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Crítica: “O Primeiro Homem” é um pequeno passo para Chazelle e menor ainda para o Cinema

Damien Chazelle está no ápice da sua carreira. Cineasta mais jovem a vencer o Oscar de "Melhor Direção", o norte-americano soltou duas obras-primas seguidas: "Whiplash: Em Busca da Perfeição" (2014) e "La La Land: Cantando Estações" (2016), todas vencedoras de múltiplos prêmios da Academia. O que ambos possuem em comum? São trabalhos verdadeiramente autorais e que possuem traços de um cinema genuíno, no caso, a relação pessoal de seus personagens com o jazz.

Até mesmo o primeiro e independente longa do diretor, "Guy & Madeline em um Banco da Praça" (2009) repetia a ligação com o jazz, paixão de Chazelle - o conjunto formava um todo, uma filmografia identificável. Foi então que surgiu "O Primeiro Homem" (First Man), sua nova obra, quebrando completamente o padrão. Dessa vez Chazelle nos leva à Lua, explorando a missão Apollo 11, que colocou Neil Armstrong (Ryan Gosling) no nosso satélite.


"O Primeiro Homem" é um efeito cada vez mais comum dentro de Hollywood: quando um cineasta alcança sucesso dentro do seu próprio cinema e é fisgado por grandes estúdios para dirigir obras comerciais. James Wan, conhecido dentro do terror por "Jogos Mortais" (2004), foi parar em "Velozes & Furiosos 7" (2015) e "Aquaman" (2018). Denis Villeneuve saiu de "Incêndios" (2010) e "O Homem Duplicado" (2013) para "Blade Runner 2049" (2017). O brasileiro José Padilha deixou "Ônibus 174" (2002) e "Tropa de Elite" (2007) para dirigir "RoboCop" (2014). Os exemplos não param.

Essa caminhada é algo natural, afinal, quanto maior a produção, maior o salário do diretor, todavia, confesso que acho o efeito uma perda quase irreparável. O dinheiro move o Cinema, arte com intuito comercial, porém é lamentável quando um diretor tão característico se "vende" e perde seu toque para embarcar em películas cada vez maiores e cada vez menos "sua cara". Claro que existem exceções - Yorgos Lanthimos saiu da Grécia para os grandes estúdios e permanece tão original quanto -, mas é um entre vários.


E foi isso que aconteceu com Chazelle: "O Primeiro Homem" é um filme sem personalidade. A direção é completamente genérica, sem jamais gritar autenticidade. Não que ele tenha feito um trabalho ruim, no entanto, o longa soa como um projeto que outro nome poderia fazer da mesma maneira. E, para um diretor não marcante, é uma pena.

Mas entremos de vez nos meandros de "O Primeiro Homem"; o filme faz parte da nova leva de produções a explorarem o espaço. Há três pilares fundamentais neste subgênero ao longo da história do Cinema: "Viagem à Lua" (1902), "2001: Uma Odisseia no Espaço" (1968) e "Gravidade" (2013). Cada um deles foi seminal em sua época para nossa fantasia espacial - até "2001", o homem não havia ido à Lua -, com "Gravidade" sendo uma revolução na contemporaneidade e fincando o nicho dentro da indústria. De lá pra cá, estamos cada vez mais saindo da órbita terrestre: do pretensioso "Interestelar" (2014) ao suspense "Vida" (2017).

Por se tratar de uma cinebiografia, "O Primeiro Homem" não possui tanta liberdade criativa no que tange os rumos de sua história, o que faz o roteiro de Josh Singer ser abusadamente burocrático. O roteirista é especialista em textos complexos, já vencendo o Oscar por "Spotlight: Segredos Revelados" (2015) e escrevendo o também atribulado "The Post: Guerra Secreta" (2017), um estilo que não se deu bem dentro da proposta de "O Primeiro Homem".


Durante a longuíssima projeção - para que 141 minutos? -, tudo o que eu pensava era como o roteiro do filme deveria ser como o de "Estrelas Além do Tempo" (2016). "Estrelas" e "Primeiro Homem" são filmes que se completam na linha cronológica dos acontecimentos que levaram o homem à Lua, então eles falam da mesmíssima coisa. Entretanto, "Estrelas" é esperto o suficiente para saber que toda a verborragia técnica é irrelevante para a plateia, diminuindo o nível de conhecimento sobre física e naves e foguetes, focando no drama. "Primeiro Homem" faz o oposto.

