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Editorial: Wanessa Camargo não fará música sertaneja por amor, mas, sim, porque dá dinheiro

A música sertaneja é um dos maiores monstros do mercado fonográfico brasileiro. E isso dá muito dinheiro.
A música sertaneja é, sem dúvidas, um dos maiores monstros da indústria fonográfica no Brasil e isso dá muito dinheiro. O gênero, ainda que extremamente segmentado, não concorre com os outros quando o assunto é estar em alta e, enquanto temos tendências momentâneas do funk, pop, rock, samba, entre outros, sabemos que sempre haverá um grande nome sertanejo nas rádios, gostemos ou não.

Uma boa forma de compreender a força desse gênero no Brasil, é relembrar o triste episódio de falecimento do Cristiano Araújo. No dia em que ele se tornou notícia, a imprensa alardeava seus números exuberantes, com recordes de plateias, acessos e vendas, e lidava com um público que simplesmente não fazia ideia de quem era o tão famoso sertanejo. Isso não descartava a sua fama ou valor enquanto artista revelação, mas exemplificava bem o fato desse meio ter um público tão cativo quanto específico, que independe dos sucessos que ultrapassam essas fronteiras, enfim ganhando a grande mídia e um espaço naquela novela daquela emissora ou naquele programa de auditório daquele apresentador.

Dando uma rápida olhada em paradas como os mais acessados da plataforma Vevo, por exemplo, a música sertaneja se mostra forte outra vez, com artistas como a dupla Matheus & Kauan superando os sucessos de Rihanna, Fifth Harmony, Taylor Swift, Justin Bieber e outros nomes fortes lá fora, e quanto mais nos aprofundamos, maiores ficam os números.


Um recente acontecimento que ultrapassou as fronteiras do nicho sertanejo foi a cantora Marília Mendonça. Desconhecida até alguns meses, ela se tornou uma das artistas mais ouvidas pelo Youtube no Brasil, a frente de outras concorrentes de peso internacionais, como Adele, Ariana Grande e, mais uma vez, Taylor Swift. Seu trabalho, entretanto, evidencia outra prática que parece funcionar bem com a música sertaneja, visto que ela foi uma artista preparada há anos, escrevendo para outros que cresceram enquanto ela esperava o seu momento, como Lucas Lucco, Jorge & Matheus e Henrique & Juliano.


Em algum momento, todos esses números são convertidos em retorno financeiro e, no fim das contas, a conclusão não pode ser outra, além do fato de que ninguém pode contra a música sertaneja. E a Wanessa entendeu isso.


Filha do Zezé di Camargo, que é um dos pioneiros da música sertaneja, a cantora brasileira já se aventurou por muitos gêneros e, nos últimos anos, parecia ter se encontrado na música pop, ganhando certa notoriedade pelo meio eletrônico, no qual lançou o disco “DNA” (2011), além de suas versões ao vivo e em DVD, com singles como “Worth It”, “Sticky Dough” e sua faixa-título, “DNA”, mas conforme o tempo passou, Wanessa não só perdeu o timing, mas o andar da carruagem como um todo, se prendendo em um segmento muito específico e pouco rentável, enquanto via o pop brasileiro crescer por outras vielas.


Hoje, cinco anos após o lançamento do seu álbum pop em inglês, a cantora ainda tem o reconhecimento entre seus fãs mais fieis, bem como o respeito de cantoras que acreditam ter entrado por portas abertas por ela, mas já não possui a mesma relevância de outrora e muito menos peso para brigar com nomes como a Anitta, que dominou um cenário pop até então inexistente, se mostrando um nome em potencial para alavancar de vez a nossa música no gênero – e em português. De forma que ela tinha poucas opções: se arriscar, com chances de passar vergonha como a última tentativa radiofônica da Kelly Key, ou apelar para uma zona de conforto. E é claro que ela escolheu a última opção.

Mesmo quando era uma cantora pop, Wanessa não conseguiu imprimir uma identidade única. Suas músicas eram claramente inspiradas na música internacional e, de certo, isso não é um problema, mas suas inspirações pendiam para um genérico vazio, sem nada a acrescentar, e, na maioria das vezes, confuso quanto ao lugar que ela pretendia chegar. Para exemplificar isso, podemos falar sobre o pop-dark-pós-Gaga de “Murder”, do álbum “DNA”, e a funk-inspirada “Sticky Dough”, que foi um dos seus poucos acertos no gênero (se ignorarmos a atuação vergonhosa do seu clipe, é claro).

Por mais duvidosa que fosse a sua qualidade, bem como inspirações, Wanessa chegou perto do que víamos lá fora com artistas como Jennifer Lopez e, levando em consideração que a música pop praticamente já não existia no Brasil, enquanto os EUA tinham, nessa época, sucessos de Britney Spears, Lady Gaga, Katy Perry, Kesha e Rihanna nas rádios, o público se conformou bem com o que tinha em mãos e, tão disposta a atirar pra todos os lados, Wanessa abraçou esse mercado – que a manteve por um bom tempo.

Corta pra 2016.

Wanessa adota o sobrenome “Camargo” outra vez e fala sobre compor em português para o seu próximo trabalho. Os fãs cogitam que seja esse o momento em que ela entra para a briga pelas rádios brasileiras, se tornando o primeiro nome grande o suficiente para disputar o topo com a Anitta, que hoje não compete diretamente com ninguém. Sedentos pelo crescimento dessa indústria no Brasil, que ainda não possui uma variedade significativa de artistas pop, alimentamos certas expectativas quanto ao retorno. E ele acontece, mas não como esperávamos.

Se esquivando por completo desse meio, Camargo confirma: “Estou voltando às minhas raízes sertanejas”. E explica que o tipo de música que ela investia não combina com o nosso idioma e que “não é a sua praia”. Segundo a cantora, seu trabalho sempre foi uma mistura de muitos gêneros e, assim como Lady Gaga tocava piano desde os 13 anos, garante que um dos seus maiores sucessos em português, “O Amor Não Deixa”, era uma música sertaneja.



O seu single de retorno, revelado nessa semana, se chama “Coração Embriagado” e, ciente de que networking é algo crucial na música sertaneja, Wanessa Camargo já começou a construir novas amizades, como a dupla Maiara e Maraísa, que será uma das colaborações da brasileira em seu novo trabalho. Nesta nova fase, ela fala muito sobre isso ser algo que ela acredita, ama, se identifica, etc, etc. E isso é lindo – mas seria mais ainda, se fosse verdade. Mas se tem algo que essa sua mudança de rumo prova, é que ela permanece sem identidade nenhuma, se jogando numa tentativa preguiçosa e desesperada de sucesso fácil, embora inteligente, já que, na música pop, ela dificilmente teria outra vez. 

Valeu a tentativa, Wanessa Camargo.
disqus, portalitpop-1

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