceu "Roteiro Adaptado". Um daqueles filmes que só é valorizado pelo grupinho norte-americano, o roteiro brilhante de "Carol" estava indicado ali do lado, esnobado criminalmente, assim como a falta de indicação à categoria de "Melhor Filme" naquele ano.

8. Tom Hooper vencendo "Melhor Direção" por "O Discurso do Rei", Oscar 2011

O Oscar 2011 foi um daqueles que a gente, quase uma década depois, olha para trás e pensa "o que diabos aconteceu?". Indicados errados e vencedores piores ainda, um dos auges foi a limpa que "O Discurso do Rei" fez, vencendo quatro prêmios. Se for para escolher o pior, com certeza foi Tom Hooper levando "Melhor Direção". Não apenas pela robótica e nada inspirada direção: ele era, literalmente, o mais fraco dos cinco indicados. A cara do Darren Aronofsky (vencedor moral) no anúncio da categoria resume. 

7. "O Jogo da Imitação" vencendo "Melhor Roteiro Adaptado", Oscar 2015

"O Jogo da Imitação" é um daqueles filmes históricos desesperado para ganhar um Oscar. E conseguiu. É verdade que das oito indicações, felizmente venceu apenas uma, e logo naquilo que o filme faz de pior: o roteiro. Esquemático, rasteiro e pronto para uma matinê qualquer, a história de Alan Turing tinha tudo para ser uma sólida biografia LGBT, mas termina como um daqueles textos que sai direto em DVD. Bom pontuar que a categoria em 2015 estava um horror, contudo, "Whiplash" era concorrente. Não dá para entender.

6. "Esquadrão Suicida" vencendo "Melhor Maquiagem", Oscar 2017

Até hoje me pergunto se esse acontecimento é real: "Esquadrão Suicida" tem um Oscar para chamar de seu. Uma indicação já seria o auge de uma honraria para essa bagunça em formato de HQ audiovisual, contudo, a Academia foi ainda mais longe e escolheu a maquiagem do filme - que é, na melhor das hipóteses, "competente" - como a melhor do ano. "Star Trek: Sem Fronteiras" e "Um Homem Chamado Ove" seriam nomes mais dignos.

5. "Bohemian Rhapsody" vencendo "Melhor Montagem", Oscar 2019

Eu realmente podia escrever todo um texto sobre o quão desastrosa é a montagem de "Bohemian Rhapsody" (comento sobre na crítica do filme), porém, vou deixar esse tweet falar por si só.

4. Eddie Redmayne vencendo "Melhor Ator" por "A Teoria de Tudo", Oscar 2015

Você é um ator em acensão e quer um Oscar para chamar de seu? É fácil, só seguir essa fórmula: escolha um personagem real em sua cinebiografia + assista ao máximo de fitas sobre a personalidade, e copie seus trejeitos + exagere na carga emocional, se fizer chorar é ainda melhor + submeta-se a uma mudança física drástica. Seu nome já tá na estatueta, como foi o caso de Eddie Redmayne como Stephen Hawking. Se você assistir apenas à sua performance, pode até ver os motivos que a Academia tenha colocado o nome do ator no envelope, porém, visto que Steve Carell e Michael Keaton entregaram duas das melhores atuações daquele ano, a coisa empalidece. Piora ainda quando percebemos que aquela atuação antes tão coerente é o mote do ator, que desde então repete a mesma coisa em toda atuação.

3. "Green Book" vencendo "Melhor Roteiro Original", Oscar 2019

Já deu para perceber que a 91ª edição do Oscar estava empenhada em acumular fracassos, certo? Em um ano fantástico para o cinema, a Academia apontou o dedo para "Green Book" como o melhor roteiro daquela temporada. Um verdadeiro manual clichê sobre o racismo na nossa sociedade, há absurdamente NADA de inovador nesse texto da mente por trás de "Debi & Lóide" (sim). Chega a assustar quando pensamos que os votantes viram o texto de "A Favorita" e acharam que não era tão bom quanto o de "Green Book".

2. Jennifer Lawrence vencendo "Melhor Atriz" por "O Lado Bom da Vida", Oscar 2013

Aquele esquema que fez Brie Larson vencer o Oscar de "Melhor Atriz" foi o mesmo que rendeu o careca dourado para Jennifer Lawrence. A situação no caso de JLaw é muito pior por um motivo simples: enquanto a atuação de Larson era, vista unicamente, algo até entendível de receber o prêmio, a de JLaw em "O Lado Bom da Vida" é uma tragédia e a pior das cinco indicadas. O filme com toda certeza não ajuda: uma "Sessão da Tarde" sem tirar nem por, passamos por um draminha superficial e um romance água com açúcar para gerar vergonha, e JLaw jamais chega perto de transparecer ser a ninfomaníaca que seu papel tenta por na tela. Para consolar o coração, só pensar que ela venceu o prêmio por "Mãe!". É revoltante, também, lembrar que Emmanuelle Riva morreu sem um Oscar, mesmo depois da genial performance em "Amor".

1. Rami Malek vencendo "Melhor Ator" por "Bohemian Rhapsody", Oscar 2019

"Bohemian Rhapsody" foi, de longe, o maior delírio coletivo da década. Massacrado pela crítica, mas amado pelas premiações, a bomba foi capaz de sair o Oscar 2019 com QUATRO prêmios, o maior do ano - e todos os quatro poderiam estar aqui listados. Mas nada é tão assombroso quanto Rami Malek vencendo "Melhor Ator". Não que ele esteja horrível na pele de Freddie Mercury, mas está bastante longe da excelência que um Oscar pode representar, que seria muito bem exemplificada por Bradley Cooper em sua melhor atuação da carreira por "Nasce Um Estrela". A produção está mais preocupada em tornar Malek o mais similar possível com Mercury (e realmente consegue em vários momentos) do que em compor uma atuação de verdade, afinal, a performance é mais importante que o visual.  Um daqueles prêmios que daqui a alguns anos as pessoas vão olhar para trás e pensar "como foram capazes?". Cachorro coloca dentadura na boca e ganha Oscar de "Melhor Ator".

Lista: os 20 melhores filmes de terror da década

Preciso começar esse post apontando uma obviedade provavelmente desagradável para você que chegou até aqui: essa não é uma lista com os melhores filmes de terror dos anos 2010. Pelo menos não da maneira que você imagina. Eu, como extremo entusiasta do horror desde sempre, já esbarrei com inúmeras listas de melhores de alguma faixa temporal específica, e basicamente todas tinham algo em comum: o que era considerado "terror".