É interessante a obra explicar determinados conceitos ou passear por conversas técnicas? Bastante, pois além de educar o público, mostra que a produção se preocupa com o conteúdo. Contudo, "Primeiro Homem" leva isso a sério demais e coloca sequências intermináveis de discussões e luzes piscando e botões sendo apertados, que extingue a paciência. Se você não acompanhar milimetricamente o que está sendo posto na tela, pode se perder, e isso é um erro - ou alguém aí quer realmente entender as teorias físicas do que está rolando?

Com esse trajeto, a emoção do filme é tão fria quanto a superfície metálica daqueles foguetes. O roteiro até tenta introduzir carga dramática com a morte da filha de Armstrong ou a relação dele com a esposa, uma Claire Foy subutilizada, servindo de mero enfeite dentro da duração, mas não houve retrato familiar que colocasse uma gota de endorfina. "O Primeiro Homem" é apático como seu protagonista, um Ryan Gosling que esboça expressão nenhuma. Até mesmo em cenas que deveriam sugar emoção - o momento em que ele conta aos filhos que pode não voltar da missão -, nada acontece. É uma nave no piloto automático que não aterrissa.


A letargia é explícita quando o evento-chave - o pouso dos astronautas na Lua -, mesmo com a bela trilha sonora, desperta nada. Assim que Armstrong dá o primeiro passo na superfície lunar, lembrei imediatamente de um momento em "A Chegada" (2016): quando Louise toca na nave alienígena, a sequência é filmada em um fechado enquadramento, assim como em "O Primeiro Homem", só que o primeiro toque num objeto alienígena é avassalador, enquanto o pé na Lua evoca muito pouco. Um momento fantasioso e inventado supera o real.

Querendo contornar todos esses problemas, a montagem da fita é elétrica e com uma nervosa câmera de mão, que de nada adianta para acelerar o ritmo. O filme mais parece um grande videoclipe pela edição sem paciência e cenas durando segundos, possuindo vários cortes unidos para agilizar - em vão - a narrativa. Em meio a essa caótica montagem, a fotografia adota em alguns momentos o ponto de vista em primeira pessoa, entrando nos capacetes dos astronautas, a melhor escolha cinematográfica do filme, que deve em nada na parte técnica. Os efeito visuais, mixagem de som e design de produção são estonteantes - e devem arrematar alguns Oscars.

O destino de "O Primeiro Homem" é óbvio: será ovacionado por ser mais uma história da supremacia norte-americana na Sétima Arte, potencializado pelas características técnicas de primeira linha, todavia, se não abusa do patriotismo, deixa toda a emoção ser tragada por um buraco negro. São mais de duas horas de apatia e falta de personalidade, nesse pequeno passo para Damien Chazelle - e menor ainda para o Cinema. "O Primeiro Homem" não tem a diversão de "Gravidade", a tensão de "Vida" e a emoção de "A Chegada", servindo como uma aula de História em que o professor possui o conhecimento, mas não a didática.

Crítica: "La La Land" usa clichês românticos para discutir sobre o nosso amor pela arte

Indicado ao Oscar de:

- Melhor Filme *favorito*
- Melhor Direção *favorito*
- Melhor Ator (Ryan Gosling)
- Melhor Atriz (Emma Stone)
- Melhor Roteiro Original
- Melhor Fotografia *favorito*
- Melhor Direção de Arte
- Melhor Montagem *favorito*
- Melhor Figurino
- Melhor Trilha Sonora *favorito*
- Melhor Canção Original ("City of Stars") *favorito*
- Melhor Canção Original ("Audition [The Fools Who Dream]")
- Melhor Edição de Som *favorito*
- Melhor Mixagem de Som

“La La Land: Cantando Estações” é, sem sombra de dúvidas, o (futuro) vencedor do Oscar de “Melhor Filme” mais previsível dos últimos tempos. O longa vem fazendo um verdadeiro arrastão na temporada de premiações e só perde para “Moonlight: Sob a Luz do Luar”, seu maior concorrente, no número de prêmios conseguidos até agora. Depois de levar o maior prêmio em diversas premiações, de Satellite Awards, até Critics' Choice Awards e Globo de Ouro (neste, se tornou o filme mais premiado da história), o destino no pódio mais alto da 84ª edição do Oscar está bem evidente.

Esse fato é, por si só, um evento histórico: caso o favoritismo se comprove, “La La Land” será 11º musical na história e o segundo nesse século a levar pra casa o careca dourado de “Melhor Filme” – o último foi em 2003 com “Chicago”. Antes disso? “Oliver!” em 1969, 34 anos antes. E entre “Chicago” e “La La Land”, quantos musicais concorreram ao prêmio máximo? Apenas um, “Os Miseráveis” em 2013. O gênero está em baixa.

