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Review: a odisseia lírica do Bastille em "Bad Blood", seu brilhante álbum de estreia!


O que você faria ao lançar-se num projeto solo, que embora tivesse bastante qualidade, foi muito abaixo das expectativas e que tivesse te consumido por completo? Desistiria? Dan Smith preferiu levantar a cabeça e seguir em frente, reinventando-se. Agora, sob o nome de Bastille e em forma de banda, que após alguns EPs e mixtapes de sucesso, em 4 de março deste ano lançou seu aguardadíssimo álbum de estreia, o "Bad Blood", que não decepcionou. #1 no UK e com uma qualidade impressionante, seja pela profundidade, pelos elementos indie-pop graciosos, os corais, as melodias e letras cativantes ou pelos vocais arrebatadores de Dan, o álbum conta através de várias metáforas uma odisseia lírica de um personagem que assim como nós, vive suas crises amorosas e existenciais, fazendo da nossa review faixa a faixa, mais que necessária para provar porque "Bad Blood" é de longe, um dos melhores lançamentos deste primeiro semestre e porque não, do ano.


1) "Pompeii"

Abrindo os trabalhos do "Bad Blood", temos a impressionante "Pompeii", que serviu como quarto single e principal responsável por apresentar a Bastille comercialmente ao mundo. #1 nos charts da Irlanda, #2 no UK e na Itália, a canção faz um paralelo entre a situação vivida pelos personagens e o famoso episódio ao qual o título se refere, quando a cidade italiana de Pompeia foi destruída pela erupção do vulcão Vesúvio em 79 d.C., provocando uma intensa chuva de cinzas que tomou conta da cidade: "Grandes nuvens passam sobre as colinas, trazendo escuridão de cima".

"Pompeii" já começa com um coro harmonioso e imponente, abrindo espaço para os vocais cativantes de Dan Smith incorporarem-se à percussão repetitiva de tambores e baterias, dando aspectos épicos e edificantes a uma faixa obscura sobre um dilema amoroso entre o real e o irreal do fim de uma relação, referenciado pelo cantor no verso que precede ao brilhante refrão: "Mas, se você fechar os olhos, é quase como se absolutamente nada mudasse?", para mais a frente concluir quase em tom de lamentação: "E se você fechar os olhos, é quase como se você tivesse estado aqui antes? Como posso ser otimista quanto a isto?". Profundo.



2) "Things We Lost in the Fire"

Originalmente lançada no EP "Laura Palmer" em 2011 e remasterizada para a versão do álbum, essa faixa segue os mesmos padrões da anterior. A atmosfera épica continua presente, os tambores, a repetição e os vocais cativantes também. E isso não significa algo ruim, muito pelo contrário. Funcionando como uma conversa cara a cara, para expor tudo que ficou pendente da relação presente na faixa anterior, seu refrão "These are the things, the things we lost. The things we lost in the fire fire fire" é pra cantar junto, fazendo desta, uma das melhores faixas do álbum.

3) "Bad Blood"

As duas faixas anteriores meio que estabelecem uma relação de "causa e feito" a todas as adversidades enfrentadas pelo protagonista. Então, para continuar moldando esse perfil, somos levados a embarcar numa viagem no tempo com "Bad Blood", segundo single do álbum, onde o cenário agora, não é mais a vida atual dos personagens, mas sua adolescência, onde nos são mostrados perspectivas de sonhos e fracassos: "Nós éramos jovens e bebíamos no parque, não havia outro lugar para ir. E você disse que sempre esteve à minha volta. Ah, mas ainda estávamos a nos conhecer". Envoltos em uma melodia atraente com sintetizadores, fazendo conexão com o que esperavam do futuro, entendemos que por mais que tentemos, não dá para nos desvincular do passado, apenas devemos deixar as coisas acontecerem ao seu tempo: "Mas esses são os dias que nos unem, para sempre. E essas pequenas coisas nos definem para sempre, para sempre".