A ideia comum do que é "terror" é aquele filme que assusta - os "Invocação do Mal" e "Annabelle" da vida (que, entrando rapidamente no âmbito da subjetividade, são péssimos). Sim, os exemplos citados e seus similares são filmes de terror, porém, o gênero abrange muito, mas muito mais. Na nossa atual indústria do cinema, que condiciona filmes de terror no molde de jump-scares, muita coisa é deixada de fora ao não ser considerado terror, o que é uma insanidade.

Em uma rápida busca na definição de "terror" como gênero cinematográfico, encontramos que é um gênero que visa explorar o macabro, criando medo ou repulsa no público por meio de uma força maligna - que vai de demônios, vampiros e bruxas até desastres naturais e serial killers. E isso é uma definição do todo, se entrarmos nos sub-gêneros, a coisa vai ainda mais além.

Nesse encerramento de década, podemos ver que os anos 10s foram marcados por duas vertentes bastante fortes: o remake e o found-footage. Vimos inúmeros revivals de clássicos, como "Deixa Ela Entrar" (2010), "A Hora do Pesadelo" (2010), "Doce Vingança" (2010), "Maníaco" (2012), "Carrie: A Estranha" (2013), "A Morte do Demônio" (2013), "Poltergeist" (2015), "A Bruxa de Blair" (2016), "Suspiria" (2018), e a lista continua. Do outro lado, com o sucesso absurdo de "Atividade Paranormal" e "Rec", o found-footage encontrou um boom, com "O Último Exorcismo" (2010), "V/H/S" (2012), "Amizade Desfeita" (2014), "A Possessão de Deborah Logan" (2014), "A Visita" (2015), etc etc etc. E, não é uma surpresa, a saturação dos moldes só ajuda na ideia de que terror não é um gênero "sério" - só ver quantos filmes de terror foram indicados ao Oscar de "Melhor Filme" nos últimos 10 anos: dois longas (e ambos estão na presente lista).

Sem mais delongas, os critérios de seleção e classificação da lista: 1: ser um longa metragem lançado na década de 2010; 2: ter o gênero "terror" como um dos principais em sua ficha técnica; 3: a maneira como o filme trabalha o terror. Então, a ordem da lista não está baseada no filme como um todo, e sim na qualidade, relevância e execução do terror, o que deixa a ordem mais justa ao ser avaliado um gênero que tem pesos diferentes entre as obras. Como sempre, todos os textos são livres de spoilers e, agora, acompanhados do sub-gênero mais marcante de cada escolhido. Pronto para a maratona?

20. Os Famintos (2017)

Dirigido por Robin Aubert, Canadá. Sub-gênero: terror zumbi.
Zumbis estão presentes na cultura pop há gerações, tendo seu ápice na modernidade com a série “The Walking Dead”. Seja com abordagens voltadas ao gore – como em “Madrugada dos Mortos” – ou à comédia – vide “Zumbilândia” –, nenhum vence “Os Famintos” na categoria que basicamente não é explorada em gêneros fantásticos: o realismo. Como seria o mundo se, de fato, zumbis tomassem conta? Esse é o pontapé da produção, que, apesar de inevitavelmente carregar traços de terror, é, acima de tudo, uma produção dramática. Narcotizante, tenso e climático, “Os Famintos” é conquista notável como trabalho de gênero – e aqui você pode, sem medo, falar “olha essa fotografia fa-bu-lo-sa!”.

19. Evolução (2015)

Dirigido por Lucile Hadžihalilović, França. Sub-gênero: terror fantástico.
"Evolução" parece se passar em outro universo e outro tempo. Fincando em uma ilha, um garoto vive com sua mãe. Todos os habitantes são crianças meninos, suas mães e as enfermeiras do hospital local, o lugar que todos os garotos vão parar. "Evolução" beira o limite do hermético, porém, vai arrebatando o público quando joga pedaços do quebra-cabeças que soluciona o todo, um mistério que caminha sobre a certeza e o fantástico e entrega tanto beleza quanto morbidez.

18. Kill List (2011)

Dirigido por Ben Wheatley, Reino Unido. Sub-gênero: terror psicológico.
Ex-soldado sofrendo para manter as contas em dia aceita o trabalho de matador de aluguel. Só que, para seu espanto, ao apontar a arma para a vítima comprada, ouve um agradecimento. "Kill List" e seu ritmo lento pode afastar a plateia mais acostumada com um terror incansável, mas a sessão vale total a pena pela direção seguríssima de Wheatley. Cultos obscuros, tragédias passadas e teorias da conspiração são os temperos dessa pérola ainda escondida para o mainstream, capaz de arrepiar a epiderme com seu último ato devastador.

17. Grave (2016)

Dirigido por Julia Ducournau, França. Sub-gênero: terror dramático.
Uma garota vegetariana recém chegada na faculdade é forçada a comer carne no trote do curso, o que desencadeia uma fome por carne humana que, pouco a pouco, vai dominando a menina. Seguindo a tradição do horror francês, "Grave" é uma metafórica viagem que força o espectador a vislumbrar o desabrochar violento de uma garota para os desejos mais primitivos do seu ser, dialogando com a repressão sexual feminina num final para ver de joelho. Há bastante metáforas na tela que visam debater como as mulheres ainda são tratadas como pedaços de carne pela sociedade. Só que, aqui, as mesas viram.

16. A Região Selvagem (2016)

Dirigido por Amat Escalante, México. Sub-gênero: terror sci-fi.
O sexo em si é um tabu enorme ainda hoje, mas, muito mais que o ato sexual, a sexualidade especificamente feminina é ainda mais censurada. Homens são quase treinados, desde pequeno, a explorarem sua sexualidade, uma área proibida para o sexo oposto. Com o mexicano "A Região Selvagem", é a vez das mulheres. Quando um meteorito cai na cidade de Alejandra, ela finalmente descobre o prazer nas mãos (ou nos tentáculos) de um alienígena, que rende cenas bizarras pelos gráficos e pela interpretação assustadoramente palpável. Filme com mulheres abraçando suas sexualidades, em que a protagonista se cansa dos machos da mesma espécie e fazem sexo com uma criatura não-humana que consegue satisfazê-la como homem nenhum? Obra-prima.

15. A Caverna (2014)

Dirigido por Alfredo Montero, Espanha. Sub-gênero: found footage.
Que o found footage já deu o que tinha que dar, todo consumidor do terror já sabe. Só que, de vez em quando, ainda é lançado algum exemplar que mostra que, com criatividade e competência, ainda há o que ser extraído da técnica. "A Caverna" é um dos maiores acertos do horror contemporâneo ao unir a veia comercial com o primor da arte - a plateia vai se manter grudada na cadeira enquanto se contorce de claustrofobia num produto de real qualidade. Simples em sua premissa e estrelar em concepção, o longa faz o que muitos terrores esquecem: o quanto nós mesmos somos estopins para o medo. É muito mais fácil aceitarmos o medo vindouro de algo que existe do que vampiros, lobisomens ou demônios - e em situações como a de "A Caverna", a pessoa do seu lado é seu inimigo mais do que qualquer alienígena invadindo o planeta.

