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"Aquarius" nos mostra que podemos lutar pelo que é nosso


Após uma estrondosa campanha em festivais internacionais, angariando prêmios, elogios, e claro, muitas polêmicas, chega aos cinemas nacionais (obviamente em circuito limitado) o aguardado “Aquarius”, do diretor Kleber Mendonça Filho.

Logo no início, o burburinho geral foi causado devido ao protesto de todo o elenco no Festival de Cannes contra o impeachment. O elenco inundou o tapete vermelho do festival com cartazes com dizeres como “não há mais democracia no Brasil”, “o mundo não pode aceitar esse governo ilegítimo”, “houve um golpe de estado no Brasil”, entre outros.

Elenco de "Aquarius" protestando no Festival de Cannes. 

Dias antes de estrear no Brasil, outra polêmica aportou no horizonte, a classificação indicativa do filme foi elevada para 18 anos. Segundo o Ministério da Justiça, o filme continha uma “situação sexual complexa”.

Começou a surgir a alegação de retaliação da parte do Governo Temer contra o filme, devido sua relação com a situação política e manifestações contra o impeachment. Basicamente, ficou evidente que havia um ato de censura, já que um filme nacional com essa classificação afastaria boa parte da audiência.

Como forma de protesto, Anna Muylaert retirou “Mãe Só Há Uma” da lista de submissão dos filmes do Oscar, por não concordar com as diretrizes tomadas no processo de seleção dos candidatos. Foi tanto o barulho, que um dia antes da estréia a classificação foi baixada para 16 anos

Curiosamente, a história de “Aquarius” não nos entrega nenhuma referência política direta, mas a situação do filme é tão parecida com o que vivemos que é difícil não assimilar nenhuma analogia.

Vemos em “Aquarius” a vida de Clara, interpretada pela poderosa Sônia Braga em sua maior parte do tempo e pela talentosa Babara Colen no inicio do filme, retratando seu “eu” mais jovem. Duas atrizes que interpretam a mesma personagem com uma diferença de 30 anos, mas com uma sincronia perfeita. 

Aquarius é o nome do edifício em que Clara viveu toda sua vida. Foi ali aonde ela festejou, enfrentou um câncer, criou seus filhos e perdeu um marido. É em Aquarius que Clara reside, não é apenas seu lar, mas a representação física de sua história.

Entretanto, após anos vivendo no mesmo prédio, o avanço da cidade ameaça seu lar quando uma construtora planeja demolir o Aquarius e construir um novo condomínio residencial no mesmo local. Para concluir esse projeto, Diego, vivido por Humberto Carrão, precisa convencer Clara a vender seu apartamento.

Enquanto Clara resiste às investidas da construtora, uma guerra “passiva-agressiva” começa a ser travada dentro do prédio. Vemos Clara mostrar toda sua força e fraqueza em momentos tocantes e bem dirigidos do longa.

Enquanto o prólogo do filme é incrível e mostra na simplicidade das cenas o background da história de Clara, é no segundo ato em que a conhecemos melhor. No capítulo do filme intitulado “O Amor de Clara”, vemos Sônia Braga dar ares mais livres e leves para a personagem, num instante ela se mostra uma mãe frágil e em outro ela nos entrega uma verdadeira felina protetora. Já no capitulo final temos alguns confrontos entre Clara e Diego — aliás, tal personagem, foi até mesmo associado pelo diretor com a persona de Donald Trump.

É nesse ponto que vemos o maior e melhor discurso social do filme, quando Clara diz verdades a respeito dos egocêntricos de classe alta com frases como,  “você não tem caráter, aliás seu caráter é o dinheiro”. Propositalmente, Clara diz essas verdades de frente, como se olhando nos olhos da audiência no cinema, e percebemos que nesse momento a personagem está falando com aqueles sentados na sala assistindo ao filme, não com seu real ouvinte à sua frente.

“Aquarius” possui além de um roteiro excelente, e atuações impecáveis, uma qualidade técnica exemplar e inovadora para o nosso cinema. Indo de enquadramentos sufocantes até zooms exagerados, o diretor busca trabalhar de forma a transformar o filme em toda uma experiência.

Não podemos deixar passar a trilha sonora, que também é excelente e que, inclusive, já está disponível para ouvirmos no Spotify. A música, aliás, faz parte não só da vida da personagem como também é um elemento importante do filme, complementando a experiência visual.


Mas e a política? “Aquarius” não é um filme politico. Não há debate sobre partido, sobre direita ou esquerda. Mas o que temos é uma fábula moderna da nossa situação brasileira.

O Edifício Aquarius no filme é quase um ser vivo. Um personagem extra, com personalidade e que Clara luta para impedir que seja tomado. Clara resiste à ocupação com unhas e dentes, luta contra aqueles que querem tomar ilegitimamente seu lar. Ela se mostra frágil, quando na verdade possui uma voz poderosa.

Apesar da sessão se encerrar ao som de aplausos e gritos de “Fora Temer”, a mensagem que fica no final não é política, é de resistência. Da batalha do dia-a-dia que pode não ser ganha, mas que nunca podemos deixar de travá-la. O apego ao nostálgico é latente na história.

“Aquarius” nos mostra que podemos lutar pelo que é nosso, se apegar ao passado sem necessariamente repelir o futuro. Com tantas boas qualidades, aguardamos com o coração na mão que esse seja o aguardado filme que irá representar o Brasil nas indicações ao Oscar 2017.

Crítica: Qual é a do filme “Mãe Só Há Uma” e por que você deveria vê-lo?

Se em “Que Horas Ela Volta?” Anna Muylaert já havia surpreendido nos entregando um filme delicado, sensível e até mesmo polêmico, não podíamos esperar menos do seu seguinte trabalho, o tão aguardado, “Mãe Só Há Uma”.

