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Crítica: a bomba "O Paradoxo Cloverfield" comprova a maldição do selo "original Netflix"

⚠️ Atenção: a crítica contém material radioativo (o próprio filme) ⚠️
Por muitos anos, após o estrondoso sucesso de "Cloverfield - Monstro" (2008), houve o sentimento de que o longa deveria ser o pontapé para uma franquia, pois muita história ainda poderia sair daquela fonte - e essa fonte só viria a se tornar uma franquia em 2016, com o lançamento de "Rua Cloverfield, 10". Foi apenas um pulo para "O Paradoxo Cloverfield", novidade da Netflix que chegou na madrugada dessa segunda (5).

Mas há muito que se explicar antes de entrarmos de vez no terceiro segmento da franquia. Enquanto o primeiro era feito por meio do found-footage, o segundo seguia uma narrativa convencional, em terceira pessoa. Todos fomos pegos de surpresa pela diferença de estilo, principalmente quando "Rua" parecia ser um filme isolado - ele foi descrito como "sequência espirital" do primeiro: se passam ao mesmo tempo, porém em lugares e óticas diferentes.


"O Paradoxo Cloverfield" chega, após muitos adiamentos (e mudanças de nome - já foi "Partícula de Deus" e "Estação Cloverfield") através da Netflix, que lançou a obra de surpresa. O filme é um prequel da franquia, ou seja, se passa antes dos dois primeiros e tenta explicar de onde surgiu o Clover, o monstrinho que assombra a saga. A primeira grande quebra de estilo é que "Paradoxo" se passa quase inteiramente no espaço, dentro de uma nave. A trama acontece num futuro onde a crise de energia no planeta está cada vez mais grave e um grupo de cientistas é enviado para fora da órbita terrestre para realizar experimentos que possam resolver a crise.

Aqui já temos o primeiro problema. Se "Paradoxo" se passa num futuro e, simultaneamente, é um prequel de "Cloverfield", temos um furo na linha do tempo: o primeiro segmento se passa em 2008, como informa a fita logo no seu início, o que seria impossível para "Paradoxo" se passar no futuro e, ao mesmo tempo, antes de "Cloverfield" - e se a justificativa for viagens no tempo como "Paradoxo" sugere, a coisa fica ainda pior. Até mesmo se a data não fosse revelada, toda a tecnologia presente no novo longa é incongruente com a apresentada no original, que não mostra traços de crise elétrica. É certo que o novo plot nem era sonhado durante a produção do filme de 2008, porém erros como esses são descuidos elementares.


A trama é iniciada quando, depois de dois anos realizando testes, o acelerador de partículas finalmente funciona, mas também abre um rasgo na dimensão do tempo e espaço e joga a nave dos protagonistas em uma realidade paralela, onde a Terra está em guerra. O principal dilema no outro lado do rasgo cai sobre Ava Hamilton (Gugu Mbatha-Raw, a co-estrela de "San Jupitero"): em sua realidade, seus filhos são mortos graças a um acidente que ela se culpa, enquanto na realidade vizinha os filhos estão vivos. Deve ela então voltar ou permanecer onde as crias ainda respiram?

Como já notado, "Paradoxo" é um autêntico sci-fi. Há todo aquele bê-a-bá físico com conceitos de tempo, órbita, partículas, realidades paralelas e tudo mais - e de forma didática, você não precisa ter grandes conhecimentos físicos para sacar o que está se passando ali. É interessante ver que cada astronauta veio de um país diferente - tem um brasileiro! - e como o protagonismo está em mãos negras - o capitão da estação é Kiel - interpretado pelo sempre ótimo David Oyelowo. E também pudera, o diretor do filme, Julius Onah, é nigeriano, boa oportunidade para um cineasta negro estar à frente de um projeto tão grande - que ainda é produzido por J. J. Abrams, criador de "Lost". Pena que sua direção seja tão prejudicada pelo roteiro.


A impressão que "Paradoxo" passa é a mesma daqueles trabalhos de faculdade em que cada um faz sua parte e no final junta tudo e apresentam. Uma boa parte da fita possui o tom sério, até a cena do braço, onde o longa se transforma num pastelão digno de Filme B, quebrando completamente a lógica narrativa. Os diálogos então, são de dar pena - "O que é esse barulho na parede?" "Mas paredes não fazem barulhos" -, nada ajudados pelos personagens caricatos e motivações insípidas, num jogo onde os mesmos viram vilões e mocinhos num milésimo de segundo.

E foi revelado que o roteiro original da obra se tratava de um filme independente da franquia "Cloverfield". Ele só viria a se tornar o terceiro da linhagem após a compra dos direitos, e isso fica gritante durante a exibição. Tirando os momentos em que vemos o que está acontecendo na Terra, nada mais tem a mínima ligação com os dois filmes anteriores. O fato fica ainda pior quando os tais acontecimentos terrestres são absolutamente irrelevantes - a trama da garotinha serviu para nada - e explicados de maneira rasteira.



A moral da história é: "Paradoxo" é um prequel que veio para explicar os acontecimentos da saga e não explica. O Clover aparece no nosso planeta de maneira ilógica e o final é completamente irrisório. Essa é uma produção que literalmente serviu para nada dentro do universo "Cloverfield" e não funciona nem como sci-fi avulso - "Vida" (2017) tem uma premissa quase igual e funciona de maneira anos-luz mais satisfatória (trocadilho proposital), servindo de maneira cômica como um melhor prequel que "Paradoxo".

E se teve algo que "Prometheus" (2012) aprendeu é que você não pode fazer um revival de uma franquia e deixar de fora seu principal elemento: o Alien praticamente não aparece no filme, erro logo corrigido em "Alien: Covenant". Clover, nosso mascote favorito, está na tela por dois segundos dos 102 minutos da película, fazendo com que o expectador seja obrigado a se contentar com explosões toscas e dilemas intragáveis.

"O Paradoxo Cloverfield" vem para comprovar a maldição do selo "Original Netflix" no cinema: praticamente todos os filmes produzidos ou distribuídos pela plataforma são lamentáveis - até hoje sinto as queimaduras causadas pela radiação de "Death Note". "Paradoxo" não foi produzido pela gigante, apenas distribuído, porém é uma obra que emula todas as artimanhas no subgênero espaço + alienígena, servindo apenas para extinguir a paciência de sua plateia e entregando mais um capítulo tenebroso ao catálogo, que precisa urgentemente rever suas escolhas de compra, afinal, é o nome "Netflix" que vem à frente. Ter o selo "Cloverfield" atrelado a isso e uma esperta jogada de marketing não faz com que o longa seja minimamente salvo do ostracismo. E por favor, quem quer que seja que tenha aprovado a ideia da trama com o braço merece ser demitido.

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