14. O Segredo da Cabana (2012)

Dirigido por Drew Goddard, EUA. Sub-gênero: terrir.
Uma galera jovem vai aproveitar as férias em uma cabana na floresta, local que vai ser o túmulo de muitos. Soa familiar? Sim, essa é uma premissa pra lá de conhecida, e é proposital. "O Segredo da Cabana" vai no que há de mais óbvio e clichê no terror norte-americano e, de forma sagaz, reinventa uma roda já há muito tempo gasta. Um terrir legítimo (terror + comédia), o filme enterrou essa história específica de maneira criativa, lúdica e que jamais deixa a bola cair, criando camadas cada vez mais eletrizantes. O clímax, uma enorme homenagem ao gênero, é sensacional.

13. No Tecido (2018)

Dirigido por Peter Strickland, Reino Unido. Sub-gênero: terror sobrenatural.
Uma mulher recém-divorciada decide reaver sua vida amorosa. O que ela precisa para dar aquele ânimo na sua autoestima? Um vestido novo. Ela escolhe um longo vermelho e maravilhoso, sem saber que ele é um objeto amaldiçoado, decidido a matar quem o use. Sim, "No Tecido" é um filme sobre um vestido assassino. A película sabiamente não se leva tão a sério (nem teria como), jogando toda a sua seriedade na composição do ecrã de seu universo, um híbrido majestoso entre o novo e o velho. Hilário e desconcertante na medida correta, "No Tecido" é delicioso em sua atmosfera e visual.

12. A Casa Que Jack Construiu (2018)

Dirigido por Lars Von Trier, Dinamarca. Sub-gênero: terror dramático.
O nome de Lars Von Tier está sempre de mãos dadas com a polêmica, já que o diretor não tem papas na língua e coloca no ecrã temas tabus e controversos. "A Casa Que Jack Construiu" não foge da regra: ao seguir 12 anos na vida de um serial killer, Trier passa a faca sem piedade no império cultural e político de Donald Trump, expondo as brutalidades sociais afloradas pela vitória do presidente norte-americano - cada um dos segmentos são brutais em termos visuais e violentos como crítica. Mesmo sutilmente (foco nos bonés vermelhos), "Casa Que Jack" escancara a América que ensina crianças a amarem armas, que gera massacres em escolas e que vira as costas para não ajudar o próximo. Uma sátira não só ao "homus trumpus" como ao cinema de horror, Trier nos leva até ao Inferno a fim de mostrar que o conservadorismo virou uma praga.

11. Cisne Negro (2010)

Dirigido por Darren Aronofsky, EUA. Sub-gênero: terror psicológico.
Um dos seletos filmes de terror a serem indicados ao Oscar de "Melhor Filme" (e, no caso, o vencedor moral da categoria em 2011), "Cisne Negro" tem o desafio de sua protagonista (que deu "Melhor Atriz" à Natalie Portman) de interpretar o papel principal do balé "O Lago dos Cisnes": ela é ideal como o Cisne Branco, o lado puro, mas não consegue exalar o Cisne Negro, o viés fatal. Uma montanha-russa, "Cisne Negro" funciona como metáfora da perseguição artística pela perfeição, e o quanto essa corrida pode nos levar à loucura. Desglamourizando a beleza do balé, há uma verdadeira guerra na cabeça da protagonista, que vai rapidamente ruindo seu psicológico e misturando real e alucinação.

10. Demônio de Neon (2016)

Dirigido por Nicolas Winding Refn, Dinamarca. Sub-gênero: terror psicológico.
Uma jovem e virginal garota chega na cidade grande com o sonho de se tornar modelo, e "Demônio de Neon" está para a moda assim como "Cisne Negro" está para o balé. No entanto, o grande editorial de luxo que é o filme de Refn aborda de forma mais brutal e macabra os corredores sujos de inveja e sangue que alimentam (e matam de fome) sonhos e egos, sendo uma psicodélica viagem ao submundo fashion, com requintes técnicos violentamente perfeitos evocando sensações desconcertantes no espectador, forçado a embarcar em loucuras de página de revista. O final, onde o filme empurra todos os limites, culmina numa das mais memoráveis e arrepiantes conclusões dos últimos tempos, a última cereja do bolo grotesco – todavia sempre lindíssimo – trabalho que é “Demônio de Neon”.

9. O Farol (2019)

Dirigido por Robert Eggers, EUA. Sub-gênero: terror psicológico.
Dois marinheiros são atirados em uma ilhota no meio de lugar nenhum com o único objetivo de cuidar do farol lá presente. O mais velho, atuando no local há muito tempo, parece fissurado pela luz do farol, impedindo que o novato se aproxime. Dono de um par de cenas instantaneamente icônicas, "O Farol" é a solidificação do cinema de Eggers como mitológico quando condena seus personagens - e o algoz é a própria natureza. O filme não tem problema em fotografar nossa existência como algo decrépito, fadado ao insucesso quando estamos tão preocupados em saciar nossos egoístas desejos. Somos de uma fragilidade tão aparente que, às vezes, a natureza nem precisa se esforçar para nos destruir. Nós mesmos nos encarregamos disto.

8. Corra! (2017)

Dirigido por Jordan Peele, EUA. Sub-gênero: terrir.
O último terror a chegar no Oscar de "Melhor Filme", "Corra!" é um evento cultural e marco no gênero. Um jovem negro finalmente vai à casa dos pais da namorada branca. Há toda uma tensão velada, que parte do próprio protagonista, mas todos não param de falar o quanto estão de braços abertos para a diversidade do casal, o que, não surpreendentemente, é faxada para um plano maquiavélico. O longa não está preocupado em esconder seus clichês e óbvias referências; o que “Corra!” está preocupado é em compor momentos que elevam o seu gênero, carregado por cenas geniais e discussões sobre racismo postas de maneira lúdica, esperta e incisiva pelas lentes do diretor/roteirista Jordan Peele - que levou o Oscar de "Melhor Roteiro Original".

7. Midsommar (2019)

Dirigido por Ari Aster, EUA. Sub-gênero: terror folk.
"Midsommar", o "O Homem de Palha" da nossa geração, tem uma robusta duração, desconcertantes sequências e inundação de simbolismos, o que tornam a sessão uma trabalhosa digestão para a plateia. Usando o folclore sueco como combustível de seu roteiro, o longa é narcotizante e hipnótico ao reforçar o terror antropológico e cultural, além de mais uma comprovação (colorida e luminosa) de que Ari Aster é um mestre no que faz e um dos mais bizarros términos de relacionamento que o Cinema já fez. Teria sido mais fácil terminar por mensagem.