O longa entrou em cartaz na última quinta (21/07) e apesar de chegar em circuito limitado, a tendência é que a distribuição vá crescendo com o passar das semanas. O sucesso gerado ano passado pelo filme anterior, e as excelentes críticas recebidas nos festivais internacionais, podem auxiliar nessa expansão.

O filme conta a história de um jovem que, aos 17 anos descobre ter sido roubado na maternidade e enquanto sua mãe passa pelo processo de prisão, ele se vê no início de uma relação com sua família biológica, membros da classe média alta, enquanto começa uma transição para sua verdadeira identidade.

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Alguém dê um prêmio de “Olhar Materno do Ano” para essa mulher.

O elenco do filme é maravilhoso, e temos Matheus Nachtergale e Dani Nefussi nos papéis dos pais biológicos do garoto, aliás, aqui temos uma sacada genial da diretora ao escolher a mesma atriz para realizar o papel tanto da mãe raptora, quanto da mãe biológica de Pierre. Por fim, o estreante Naomi Nero, que nos entrega uma atuação introspectiva e sincera do seu personagem. Naomi, apesar de protagonista, fala pouco, ele atua com olhares e movimentações e ainda assim consegue retratar muito bem seu personagem.

Aliás, quando pensamos no personagem de Pierre, é impossível não lembrar de Jéssica, outra maravilhosa personagem criada por Anna Muylaert. Ambos os personagens são jovens, colocados em situações de conflito envolvendo suas mães e uma classe social diferente da sua. Mas as semelhanças acabam aí, enquanto Jéssica diz na nossa cara tudo que pensa sobre qualquer coisa, não mede palavras e não se sente inferior à família dos patrões de sua mãe, Pierre já é muito mais quieto, calado e tímido, tanto que em várias situações as pessoas respondem por ele, ou ele acaba fazendo o que lhe pedem apenas para evitar conflito (ou porque ele simplesmente não se importa).

Engana-se quem pensa que devido à sua personalidade Pierre seja fraco, muito pelo contrário, ele enfrenta sua nova família de cabeça erguida quando o assunto se trata da sua identidade sexual.

“E tão dificil aceitar quem eu sou?” Pierre grita, quando tanto ele, quanto nós da audiência, já estamos explodindo de estresse por dentro, diante de tantas situações constrangedoras. 

GAROTO QUE GOSTA DE GAROTOS E BEIJA GAROTAS

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Pierre sendo quem ele quer ser logo nos primeiros cinco minutos de filme. 

Logo no início, já fica claro que Pierre não segue os padrões da “família tradicional brasileira”. Visual meio andrógeno. De lápis preto nos olhos, unhas pintadas, o personagem é introduzido com uma cena em que durante uma festa, dança sensualmente com outro rapaz , mas logo na sequência acaba tendo relações com uma garota. 

Conforme a história vai crescendo, e os conflitos familiares vão intensificando a personalidade de Pierre vai se desenvolvendo. As longas cenas em frente ao espelho, enquanto experimenta batons, e abusa de selfies e nudes (para o próprio prazer), é uma busca para encontrar seu verdadeiro eu em seu próprio reflexo. 

A diretora, que inseriu o enredo de identidade de gênero após já ter um roteiro evoluído, conta que a escolha do ator para interpretar Pierre, foi por ter visto em Naomi, não só uma sincera timidez mas também uma personalidade potente. Algo que vemos claramente durante a uma hora e meia de filme. O fato de Naomi ter uma irmã transgênero o ajudou bastante na construção do personagem.

O DISCURSO OUSADO DO FILME, E SUAS CONCLUSÕES

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Uma familia tradicional.

“Mãe Só Há Uma” é um daqueles filmes que não tem medo de afrontar. Temos uma história de conflitos familiares, uma discussão de classes sociais e por fim, uma tratativa sobre a questão de identidade de gênero. 

Seguindo o tema principal sobre o conflito familiar, o jovem desajustado proveniente de uma classe social baixa é visto no meio das regras do tradicionalismo da classe média. Aliás, a própria diretora já afirmou em entrevistas que os brasileiros de classes mais ricas tendem a ser conservadores e abusivos de seus privilégios, vide a cena da tentativa de fuga do condomínio fechado. 

O pai quer molda-lo da forma que deseja, e a mãe só pensa em mantê-lo sempre junto a si. Assim, Pierre vira um objeto na mão de seus pais biológicos, que sentem a necessidade de exibi-lo à todos como uma nova obra de arte adquirida. Entretanto, é impossível não se condoer com as caras e expressões extremamente apaixonadas feitas por Dani Nefussi, a admiração de uma mãe.

Anna Muylaert, trabalha bem também a questão da identidade de gênero do protagonista. Por vezes, a audiência que desconhece do assunto, pode ser levada à confusão diante das exibições da sexualidade do garoto. 

Esse ponto é importantíssimo no filme, pois deixa claro que quando se trata de identidade de gênero e afinidade sexual, as pessoas devem ser o que desejam. Sem restrições ou delimitações, qualquer um pode ser um garoto de vestido, que se sente mulher, mas beija outras garotas. 



Terminado o filme, sentimos que foi tudo curto de mais. A história poderia ser levada por mais algumas horas sem problemas, e assim as questões discutidas poderiam ser mais exploradas. Cruelmente sábio, o filme termina em um ponto que deixa mais pontos de interrogação do que respostas, e nos leva à discussões de horas após o filme. É o anticlimax perfeito. 

***

Mãe Só Há Uma” estreou na última quinta, 21, e está rodando pelos cinemas do Brasil. A página do Facebook do filme contém a relação de cinemas em que o filme está sendo exibido.


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