4) "Overjoyed"

Dando um tempo no clima pesado envolvendo amor, ódio, culpa, dores e lamentações, surge a calma e encantadoramente linda, "Overjoyed", primeiro single e também já conhecida do EP. Funcionando como uma pequena pausa para a descontração, do tipo daqueles namoros em que a pessoa interrompe uma discussão para fazer uma piadinha só pra quebrar o clima e para mostrar que ainda acredita no futuro da relação, nosso protagonista sente-se feliz por relembrar os vários motivos que os fizeram ficar juntos: "Oh, eu me sinto muito feliz quando você escuta as minhas palavras. Consigo vê-las  penetrando e instalando-se profundamente na sua pele". Por outro lado, não dando o braço a torcer, ele não se importa em continuar a DR, assumindo a postura egocentrista: "E eu ouço você me chamar na calada da noite, inclinando-se para o desespero. Qualquer proposta é uma oportunidade ou desafio, mas o que há para ganhar quando você sempre está em cima do muro desse jeito?".


5) "These Streets"

Cansado de tanto discutir a relação, nosso protagonista dessa epopeia,  nos dá através desse uptempo, indícios da loucura e do intenso conflito interno que vive,  entre aceitar a relação conturbada mais uma vez ou simplesmente deixar pra lá: "Essas ruas são suas, você pode mantê-las. Eu não quero que elas me puxem de volta, então eu me rendo, para as lembranças as quais eu fujo". Talvez, envergonhado de seus próprios sentimentos, ele suplica: "Mas mesmo que não venhamos a admitir isso para nós mesmos, vamos caminhar sobre estas ruas e pensar em outra coisa por um tempo. Mas eu não vou mais mostrar meu rosto aqui, não vou mais mostrar meu rosto aqui".

6) "Weight of Living, Pt.II"

Com cara de single, essa é mais uma das cativantes faixas do álbum. Fazendo alusão ao dilema de toda criança que deseja ser "grande", funciona mais uma vez como uma crise existencial do protagonista, pondo em cheque todas suas crenças, onde a metáfora da vez, envolve uma criança, que não mede os riscos de afirmar que quer ser adulto, sem saber o quão atribulada a vida de "gente grande" é: "Tudo o que você desejou enquanto era uma criança, era ser mais velho. Agora que está aqui, de repente, tem medo. Você perdeu a essência (perdeu a essência). Você gosta da pessoa que se tornou?", Dan Smith nos leva à profunda indagação de algo que descobriremos lá na frente.

7) "Icarus"

Passada toda a crise existencial e finalmente caindo na real outra vez, nosso protagonista nos traz em "Icarus", faixa também já conhecida do antigo EP, o começo de sua decisão, com uma metáfora maravilhosa para a famosa história do sonhador grego: "Ícaro está voando muito perto do sol. A vida de Ícaro apenas começou, na verdade, está apenas começando. De pé em cima do penhasco, frente a frente com o maior inimigo e achando graça. Isso me assusta até a morte. Olhe para o futuro, mas não diga nada. Então, tome outro fôlego".

Originalmente a faixa era apenas um lado B para "Flaws", por sorte dos nossos ouvidos, resolveram encaixá-la na tracklist final  do álbum, o que foi uma decisão acertadíssima, pois ela não somente se adequa, mas dá uma nova e interessante dimensão ao contexto, nos preparando para seu ápice.

8) "Oblivion"

Com os indícios dados na anterior, que o protagonista (aparentemente) já tem uma decisão tomada, somos apresentados à faixa mais introspectiva e porque não, mais brilhante do álbum. "Oblivion" é uma baladinha indie-pop surreal sobre o esquecimento, somente tendo Dan, seus vocais mais contidos e um piano, soando tão desafiadora dado o tamanho de seu impacto aos corações mais sensíveis. Apenas feche seus olhos e ouça, é uma sensação indescritível, enquanto ele suplica em meio a falsetes belíssimos: "Você envelhecerá graciosamente? Deixará um caminho que nos une? Envelhecerá com graça ou apenas vai acordar escondendo o rosto?  Bem, o esquecimento chama por seu nome. Você sempre vai mais longe do que eu posso alcançar".


9) "Flaws"

Outra faixa já bem conhecida entre os fãs, "Flaws" também fazia parte do EP de 2011, e é o terceiro single do "Bad Blood". Na minha opinião, é a faixa que mais resume o que o Bastille é: um grupo simples, com ótimas e inspiradoras letras, capazes de estampar um sorriso até naqueles com o coração mais gelado.