6. Boa Noite Mamãe (2014)

Dirigido por Veronika Franz & Severin Fiala, Áustria. Sub-gênero: terror dramático.
Dois irmãos gêmeos estão ansiosos pelo retorno da mãe, afastada de casa para se submeter à cirurgias plásticas. Todavia, quando ela retorna, os irmãos têm plena convicção de que aquela mulher é uma impostora. "Boa Noite Mamãe", um dos raríssimos exemplares a serem selecionados para o Oscar de "Melhor Filme Internacional", é uma lenta epopeia de duas crianças tendo que lidar com uma dúvida esmagadora, potencializada pela escolha imagética brilhante da mãe, que emana uma áurea vilanesca. Brincando com expectativas e reações, esse é um clássico do terror contemporâneo pela excelência em suas imagens, atmosfera e realizações.

5. Clímax (2018)

Dirigido por Gaspar Noé, França/Bélgica. Sub-gênero: terror psicológico.
"Clímax" não é uma produção recomendável, mas pelos motivos corretos: quando um grupo de dançarinos descobre que a bebida da festa foi batizada com LSD, o lado mais animalesco de cada um vem à superfície. Esse é um filme que não só demanda como suga o emocional do público, tão massacrado quanto os personagens, presos em uma bolha ácida que não escolheram e nem podem escapar. E talvez seja a impotência - tanto nossa como deles - que faz "Clímax" tão bizarro. Gaspar Noé nunca pôs os dois pés no terror, apesar de sempre flertar no gênero, e dessa vez ele não apenas entrou como filmou um show de horrores inacreditável, transformando cinema em uma experiência sensorial.

4. Mãe! (2017)

Dirigido por Darren Aronofsky, EUA. Sub-gênero: terror psicológico.
Um dos filmes mais controversos e divisores de opinião da década, "Mãe!" possui uma forte mitologia, mas não se trata de monstros ou elementos sobrenaturais. O horror é feito pelas nossas próprias mãos, e poucas obras são capazes de fomentar o pavor que é a sessão servida por "Mãe!".  Bebendo largamente da fonte bíblica, Aronofsky consolida seu nome na arte e realiza mais um imperdível - e sim, pretensioso - capítulo de sua cinematografia, que, apesar de não ser um filme para todos os públicos, é inesquecível pelas imagens e discussões, com a exclamação do título sendo um pequeno aviso para o que está por vir. Não senta na piaaaaa!

3. Suspiria (2018)

Dirigido por Luca Guadagnino, EUA/Itália. Sub-gênero: terror sobrenatural.
Remake do clássico de Dario Argento, lançado em 1977, Guadagnino abandona o compromisso com a trama do original e cria uma película prórpia, seguindo apenas a premissa: uma dançarina americana chega à uma escola de balé em Berlim que é controlada por bruxas. As atuações, os diálogos e todos os aspectos visuais de "Suspiria" são irretocáveis, todavia, o melhor é sua atmosfera. Há imagens de beleza estonteante ao lado de cenas perturbadoras, emolduradas por uma narrativa onírica que, a partir de sua técnica, tem a capacidade de transformar o mundo físico em algo etéreo. Dotado de pretensão para dar e vender, "Suspiria" é um pesadelo filmado que consegue ser traduzido por um diálogo proferido aos berros: "Isso não é vaidade, é arte!".

2. A Bruxa (2015)

Dirigido por Robert Eggers, EUA/Canadá. Sub-gênero: terror sobrenatural.
“A Bruxa” trata de muitos subtextos, mas é, acima de tudo, uma celebração do caos. É a regurgitação fidedigna de todos os maiores medos que nós temos: medo da solidão, perda, dor, morte, do mal em si. O filme não é de fato assustador no modo convencional da palavra, é macabro pelas suas metáforas, com algumas passagens perturbadoras que chocam pela crueza e vivacidade do mal. Ainda por cima, é pilar fundamental para a indústria do terror, colocando nos grandes postos um estilo marginalizado aos cinemas de arte e mudando os rumos do gênero.

1. Hereditário (2018)

Dirigido por Ari Aster, EUA. Sub-gênero: terror sobrenatural.
Em boa parte da duração, parece que "Hereditário" se contentará em ser um filme que, ao invés de produzir medo, vai explanar acerca do seu impacto sobre o ser humano, o que é concreto até chegarmos ao clímax, um pesadelo assustador na tela que não mede limites para catapultar o espectador no meio do pandemônio instaurado. Tudo é milimetricamente justificável, e, por isso, ainda mais aterrador e impactante, parindo diante dos nossos olhos um dos melhores finais da história do cinema de terror – soando ainda mais delicioso quando percebemos que “Hereditário” é o trabalho de estreia de Ari Aster, logo num gênero tão difícil. Daqueles filmes fundamentais não só para o terror como também para o Cinema. "O Exorcista" finalmente encontrou seu filhote no novo século.

Lista: os 10 vencedores do Oscar de “Melhor Filme” da década, do pior para o melhor

Ah, o prêmio da Academia.... Todos anos criticamos e todos os anos assistimos. Muito mais um evento da Sétima Arte do que uma celebração à qualidade, o Oscar possui quase 100 anos e uma lista enorme de acertos e erros. De obras-primas a películas de gosto duvidoso, é só pegar a última década para vermos que Academia bambeia com suas decisões.

É bom lembrar que, desde 1999, quando "Shakespeare Apaixonado" venceu o prêmio máximo, a corrida dourada virou uma premiação de campanha: quem convencer melhor, leva. Não que antes fosse realmente premiado o melhor dos indicados - dentro da esfera da subjetividade -, porém, agora os estúdios investem milhões para fazerem seus filmes abocanharem a estatueta mais cobiçada da indústria, que vão de jantares para os votantes até os velhos DVDs com os filmes especialmente para os membros.

De "Guerra Ao Terror" a "Green Book", listei os 10 vencedores do Oscar de "Melhor Filme", do pior para o melhor, levando em consideração o filme em si, seus concorrentes e como o tempo cuidou de cada vitória - então, claro, quanto mais anos, mais o impacto do envelhecimento para o bem ou para o mal. Quais filmes a Academia premiou e nos fez dizer "conte comigo para tudo"?