Mas nem sempre foi assim. Na Era Dourada de Hollywood, lá entre os anos 30 e 60, os musicais roubavam a cena nas telas do cinema. Com a nova arte em plena ascensão, o som revolucionou não só o fazer cinema como o assistir cinema, então a música foi elemento fundido à própria narrativa, criando os musicais, que atraiam multidões – e tudo começou com “O Cantor de Jazz” em 1927, o primeiro musical longa metragem.

O Jazz e a Broadway foram elementos indispensáveis para o advento do cinema musical, com peças e números em jazz sendo transpostos à tela. Já na segunda edição do Oscar, em 1929, um musical foi prestigiado com "Melhor Filme": "Melodia de Broadway". Todavia, nenhuma década foi tão preenchida com musicais no posto mais alto do Oscar como a década de 60; quatro filmes receberam a honraria: "Amor Sublime Amor" em 1962, "Minha Bela Dama" em 1964, "A Noviça Rebelde" em 1965 e "Oliver!" em 1969. Depois disso, como já sabemos, só em 2002.

Caso você esteja se perguntando “ué, cadê ‘Cantando na Chuva’?”, a resposta é simples (e trágica): o eleito melhor musical de todos os tempos (com bastante louvor) não foi indicado a “Melhor Filme” – na verdade ele concorreu apenas em duas categorias e perdeu ambas, uma mácula (das várias) que a premiação carrega até hoje. Além dele, há diversos outros musicais inesquecíveis que não puseram as mãos no Oscar de “Melhor Filme” (quando nem indicação receberam), como “O Mágico de Oz”, “Rocky Horror Picture Show”, “Grease: Nos Tempos da Brilhantina” e “Moulin Rouge: Amor em Vermelho”.

Imagem: Divulgação/Internet
Certo, mas o que essa aula de história tem a ver com “La La Land”? Tudo. Em primeiro lugar podemos perceber como os musicais são assimilados por públicos diferentes de formas diferentes em tempos diferentes. Atualmente é bastante usual vermos espectadores colocando os dois pés atrás quando um musical está diante dele – inclusive de frente ao próprio “La La Land”. Tá ganhando tanto prêmio? Nossa, quero ver. É musical? Aaaaah, não... Se é chato, se os números musicais são piegas, se a linguagem simplesmente não agrada, vai de cada um, porém, o número de musicais indicados a prêmios é um reflexo da assimilação do público: pouco interesse, pouca visibilidade.

É bastante interessante perceber que é exatamente sobre isso, a perda de interesse por uma expressão artística, que o filme finca seu eixo central. Sebastian (um carismático Ryan Gosling) é um pianista apaixonado por jazz que vê, dia após dia, sua arte morrer. Ele tenta arduamente sobreviver da música, porém, acaba confinado em restaurantes que mal pagam e que não dão o reconhecimento que ele espera. Seu sonho é ter o próprio clube de jazz e, literalmente, “salvar” o gênero.

Imagem: Divulgação/Internet
Do outro lado temos Mia (Emma Stone, em maravilhosa atuação), uma garçonete que sonha em seguir os passos da tia e ser atriz. Ela, ironicamente, atende num café ao lado dos estúdios da Warner, em Hollywood, e vê estrelas passarem o dia todo enquanto ela deseja estar do outro lado da rua. E Mia é a apoteose do clichê hollywoodiano “bad luck vibe”: tudo de errado acontece na vida da garota. É desde café sendo derramado na sua camiseta momentos antes de um grande (e malfadado) teste até a tela quebrada do seu celular. Mais gente como a gente que isso, impossível.

Antes de conhecermos nossos protagonistas, o longa começa com um travelling onde vemos vários carros num engarrafamento. Em cada um, podemos ouvir diversos gêneros musicais, como pop, hip-hop e rap. Enquanto a câmera passeia entre essa diferença gritante, somos jogados num enorme número musical onde, depois de ouvirem músicas diferentes, todos os passageiros passam a cantar uma só música ("Another Day of Sun"). A sequência, filmada inteiramente sem cortes e em locação, é a abertura perfeita para dar todo o tom da obra, tanto musical como visualmente: muita cor, luz, vibração e euforia. Você imediatamente sabe o que vai esperar.