Servindo quase como um pedido de perdão após a morte, temos aqui nosso protagonista reconhecendo todas as falhas de sua vida e na sua relação, de forma sincera, simpática e até sádica: "Você sempre exibiu seus defeitos. E eu, sempre os enterrei sob o solo. Desenterre-os, vamos terminar o que começamos, assim nada permanecerá escondido. Todos os seus defeitos e todos os meus defeitos quando forem exumados, veremos que precisávamos deles para sermos quem somos. Sem eles, estaríamos condenados".


10) "Daniel in the Den"

Com um começo lento e com sintetizadores alocados na faixa de forma bem melódica, que em certos pontos lembram uma faixa qualquer do Passion Pit, temos Dan Smith utilizando (de novo) brilhantemente uma metáfora de uma história mundialmente conhecida para nos apresentar outro estágio de seu protagonista: "E você pensou que os leões eram ruins. Bem, eles tentaram matar meus irmãos, e para cada rei que morreu, eles coroariam outro. Mas isso é mais difícil do que você pensa, quando se conta sonhos um do outro".

11) "Laura Palmer"

Brilhantemente épica, assim podemos definir "Laura Palmer". O quinto single a ser extraído do álbum, é repleto de sintetizadores, baterias, tambores e violinos, que ao longo de sua beleza harmônica, somos captados mais uma vez pelos brilhantes vocais de Dan Smith até explodir no refrão, que fica impregnado no corpo de quem o escuta. A faixa simboliza uma volta do protagonista à vida, para "aterrorizar" quem o fez sofrer por tanto tempo: "A noite era tudo o que você tinha, você fugiu de tudo o que tinha para estar nela. Encontrou um caminho para si sobre o solo. Fugiu para a noite, pois assim não pode ser encontrada, mas... este é o seu coração. Você pode senti-lo? Você pode senti-lo? Ele pulsa por suas veias", joga na cara nosso anti-herói.


12) "Get Home"

Dando continuidade ao derradeiro encontro, Dan Smith e seus vocais mágicos, fazem nosso protagonista questionar de que forma ele pode encontrar a paz, sendo que estará sozinho onde quer que esteja: "Como eu vou ficar sozinho em casa? Há uma luz no quarto, mas ele é escuro. Espalhados no chão, estão todos os meus pensamentos". Para depois explicar que isso continuará a perturbá-lo como um ciclo vicioso:  "Esta é apenas mais uma noite, e nós tivemos várias delas. Pela manhã, nos livraremos. Mas eu sei que desembarcará aqui de novo".

13) "Weight of Living, Pt. I"

Depois de toda a saga repleta de amor, ódio, mentiras, traições, lamentações, dúvidas e metáforas, chegamos ao fim do "Bad Blood" com "Weight of Living, Pt. I", que basicamente soluciona o mistério que é atribuído à pergunta da sexta faixa (Você gosta da pessoa que se tornou?). Novamente, utilizando uma metáfora bem conhecida na língua inglesa, Dan Smith responde não só a essa questão, como conclui toda a história num desfecho genial e ~suave~:

"Há um albatroz em torno de seu pescoço por todas as coisas que disse e fez. Você pode carregá-lo sem arrependimentos. Pode continuar a ser a pessoa que você se tornou, embora ache que há uma luz. Seu albatroz, deixe-o ir, deixe-o ir. Seu albatroz, derrube-o, derrube-o, enquanto você apenas não se abala com o quão pesada é a vida. (...) Quando você simplesmente não consegue se livrar do fardo das condições que a vida impõe".

Para quem não sabe, na língua inglesa quando dizem que, "there's an albatross around your neck", seria como se estivéssemos jogando na cara da pessoa que ela é um fardo, um peso morto em nossa vida, mas não pode ser facilmente descartado ou jogado fora. Ou seja, tudo se amarra agora e os desejos dos protagonista ficam ainda mais explícitos.

CONCLUINDO: 
Emocionante, profundo, inteligente, produzido de forma singela, honesta e tendo um resultado absurdamente brilhante, "Bad Blood" abre os caminhos para uma nova banda se fixar no coração de muita gente que curte música boa, afinal, um álbum de estreia comumente define muitos artistas, justamente por ser uma novidade. A do Bastille, particularmente, se mostra arrasadora. É inegável afirmar que este não é apenas um dos melhores álbuns de 2013, como até aqui (pelo menos para este que escreve esta review), o melhor álbum do ano. E que eles ganhem o devido reconhecimento que legitimamente merecem.
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