10. O Discurso do Rei (2011)

Tom Hooper é um dos mais limitados diretores a se escorarem no molde "por-favor-meu-filme-merece-um-Oscar!" - "Os Miseráveis" (2012) e "A Garota Dinamarquesa" (2015) não me deixam mentir. Indicado a 12 prêmios, "O Discurso do Rei" venceu quatro: "Filme", "Direção", "Roteiro Adaptado" e "Ator" para Colin Firth, que viveu um rei gago e sua luta para o derradeiro discurso do título. Bem esquemático, só mesmo a Academia e a Rainha Elisabeth (que chorou com o filme) para amarem essa esquecível (e bem sucedida) empreitada para a temporada de premiação. Fica ainda pior quando lembramos que ele concorreu com "A Rede Social" e "Cisne Negro", dois dos melhores filmes da década. A cara do Darren Aronofsky perdendo o Oscar de "Melhor Direção" resume.

9. Green Book: O Guia (2019)

O último vencedor da década foi a coroação de uma das piores edições da premiação no período. "Green Book" trata de um tem ainda necessário: o racismo. Só que a produção não tira vantagem dessa necessidade para desenvolver um filme que discuta algo de uma forma além do que já foi posta no ecrã centenas de vezes. É tudo um manual sobre o racismo que encaixaria perfeitamente na "Sessão da Tarde" pela passividade diante da cartilha de filmes de evocação racial. Beira a insanidade pensar que, com "A Favorita", "Infiltrado na Klan" e "Nasce Uma Estrela", alguém prefira "Green Book".

8. Argo (2013)

"Argo" talvez seja o vencedor do Oscar mais sem sentido dessa década. Não que o filme seja ruim, mas ele é muito fora da curva do que a Academia costuma valorizar, principalmente quando comparado com seus concorrentes. Ao contrário dos outros dois já listados, que estão dentro do bê-a-bá da premiação, "Argo" é um filme à la "Supercine" que une história com suspense, quase um irmão de concepção de "Atração Perigosa" (2010), também dirigido por Ben Affleck (que nem indicado ao Oscar foi). Anos depois, mal dá para lembrar que um dia preferiram "Argo" a "Amor", que só não passou a limpa pelo preconceito da Academia com filme de língua não-inglesa - só lembrar que "Roma" levou tudo na temporada de 2019 e quem acabou com o maior prêmio foi "Green Book".

7. O Artista (2012)

"O Artista" foi o primeiro filme mudo a levar "Melhor Filme" desde "Asas", em 1927 (sim, na primeira edição do prêmio), o que é, por si só, um feito inacreditável. O argumento é basicamente o mesmo de "Cantando na Chuva" (1952): a mudança para o Cinema falado e como os atores da época muda sofreram o impacto. Uma clara homenagem ao avanço da Sétima Arte, foi um passo arriscado ser projetado (quase) sem falas e em preto e branco no auge do blockbuster 3D, contudo, havia outra homenagem ali do lado que poderia ter roubado o careca dourado: "A Invenção de Hugo Cabret".

6. Guerra Ao Terror (2010)

É bem preocupante notar que, em 91 anos, apenas um filme dirigido por uma mulher venceu "Melhor Filme": "Guerra Ao Terror". Kathryn Bigelow é, também, a única mulher a levar o careca de "Melhor Direção" - e a lista de indicadas continua escassa, apenas cinco até hoje. É bem verdade que "Guerra Ao Terror" não foi o melhor filme de 2009, mas foi um marco importante na indústria ao trazer uma figura feminina por trás de um tema tão binário: o gênero bélico. Cru, seco e inteligentemente tenso, a fita vai até um dos eventos mais controversos da história norte-americana atual, a Guerra do Iraque, um elemento fundamental para o apresso da maior premiação do país.

5. 12 Anos de Escravidão (2014)

2014 foi o ano mais forte do Oscar nessa década: não havia um mísero indicado verdadeiramente ruim - "Trapaça" chega perto, no entanto, há elementos de redenção. O melhor entre os nove selecionados à categoria principal, "Ela", não estava entre a corrida dupla que colocou "12 Anos de Escravidão" e "Gravidade" à frente dos outros - não por acaso, são os que levaram os principais prêmios. Enquanto "Gravidade" tinha o peso de uma ousadia técnica impressionante, o cuidado do texto e o peso histórico de "12 Anos" fez com que Steve McQueen fosse o primeiro negro a receber "Melhor Filme" por esse horror escravocrata que não tem medo de escancarar os absurdos do período.

4. Spotlight: Segredos Revelados (2016)

Assim como no Oscar 2014, a edição de 2016 também viu dois filmes se digladiando pelo maior prêmio, "O Regresso" e "Mad Max: Estrada da Fúria". Só que, ao contrário de 2014, 2016 viu um filme que estava fora da briga vencer ao ser o mais "inofensivo" na queda de braço da temporada: "Spotlight". Enquanto "O Regresso" e "Mad Max" focavam na campanha contra o outro, "Spotlight" seguiu sem sofrer retaliações e recebeu ainda mais apreço pela denúncia filmada contra o caso real de padres pedófilos. Possui familiaridades e, às vezes, é correto até demais, contudo, é um belo caso do Cinema como ferramenta de crítica ao real. Regina George, Hulk, Batman e Dente de Sabre contra padres pedófilos? "Vingadores" apenas sonha.

3. Birdman ou (a Inesperada Virtude da Ignorância) (2015)

2015 foi uma grata surpresa quando a Academia ignorou todos os filmes feitos milimetricamente para abocanhar "Melhor Filme" (cof, "A Teoria de Tudo", cof, "O Jogo da Imitação", cof) para premiar o longa menos "cara da Academia", o insano "Birdman", que rendeu os (três) primeiros Oscars a Alejandro G. Iñárritu (que já tem cinco). Com uma metanarrativa que paralela a figura de seu protagonista com a vida de seu ator, "Birdman" é o "Crepúsculo dos Deuses" (1950) da era do Twitter quando temos Riggan Thomson - personagem que deveria ter dado o Oscar a Michael Keaton - desesperado a alcançar uma fama que não lhe pertence mais. Cheio de gags, cortes invisíveis e ironia para dar e vender, "Birdman" é um clássico contemporâneo, mas, entre os indicados, quem deveria ter vencido "Melhor Filme" era "Whiplash".

2. A Forma da Água (2018)

Um dos mais deliciosos anos para o Oscar, 2018 trouxe grandes nomes e premiados coerentes. Vários do montante dariam dignos vencedores - "Três Anúncios Para Um Crime", "Lady Bird", "Corra!" -, todavia, o melhor foi felizmente agraciado: "A Forma da Água" já chegou botando banca com o Leão de Ouro no bolso (o "Melhor Filme" do Festival de Veneza) e sendo corretamente chamado de "a obra-prima de Guilhermo Del Toro" ao retratar um dos mais incomuns amores da história do Cinema: uma mulher muda e um humanoide anfíbio da Amazônia (em parte, esse Oscar é do Brasil). Da composição de época irretocável à cena final para explodir qualquer coração, "A Forma da Água" é uma dádiva da Sétima Arte.