Imagem: Divulgação/Internet
Além dessa expectativa em torno do estilo narrativo do longa empregado pela cena de abertura, é extremamente evidente o formado clichê e batidíssimo que envolve o casal protagonista, que começa se detestando, trocando farpas, dizendo em alto e em bom som que jamais se apaixonariam um pelo outro até o evidente momento em que ambos devem deixar o orgulho de lado para se entregarem de vez. O roteiro não esconde essas obviedades, o que, nas mãos de outra produção, seria uma típica comédia romântica que tanto são exibidas na Sessão da Tarde, todavia, “La La Land”, assim como as obviedades narrativas presente em “Demônio de Neon”, são usadas ao seu próprio favor, fazendo com que o espectador deposite sua atenção aos outros aspectos da obra.

Pulando todas as dificuldades indulgentes impostas pelo casal até o momento em que se apaixonam – representado de forma criativa pela cena onde Mia deixa de ouvir as pessoas para ouvir o jazz da música ambiente –, o filme não é exatamente sobre o romance dos dois, e sim, sobre a paixão avassaladora que cada um tem pela sua arte e como isso reflete nas suas próprias vidas – eles são vetores desses amores culturais. Mia, apaixonada por cinema e teatro, tem um universo mega colorido, com cartazes espalhados por seu apartamento; enquanto Sebastian, amante da música e do jazz, vive num mundo sóbrio e desprovido de cor.

Imagem: Divulgação/Internet
Mesmo com tais diferenças, próprias das múltiplas diferenças de personalidades humanas, “La La Land” é um retrato do amor pela arte, seja ela qual for. Sebastian e Mia se apaixonam enquanto suas artes florescem, pondo em discussão o consumo da própria arte. De um lado, Sebastian vê seu jazz morrer, enquanto Mia passa pelo cinema que exibia clássicos, agora fechado. Por que tais expressões artísticas são deixadas de lado? Vale a pena investir nelas?

Enquanto dialogam entre si, os personagens são porta-vozes do próprio filme, que joga tais perguntas para o espectador. É claro que o molde em que “La La Land” se encaixa é bastante comercial, ou seja, com grande apelo do público, mas o fato de ser um musical acaba cerceando o interesse. Utilizando-se da metalinguagem, a fita é questionadora sobre sua própria existência e de tantas artes consideradas “menores” ou até “cults”, com faixa de público bem mais reduzida.

Imagem: Divulgação/Internet
Porém, mesmo com quais pensamentos até pessimistas, o longa não abre mão de provar de diversas formas que, sim, vale muito a pena amar tudo isso. Na sequência musical mais incrível do filme, “Audition (The Fools Who Dream)”, Mia canta com violenta paixão sobre os tolos amantes da arte, que fazem seus corações doer pela bagunça que fazem. "Um pouco de loucura é a chave para nos dar cores para enxergar. É por isso que eles precisam de nós". E o que nós, veneradores da sétima arte, somos além de malucos sonhadores que querem mudar o mundo através do cinema? Mia está ali cantando sobre quem está diante da tela, principalmente para aqueles que amam ver a vida pelas lentes do cinema.

Mesmo provido de tanta alegria, “La La Land” esbarra num ponto bastante complicado e que vem gerando discussões pelas representações sociais. Sebastian, um cara branco, tem como objetivo de vida salvar o jazz, ritmo criado por negros. No longa, todos os músicos, com exceção dele, são negros. Qual a justificativa, então, para o protagonista ser branco – principalmente quando sua missão de vida é salvar o jazz (por mais absurdo que isso soe)? 

Imagem: Divulgação/Internet
Essa discussão já tivemos várias vezes (recomendamos esse texto sobre a temática), com um protagonista branco sendo mais “vendável” que um negro, o que é preocupante – o que só possui amplitude maior quando estamos falando do favorito na categoria máxima da maior premiação do mundo. O filme consegue deixar essa missão sem nexo de lado, o que diminui a síndrome do "white savior" (o cara branco salvando algo da cultura negra), mesmo sendo, por si só, algo errado em pleno 2017, o que merece ser destacado e debatido.

Não, “La La Land” não é o melhor filme do ano (“Moonlight: Sob a Luz do Luar” é mais certo para esse título), no entanto, é uma obra puramente cinematográfica. Não só pelas sequências musicais filmadas sem cortes com explosões de cores, mas também por ser um manifesto de amor à sétima arte e às várias que ela abrange. Além disso, em subtextos do roteiro bastante elementar, o longa é um sincero (até demais) conto sobre a perseguição de nossos sonhos e do encontro do amor perfeito, e como esses dois rumos podem acabar colidindo. O que mais vale a pena? A resposta, aqui, é incrível - mesmo que “La La Land” arranque seu coração e pise em cima.