1. Moonlight: Sob a Luz do Luar (2017)

O maior vencedor do Oscar de "Melhor Filme" não só da década como do século, "Moonlight" é uma revolução ao ser a primeira produção a receber o prêmio sendo 100% atuado por atores negros e, não satisfeito, é também o primeiro LGBT no pódio mais alto. A saga de Chiron, contada em três capítulos, é o ápice de tudo o que o Oscar premiou ao trazer humanidade, delicadeza e crueza com uma história de importância incalculável. Foi ainda mais emocionante pelo erro dos envelopes, dando a "La La Land" o prêmio por dois minutos antes de perceberem o erro.

***

Lista: as 50 melhores atuações do cinema da década (Parte 2)

Continuando as listas de melhores da década (só clicar na tag para acompanhar todas), dessa vez trouxe as 50 melhores atuações da década no Cinema para o Cinematofagia. E os anos 2010s foram bastante importantes para a Sétima Arte, vendo as portas se abrirem para uma maior diversidade dentro dos maiores pólos da indústria. Mesmo ainda tendo um grande caminho a ser trilhado, das grandes premiações televisivas aos prêmios de festivais mundo afora, estamos cada vez mais valorizando artistas plurais.

Então decidi selecionar minhas 50 performances favoritas em filmes da década. Algumas regras básicas foram levadas em consideração; 1: a atuação deve ser em um longa lançado comercialmente ou disponibilizado no Brasil entre 2010 e 2019; 2: não haverá diferenciação entre atuações principais ou coadjuvantes; 3: só será escolhido uma atuação por ator/atriz (ou seja, a melhor entre profissionais com mais de uma atuação de destaque do período será a escolhida).

Como toda lista, as atuações estão em ordem de preferência, porém, é importante apontar o óbvio: todas são incríveis, não havendo uma menor que a outra. A ordem pega nuances, iconicidade e até mesmo a qualidade do filme como um todo - afinal, uma atuação fica ainda melhor quando dentro de um grande filme -, mas não devem ser levadas com tanta seriedade - até mesmo porque tantas outras igualmente sensacionais ficaram de fora. 50 pode parecer um grande número, no entanto, dentro da qualidade da arte, é só uma pontinha do que a década nos ofereceu.


25. Ethan Hawke – No Coração da Escuridão

Personagem: Ernst Toller
É curioso ver como padres conturbados geram tantas performances além da média - de Max von Sydow em "O Exorcista" até Philip Seymour Hoffman em "Dúvida" (2008). Ethan Hawke entra nesse hall com "No Coração da Escuridão" (2017). Entrando na vida cristã após a perda do filho, padre Toller não imagina o turbilhão em que está prestes adentrar quando conhece uma esposa grávida e seu marido suicida. Com um roteiro que vai à fundo na perda absoluta da fé, Hawke desenvolve sutilezas avassaladoras ao por na mesa discussões tão atuais e complexas, carregando uma cruz de emoções que rasgam o ecrã.

24. Zain Al Rafeea – Cafarnaum

Personagem: Zain El Hajj
Um dos maiores filmes de realismo documental do nosso tempo - e vencedor moral do Oscar de "Filme Estrangeiro", "Cafarnaum" (2018) tem Zain El Hajj como fio condutor da trama: ele, com 12 anos, vai à justiça contra os pais após ser preso por um crime que só será revelado mais tarde. Entrando nos becos das favelas do Líbano, Zain Al Rafeea majestosamente dá realismo ao seu personagem mesmo com tão pouca idade. Há uma crueza e brutalidade nada inerente da infância, prova de como o meio molda um indivíduo, e Rafeea é capaz de soar verdadeiro em todos os momentos.

23. Michelle Pfeiffer – Mãe!

Personagem: A Mulher
No meio do pandemônio que é "Mãe!" (2017), é notável como Michelle Pfeiffer obtém nossa atenção mesmo em um papel coadjuvante. A veterana ressurge como a mulher que um belo dia aparece na porta da casa dos protagonistas para deixar sua marca como uma ferida. Ela não tem a menor vergonha de invadir a privacidade do casal e nem de demonstrar desgosto pela anfitriã, exigindo uma atuação despudorada que caiu como uma luva para quem já fez a melhor Mulher-Gato do cinema.

22. Charlize Theron – Mad Max: Estrada da Fúria

Personagem: Imperator Furiosa
O quarto filme da franquia "Mad Max", "Estrada da Fúria" (2015), é um dos mais celebrados filmes de ação de todos os tempos. Particularmente, nunca fui grande fã desse videogame gigante que é impossível passar de fase, contudo, se há uma qualidade incontestável no longa é a Furiosa de Charlize Theron. Muito me espanta a atriz não ter sido indicada às principais premiações quando é a verdadeira protagonista do filme e, óbvio, ser mais uma sensacional performance. A líder de uma rebelião feminista naquele laranja universo pós-apocalíptico é uma heroína para ninguém botar defeito.

21. Casey Affleck – Manchester À Beira Mar

Personagem: Lee Chandler
A vitória de Casey Affleck no Oscar por "Manchester À Beira Mar" (2016) recebeu bastante críticas pelas acusações contra o ator, não pelo seu trabalho no filme. É o secular debate sobre "vida pessoal X vida artística", que jamais terá uma resposta definitiva. Um fato é: Lee Chandler é executado brilhantemente. Se no início demoramos a entender os porquês do personagem agir da forma como ele age, todas as peças vão se encaixando e Lee vai afundando cada vez mais pelas tragédias passadas. O que Affleck faz na cena da delegacia é fora desse mundo.

20. Robert Pattinson – O Farol

Personagem: Ephraim Winslow
Robert Pattinson ficou eternizado (ou amaldiçoado) pelo papel de Edward Cullen na saga "Crepúsculo". Não parecia que havia nada de substancial ali além de um rostinho bonito. Que delícia é ser provado o contrário. Quem ainda associa Pattinson com o vampiro que bilha no sol provavelmente não assistiu às inteligentes escolhas que ele fez nos últimos anos, mas nada que se aproxime de "O Farol" (2019). Pattinson incorpora uma persona tão complexa, desafiadora e que não tem pudores em cenas cruas e difíceis. Ele sua, sangra, vomita e goza de maneira animalesca. Não é exagero apontar sua performance de a melhor do seu currículo. Quem diria que, um dia, Cedrico Diggory seria digno de um Oscar.