"La La Land" é um filme belíssimo que faz uma grande homenagem ao cinema clássico de Hollywood

Conquistando buzz desde sua divulgação prévia, por tratar-se de um musical original com elenco de renome, "La La Land: Cantando Estações" (2016), filme de Damien Chazelle (diretor de "Whiplash" [2014] e roteirista de "Rua Cloverfield, 10" [2016]), tem divido bastante o público. Notório em seu patamar de "produção nostálgica", que enaltece o cinema clássico de Hollywood (um molde muito em voga nos 1950), o filme vem angariando prêmios e aplausos por onde passa, quebrando recordes no Globo de Ouro 2017 e sendo indicado como uma das principais apostas ao Oscar. 

A história de "La La Land" é, assim como seu título, simples. Mia (Emma Stone) é uma aspirante a atriz frustrada que ama cinema clássico; Sebastian (Ryan Gosling), por sua vez, é um pianista desempregado apaixonado por free jazz. Ambos se conhecem, se apaixonam e passam a acompanhar as conquistas e derrotas um do outro. O que há de tão espetacular que faça o filme se destacar, então? A dualidade entre sonho e realidade que seus carismáticos protagonistas vivenciam. 

Mia e Sebastian são tão tridimensionais quanto qualquer um de nós; são críveis, empáticos. Jovens adultos cujo a chama sonhadora resquício de um impulso artístico, seja do cinema hollywoodiano clássico ou da música como forma de expressão criativa e social — persiste, acima de qualquer decepção que a dura vida apresente. Uma temática de esperança já apresentada no número de abertura "Another Day of Sun" ("Quando te decepcionarem / Você levantará do chão / O amanhecer estará ao seu redor / É outro dia de Sol"), que inclusive cita cinema Technicolor, e que atinge ápice na belíssima canção "Audition (The Fools Who Dream)" ("Tragam os rebeldes / as ondas de cristais / Os pintores, os poetas e as peças / Um brinde aos tolos que sonham / Tão loucos quanto parecem / Um brinde aos corações que se partem / Um brinde à bagunça que criamos"). É uma história movida por paixão, sobre paixão, e que atinge em cheio o emocional de seus espectadores que sonham (frustrados ou não).

Damien Chazelle construiu isto brilhantemente em seu roteiro, escolhendo um gênero cinematográfico tão marcado por "sequências de sonho" na era dourada de Hollywood, e que hoje resiste graças à seu público apaixonado. Em um dos principais diálogos, por exemplo, é perfeitamente notável o paralelismo existente entre o jazz e os filmes musicais, ambos supostamente "enterrados" pela modernidade, mas que persistem com grande potencial de adaptação.

A composição visual de "La La Land" está entre seus principais méritos. A fotografia, com muitas cores vivas e saturadas, não só homenageia os cenários em Technicolor dos principais musicais clássicos, mas também faz utilização sensacional da psicodinâmica das cores e constrói sequências belíssimas com um ótimo uso de contraste e iluminação (ferramenta por vezes utilizada no longa-metragem para destacar seus protagonistas). A abertura conta com uma ótima referência ao uso de Cinemascope, e os movimentos de câmera são quase coreografados como passos de dança, em uma decisão arriscada, mas que traz uma prazerosa dinamicidade (talvez inovadora) ao espectador.

Os números musicais são, certamente, ótimos. A coreografia de Mandy Moore (não é a atriz!) evoca muitas referências à musicais como "Cantando na Chuva" (1952) e "Amor Sublime Amor" (1961), principalmente durante as cenas de sapateado. A trilha sonora, composta por Justin Hurwitz, já parceiro do diretor em suas produções, é outro grande destaque positivo, com composições que exploram muito bem o instrumental e que são revisitadas durante todo o filme. As músicas da dupla Benj Pasek e Justin Paul, responsáveis pelo recente musical da Broadway "Dear Evan Hansen" (estrelado por Ben Platt, o Benji da franquia "A Escolha Perfeita") e alguns hits do seriado da NBC "Smash", são muito bem aproveitadas, principalmente no primeiro ato da produção, sendo responsáveis por parte do sentimento positivo que cerca "La La Land". A respeito de "City of Stars", só me resta dizer o óbvio: uma das favoritas ao Oscar de Melhor Canção Original.  

Sob a competente direção de Damien Chazelle e a química entre o casal protagonista (cujas atuações agradam), "La La Land" é um filme belo e bem realizado; cinema na sua forma mais pura e simples de contar histórias, que agracia a "fábrica de sonhos" californiana e emociona (e muito) com seu discurso esperançoso sobre sonhos. Uma ode aos musicais, com um final triunfante que convida à reflexão sobre decisões e a realidade natural da vida. "Um brinde aos tolos que sonham".

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