19. Emma Suárez – As Filhas de Abril

Personagem: Abril
Uma garota de 17 anos descobre que está grávida e seu maior objetivo é manter a mãe o mais longe possível da notícia. Quando não há mais essa possibilidade, Abril, a mãe da garota, se mostra compreensiva e apta a ajudar no que puder, retrato de uma sororidade lindíssima entre aquelas mulheres. Pobre coitada da plateia que não tem ideia do abismo logo ali do lado, e poucas atuações conseguem impressionar tanto como a de Emma Suárez. é impossível explicar o motivo sem dar spoilers, mas essa é uma performance que resume a lógica "o amor de uma mãe não conhece limites".

18. Bradley Cooper – Nasce Uma Estrela

Personagem: Jackson Maine
Bradley Cooper já recebeu múltiplas indicações pela Academia, entretanto, nunca conseguiu ganhar meu apreço. É fato que sua competência é incontestável, mas nenhuma de suas atuações fazia com que eu caísse de amores, o que está devidamente mudado. Além de dirigir, Cooper traz o papel de sua carreira com o músico falido Jackson Maine na quarta versão de "Nasce Uma Estrela" (2018). Virando o real protagonista do filme, ao contrário dos longas anteriores, Cooper, mesmo contracenando com Lady Gaga, em momento nenhum deixa a cena ser assaltada, mergulhando de cabeça nos vários demônios de seu personagem, colocando em xeque temas como vícios e problemas psicológicos - e cantando muito. Sua derrocada no Oscar será uma daquelas decisões que a Academia se arrependerá no futuro.

17. Rooney Mara – Os Homens Que Não Amavam as Mulheres

Personagem: Lisbeth Salander
Infelizmente, "Os Homens Que Não Amavam as Mulheres" (2011) é a única adaptação (decente) da fantástica saga "Millennium" (há versões suecas que, confesso, não estão à altura dos livros). Pelo menos tivemos Rooney Mara aniquilando como Lisbeth. Antissocial e sociopata, Lisbeth usa sua extrema inteligência para combater o crime e o impacto só é efetivo graças à entrega de Mara. Mesmo tão pequena e esquálida, Mara é uma gigante nesse filme de super-herói feminista.

16. Sally Hawkins – A Forma da Água

Personagem: Elisa Esposito
Talento é quando uma atriz exala suas emoções apenas com o olhar. E quando uma personagem não oraliza durante o longa inteiro? Esse foi o desafio de Sally Hawkins em "A Forma da Água" (2017). Com exceção de uma pequena cena, a atriz não emite uma palavra sequer ao interpretar uma mulher muda que se apaixona por um homem-anfíbio. Com uma língua de sinais sem defeitos, é sobrenatural como ela gera sentimentos para a plateia e desenvolve um dos romances mais estranhos já vistos no cinema. Sua doçura e ânsia de viver aquela aventura são narcotizantes, entregando todo o seu corpo à uma heroína que não precisa de palavras para salvar o dia.

15. Mads Mikkelsen – A Caça

Personagem: Lucas
Um professor do ensino infantil é acusado por uma garotinha de abusá-la. O público sabe de sua inocência, com o caso sendo um completo mal entendido, mas o bastante para sentenciá-lo diante dos olhos públicos. "A Caça" (2012) é a união magistral de todos os elementos que fazem o cinema ser uma arte tão devastadora quando Mikkelsen, numa atuação contida, mas poderosíssima, desenvolve um personagem impressionante, tridimensional e de fácil empatia, que lhe rendeu o prêmio de “Melhor Ator” no Festival de Cannes 2012. É uma dor a cena da imagem acima, quando ele encara com ódio aqueles que o injustamente acusaram.

14. Cate Blanchett – Carol

Personagem: Carol Aird
Importante como tema, como relevância social e como feito artístico, "Carol" (2015) um dos maiores romances lésbicos já desenvolvidos na Sétima Arte, e a performance de Cate Blanchett como a personagem título está aí para provar. Como uma mulher de meia idade que se vê entre o casamento em ruínas e o romance com uma jovem fotógrafa, Blanchett está lotada de requinte à la Hollywood de Ouro. Tendo que se conter diante de uma sociedade que a proíbe de amar uma pessoa do mesmo sexo, a já duas vezes vencedora do Oscar - e poderia tranquilamente ter saído com mais um - é perfeita quando vive uma mulher que tem tudo a perder, mas escolhe não perder quem ama.

13. J.K. Simmons – Whiplash

Personagem: Terence Fletcher
J.K. Simmons tem um largo repertório em sua carreira, porém, tirando o divertidíssimo J. Jonah Jameson da saga (original) “Homem-Aranha”, nunca havia reparado tanto no ator - até a destruição que é "Whiplash" (2014). Seu Terence Fletcher, um maestro dedicado a arrancar na porrada o talento de seus alunos, é assustador, conseguindo manipular o público facilmente: ora o amamos, segundos depois o odiamos e queremos pular em seu pescoço. Seja em momentos em que ganha a cena no grito ou em situações onde basta um olhar para aniquilar a sequência, Simmons recebeu aclamação absoluta pelo papel, ganhando todos os principais prêmios de atuação na temporada.

12. Tilda Swinton – Amantes Eternos

Personagem: Eve
Tilda Swinton. O que ainda falar de Tilda Swinton? Um verdadeiro camaleão, a atriz consegue interpretar absolutamente todos os tipos de papéis, vide a versatilidade de sua carreira, indo de filmes indies até blockbusters. Em "Amantes Eternos" (2013), ela é Eve, uma vampira secular e amante de Adam, seu parceiro pela eternidade. Sim, os dois são Adão e Eva, e o filme de forma sagaz se utiliza das figuras bíblicas como vampiros; Swinton só enriquece com essas características e está narcotizante e envolvente como a criatura imortal e cult que assiste com pesar os seres humanos destruírem o planeta que ela há tanto tempo conhece. E ela ama Jack White.

11. Emmanuelle Riva – Amor

Personagem: Anne Laurent
O maior assalto da história recente do Oscar foi quando Emmanuelle Riva perdeu o Oscar pela monstruosa atuação em "Amor" (2012). Após sofrer um infarto, Anne Laurent cai em um abismo físico e mental impressionantemente executado por Riva, mesmo com 85 anos de idade. Não existem barreiras para a atriz, apenas uma dor gritante em sua atuação, conduzida por caminhos aterradores que são sempre justificados pelo sentimento que dá nome ao filme.

10. Naomie Harris – Moonlight

Personagem: Paula
Um dos maiores filmes do século, primeiro vencedor do Oscar de "Melhor Filme" com temática LGBT e 100% atuado por negros, um marco histórico. As honrarias de "Moonlight" (2016) são várias. Em seu corpo de atores, só gigantes. Mas Naomie Harris, como a abusiva mãe do protagonista, é a cereja do bolo. O reflexo da marginalização absoluta, Harris carrega a história de tantas mulheres negligenciadas pelo sistema, e todas as suas cenas são deslumbrantes, mesmo revoltantes e cruelmente reais.

9. Adèle Exarchopoulos – Azul é a Cor Mais Quente

Personagem: Adèle
"Azul é a Cor Mais Quente" (2013) é um dos melhores (e mais controversos) filmes LGBTs, e muito se deve à Adèle Exarchopoulos. Com uma personagem compartilhando seu nome, Adèle (a personagem) é uma estudante que, confusa com sua sexualidade, vê a resposta definitiva quando conhece uma garota de cabelos azuis. A partir daí, Adèle (a atriz) escancara as portas e atua à flor da pele - às vezes até demais - nesse papel que demanda tanta carga física e emocional, embarcando nesse coming of age íntimo que põe o espectador do lado do florescimento do amor de sua protagonista.

8. Amy Adams – Animais Noturnos

Personagem: Susan Morrow
Amy Adams tirou a década para conquistar o mundo. Aclamada em alguns casos, injustiçada por outros, a atriz tem algumas das melhores atuações da década, encontrando em "Animais Noturnos" (2016) sua apoteose. Susan é rica e bem sucedida artista, mas vive infeliz. Seu marido descaradamente a trai e ela se culpa pelo fracasso de um antigo relacionamento, até que o ex a envia um livro, baseado na vida dos dois. A história joga Susan em uma espiral de sensações e Adams é sublime com sua depressiva personagem, que ganha um novo sentido com a chegada do livro. A corrida expressa em seu rosto nos minutos finais, quando percebe o que o livro representa, é uma masterclass.

7. Willem Dafoe – O Farol

Personagem: Thomas Wake
Escolhendo entre a vasta e incrível filmografia de Willem Dafoe, que anda se superando, "O Farol" (2019) é o encapsulamento ideal para demonstrar o seu talento. Na pele de Thomas Wake, um ex-marinheiro em pleno séc. XIX, Dafoe está irretocável. Seus monólogos shakespearianos, sejam com sussurros ou berros, ecoam diretamente nos ossos de quem o assiste, uma entidade com tamanho poder que é quase palpável. Dentro da atmosfera do filme, Dafoe vira sobrenatural.

6. Frances McDormand – Três Anúncios Para Um Crime

Personagem: Mildred Hayes
Frances McDormand é uma das poucas pessoas a terem a tríplice coroa da atuação: venceu os principais prêmios do cinema, televisão e teatro. O motivo? "Três Anúncios Para um Crime" (2017) consegue explicar facilmente. Ácida e dura como pedra, a personagem em busca de justiça deixa ninguém vê-la suando - principalmente se esse alguém for um homem. Seja em momentos onde ela manda todo mundo calar a boca ou até mesmo dando apenas uma encarada para gelar o sangue, é vibrante seguir seus passos através do filme. As dualidades da mãe de luto são orquestradas sem esforço por Frances, uma vencedora incontestável do Oscar.

5. Brooklynn Prince – Projeto Flórida

Personagem: Moonee
Quem diria que uma das mais surreais estreias no cinema seria de uma menininha de sete anos? Brooklynn Prince dá uma verdadeira aula de atuação em "Projeto Flórida" (2017), passando verdade em absolutamente todas as cenas - o elenco infantil consegue transmitir dúvida na plateia, que chega a se perguntar "será que eles estão interpretando eles mesmos?". A pequena facilmente poderia ter sido indicada ao Oscar de "Melhor Atriz" ao guiar e dar todo o encantamento gerado a partir da ótica das crianças diante de toda a precariedade em que vivem.

4. Rosamund Pike – Garota Exemplar

Personagem: Amy Elliott
No aniversário de cinco anos do casamento de Amy e Nick, a esposa desaparece. Claro, todas as suspeitas recaem em cima do marido, principalmente por haver sinais de violência na casa - ele, no entanto, jura veementemente que é inocente. "Garota Exemplar" (2014) tem uma estrutura não-linear, indo e vindo entre passado e futuro, e, quando estamos tendo visão dos fatos pelos olhos de Amy, Rosamund Pike finca seu nome na história quando tira do papel uma das personagens mais criativas da história. Seu desenvolvimento é uma viagem alucinante e fantástica, capaz de deixar o queixo da plateia no chão.

3. Natalie Portman – Cisne Negro

Personagem: Nina Sayers
Muita controversa foi gerada quando Natalie Portman venceu o Oscar por "Cisne Negro" (2010): ela foi bastante ovacionada pelas sequências de dança, mas algumas foram feitas com uma dublê. Contudo, o que faz sua Nina Sayers tão lendária é a carga dramática extraída por Portman, as danças (algumas, sim, realizadas pela atriz) são um bônus. O binarismo do cisne branco virginal com o sexy cisne negro é executado fabulosamente por Portman, hipnótica em todos os quadros. Em certo momento, Nina fala que sentiu a perfeição, e o diálogo pode ser proferido, também, pela boca da atriz.

2. Olivia Colman – A Favorita

Personagem: Rainha Anne
Colman é uma das melhores atrizes da atualidade, no entanto, ainda não possui o reconhecimento que merece - ela tem um papel bem pequeno em "O Lagosta", roubando todas as cenas em que põe o pé; e está uma delícia na série "Fleabag" -, mas a situação deu uma virada quando a britânica venceu o Oscar por "A Favorita" (2018), papel que, aliás, lhe rendeu todos os prêmios que estiveram pela frente, cada um deles infinitamente merecidos. Anne é hilariamente instável e pueril quando grita coisas irrisórias e se afogando em todo o seu poder, e, mesmo que o filme não fosse tão genial como é, valeria a pena só para ver Colman aniquilar em cena.

1. Toni Collette – Hereditário

Personagem: Annie Graham
E a melhor atuação da década ano é, com louvor, de Toni Collette. Indicada ao Oscar pelo clássico "O Sexto Sentido", a atriz, tão subestimada, está abrindo as portas do Inferno na tela de "Hereditário" (2018). Por ser o elo fundamental da malfadada família, Collette tem que - e consegue - entregar todas as nuances dificílimas que o roteiro demanda, desde os momentos de pura dor até o medo mais genuíno possível. O elenco inteiro, mesmo sensacional, desaparece quando Collette pisa o pé no ecrã, que entrega a atuação de sua carreira. I. AM. YOUR. MOTHER.

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